O Templo das Sombras

O sol já estava alto no céu quando Thomas, Mira e Oloorin se reuniram na praça central de Eldenwood, prontos para partir rumo ao templo antigo que Garen, o chefe da vila, mencionara dias antes. A brisa matinal agitava as folhas das árvores ao redor, trazendo o aroma fresco de pinho e terra úmida, enquanto o som suave da fonte central gorgolejava, misturando-se às vozes dos aldeões que começavam o dia. Thomas ajustou a mochila nos ombros, sentindo o peso reconfortante dos suprimentos que Marta, a curandeira, insistira em lhe dar — frascos de unguento que tilintavam como sinos abafados, bandagens limpas dobradas com cuidado e ervas medicinais exalando um perfume terroso dentro da bolsa de couro. Seu ombro, agora quase curado graças aos cuidados dela, dava leves pontadas, um eco distante da dor que o acompanhara desde o confronto com os bandidos, mas ele estava determinado, os olhos castanhos brilhando com uma mistura de ansiedade e propósito. Mira, ao seu lado, segurava o grimório contra o peito como um escudo, os olhos verdes determinados, o cabelo castanho caindo em mechas desalinhadas sobre o rosto pálido, marcando-a como alguém que carregava tanto força quanto segredos. Oloorin, com seu manto azul-escuro ondulando levemente ao vento, segurava o cajado com firmeza, as runas entalhadas na madeira pulsando com uma luz sutil enquanto seus olhos azuis perscrutavam a floresta adiante, como se já pudesse entrever os fios do destino tecidos entre as árvores.

Antes de seguirem, Oloorin ergueu uma mão, a voz grave cortando o murmúrio da praça. “Não podemos ir às cegas. Garen mencionou o templo, mas precisamos de mais do que lendas para nos guiar.” Ele virou-se para a biblioteca, um prédio modesto de madeira envelhecida que se erguia à sombra de uma árvore retorcida, suas janelas estreitas filtrando a luz em feixes dourados. Mira assentiu, abrindo o grimório com um gesto quase reverente, as páginas crepitando sob seus dedos. “Vou consultar os ensinamentos da deusa. Talvez ela me revele algo — uma visão, uma oração.” Thomas, ansioso para provar seu valor ao grupo que agora sentia como uma extensão de si mesmo, deu um passo à frente. “Vou ajudar na pesquisa e garantir que tenhamos tudo o que precisamos. Não quero deixar nada ao acaso.”

A biblioteca os recebeu com um silêncio pesado, o ar saturado pelo cheiro de papel velho, mofo e tinta seca que parecia impregnar as paredes de madeira escurecidas pelo tempo. A luz entrava em raios tímidos, iluminando prateleiras abarrotadas de tomos empoeirados, alguns com lombadas rachadas, outros enrolados em pergaminhos que se desfaziam nas bordas. Thomas se ocupou organizando os suprimentos perto da porta — verificando os frascos, amarrando cordas extras —, mas seus olhos vagavam para os livros, atraídos pela promessa de respostas. Oloorin, com a precisão de quem já desvendara muitos segredos, começou a puxar volumes das prateleiras mais altas, o pó dançando no ar como espectros dourados. Mira, sentada em um banco gasto, folheava seu grimório, murmurando preces em voz baixa, os lábios movendo-se em um ritmo que parecia ecoar além do mundo visível.

Horas se passaram, marcadas apenas pelo farfalhar das páginas e pelo ranger ocasional da madeira sob o peso dos passos. Thomas, carregando uma pilha de livros que encontrara em um canto esquecido, deixou-os sobre a mesa com um baque surdo. “Esses pareciam antigos,” disse, limpando as mãos na calça, o tecido já manchado de terra e suor. Oloorin ergueu os olhos de um tomo encadernado em couro, as sobrancelhas franzidas. “Boa intuição, Thomas.” Ele abriu um dos volumes, revelando um mapa rudimentar traçado em tinta desbotada, as linhas serpenteando por montanhas e vales até um ponto marcado por um símbolo em forma de arco. “Está a dois dias daqui, no coração da floresta. Coincide com o que Garen disse.”

Mira, que até então parecia perdida em seu grimório, levantou a cabeça de repente, os olhos arregalados de excitação contida. “Olhem isso,” sussurrou, virando o tomo que segurava para que os outros vissem. As páginas amareladas, frágeis como folhas secas, contavam a história de um culto que adorava uma entidade chamada ‘O Devorador de Luz’. As palavras, escritas em uma caligrafia trêmula, falavam de rituais sombrios realizados em um templo escondido, de sacerdotes que buscavam poder nas sombras e de uma derrota há séculos — mas com um aviso: “Nem todos foram destruídos; alguns se refugiaram, esperando o momento de despertar seu senhor.” Ela apontou para uma ilustração no canto da página, um esboço desbotado de uma lua crescente cercada por espinhos. “Já vi isso antes,” disse, a voz tremendo. “Em uma visão, na noite passada. A deusa me mostrou esse símbolo.”

Oloorin assentiu, os olhos fixos no mapa. “E o templo é onde eles estão. Mas o que me preocupa é o que planejam despertar.” Ele virou outra página do tomo, revelando uma lista de rituais, cada um mais perturbador que o anterior — sacrifícios, invocações, portais para o plano das sombras. “Se estão ativos, o tempo não está ao nosso favor.”

Mira voltou ao grimório, as mãos firmes apesar da gravidade do momento. Folheou as páginas até encontrar uma oração que parecia brilhar com uma luz suave, quase imperceptível. “Aqui,” disse, lendo em voz alta: “‘Que a luz da divindade quebre as trevas, que o véu da sombra se desfaça sob teu santo olhar.’ É um rito de purificação. Pode enfraquecer o que quer que enfrentemos lá.” Thomas sentiu um arrepio percorrer sua espinha, mas sua voz saiu firme. “Então sabemos com o que lidamos. Vamos nos preparar e partir.”

Na manhã seguinte, o céu estava claro, mas o ar carregava um peso que parecia pressagiar tempestades. Os aldeões se reuniram na praça para se despedir, os rostos marcados por gratidão e preocupação. Hanna, a dona da taverna, entregou-lhes uma cesta de pão fresco e carne salgada, os olhos ruivos brilhando com um misto de orgulho e medo. “Voltem inteiros,” disse, a voz rouca cortando o silêncio. Thomas sorriu, ajustando a mochila enquanto sentia o calor das palavras dela. “Vamos voltar. Prometo.”

A floresta os engoliu assim que deixaram Eldenwood para trás, as árvores altas fechando-se como sentinelas de casca áspera, os galhos entrelaçados bloqueando grande parte da luz do sol. O chão era um tapete irregular de raízes expostas, musgo escorregadio e folhas podres que exalavam um cheiro úmido e terroso. O som dos passos do grupo — o cravar das botas de Thomas, o roçar do manto de Oloorin, o leve farfalhar da túnica de Mira — misturava-se ao canto esporádico dos pássaros e ao sussurro do vento entre as copas. Eles seguiam o mapa de Oloorin, uma cópia traçada à mão do original, mas o caminho era traiçoeiro. Um rio caudaloso cortou sua rota no primeiro dia, as águas rugindo com uma força que espumava contra as pedras lisas da margem. Thomas sugeriu derrubar uma árvore para atravessar, e com a espada curta que Oloorin lhe dera, cortou um tronco fino enquanto o mago reforçava a estrutura com magia, as runas em seu cajado brilhando ao estabilizar a ponte improvisada. Mira, com o grimório seguro contra o peito, atravessou por último, os olhos fixos na água como se temesse que ela ganhasse vida.

A jornada seguiu assim, entre obstáculos que testavam sua determinação. Um trecho de areia movediça quase engoliu a bota de Thomas, o lodo viscoso puxando-o para baixo até que Oloorin o arrastasse com uma corda conjurada às pressas. Mais tarde, um enxame de insetos alados, suas asas zumbindo como trovões minúsculos, atacou o grupo, os ferrões ardendo na pele exposta. Mira abriu o grimório e entoou uma prece rápida, as palavras fluindo como água cristalina: “Que a luz purifique o que rasteja na escuridão.” Uma aura suave emanou dela, afastando os insetos em um piscar de olhos, deixando apenas o silêncio e o cheiro acre de suas carcaças queimadas.

No segundo dia, o sol mal tocava o chão da floresta, as sombras alongando-se como dedos famintos. O grupo acampou perto de uma rocha coberta de musgo, o fogo conjurado por Thomas — uma chama pequena, mas estável, fruto de seu treinamento com Oloorin — crepitando contra a umidade do ar. Enquanto comiam pão e carne salgada, Thomas quebrou o silêncio, a voz baixa refletindo a inquietação que crescia dentro dele. “Eu não sei se estou pronto pra isso. A magia ainda é nova pra mim, e se eu falhar quando mais precisarem?” Ele encarava as chamas, o brilho refletindo em seus olhos castanhos.

Mira, sentada com o grimório no colo, olhou para ele com uma suavidade que raramente mostrava. “Você duvida porque se importa, Thomas. Mas olhe o que já fez — você nos salvou, me salvou. A magia é só uma parte de quem você é.” Oloorin, recostado contra a rocha, assentiu, o cajado repousando ao seu lado. “Quando comecei, eu era um desastre. Queimei metade de uma vila sem querer. O que importa é que você cresce com cada erro. Confie em nós, como nós confiamos em você.”

Thomas sorriu, o peso em seu peito aliviando um pouco. “Obrigado. Acho que precisava ouvir isso.” Eles dormiram sob o céu encoberto, o som da floresta embalando-os em um repouso inquieto.

O crepúsculo do segundo dia trouxe o primeiro sinal de perigo verdadeiro. Enquanto avançavam por uma trilha estreita, o ar ficou subitamente pesado, carregado de um cheiro metálico que fez Thomas franzir o nariz. Um rosnado baixo ecoou entre as árvores, um som que parecia vibrar no peito deles, e então ele surgiu — um lobo imenso, sua pelagem negra como a noite sem lua, os olhos brilhando com um vermelho sobrenatural que cortava a penumbra. Era maior que qualquer animal que já tinham visto, os músculos ondulando sob o pelo enquanto se movia com uma graça predatória, a saliva pingando de presas longas como adagas. Mas não estava sozinho. Das sombras, mais quatro lobos emergiram, menores, mas igualmente ameaçadores, seus rosnados formando um coro que gelava o sangue.

Oloorin foi o primeiro a reagir, a voz calma mas firme. “Lobos das sombras. Corrompidos por magia negra. Thomas, fogo à distância. Mira, luz contra eles. Eu cuido da coordenação.” Ele ergueu o cajado, as runas acendendo-se enquanto conjurava duplicatas ilusórias de si mesmo, figuras translúcidas que se espalharam pela clareira, confundindo os lobos menores. Um deles saltou contra uma ilusão, as mandíbulas fechando-se no ar com um estalo frustrado, e Oloorin aproveitou para acertá-lo com um feixe de luz azul, o impacto lançando a criatura contra uma árvore com um ganido agudo.

Thomas, o coração martelando contra as costelas, estendeu a mão, lembrando as lições de Oloorin. “Ignis!” gritou, e uma bola de fogo surgiu em sua palma, o calor lambendo seus dedos enquanto a lançava contra o lobo mais próximo. As chamas acertaram o flanco da criatura, o pelo negro chiando e soltando fumaça enquanto ela uivava, recuando com o rabo entre as pernas. Mas o alfa, imune às ilusões, fixou seus olhos em Oloorin e avançou, as garras rasgando o chão em uma investida que parecia um trovão em movimento.

Mira abriu o grimório, as páginas virando sozinhas como se guiadas por um vento invisível. “Que a luz da deusa revele o caminho e queime os impuros!” entoou, a voz ressoando com uma força que parecia vir de outro plano. Um feixe de luz radiante disparou de suas mãos, puro e cegante, acertando outro lobo em cheio. A criatura recuou, o pelo fumegando enquanto gania, os olhos vermelhos piscando em agonia antes de fugir para as sombras.

O alfa, porém, não se deteve. Saltou contra Oloorin, as presas mirando seu pescoço, e o mago ergueu o cajado no último instante, bloqueando o ataque com um estalo que ecoou pela clareira. O peso do lobo o fez recuar, os pés deslizando na terra úmida, e Thomas viu o perigo. Ele correu, a espada curta em punho, o ombro protestando enquanto girava a lâmina em um arco amplo. O golpe acertou o flanco do alfa, abrindo um corte profundo que jorrou sangue escuro, mas a criatura apenas rosnou mais alto, virando-se para ele com uma velocidade aterradora. Suas mandíbulas fecharam-se a centímetros de seu rosto, o bafo quente e fétido acertando sua pele, e Thomas tropeçou para trás, o coração na garganta.

“Thomas!” gritou Mira, o grimório brilhando em suas mãos. Ela lançou um feitiço de aprisionamento, as palavras saindo em uma torrente: “Que a terra segure o que as sombras corrompem!” Raízes de luz brotaram do chão, douradas e pulsantes, enrolando-se nas pernas do alfa como correntes vivas. O lobo lutou, as garras rasgando o solo, mas as raízes o seguraram firme, o rosnado transformando-se em um lamento frustrado. Thomas aproveitou a chance, levantando-se com um grito e cravando a espada no peito da criatura. A lâmina penetrou fundo, o impacto reverberando em seus braços, e o alfa caiu, o brilho vermelho em seus olhos apagando-se como brasas sob a chuva.

Os lobos menores, vendo seu líder tombar, hesitaram. Oloorin ergueu o cajado mais uma vez, murmurando palavras de poder, e uma onda de luz varreu a clareira, banindo as criaturas de volta às sombras de onde vieram. O silêncio voltou, pesado e absoluto, quebrado apenas pela respiração ofegante do grupo. Thomas limpou o suor da testa, a mão trêmula enquanto guardava a espada. “Foi por pouco,” disse, a voz rouca. Mira fechou o grimório com um estalo suave, os olhos encontrando os dele. “Muito por pouco. Mas você foi incrível.” Oloorin assentiu, um sorriso cansado nos lábios. “Estamos mais perto do templo agora. Vamos continuar.”

Após mais uma hora de caminhada, a floresta abriu-se em uma clareira onde o templo se erguia, mas não era uma ruína comum. A estrutura de pedra negra parecia pulsar com uma energia sutil, as paredes cobertas de musgo e trepadeiras que se moviam lentamente, como se respirassem. Colunas altas, esculpidas com figuras de rostos contorcidos em silêncio, sustentavam um arco que levava a uma escuridão densa, e o ar ao redor carregava um zumbido baixo, quase um lamento. Símbolos como o da visão de Mira — lua crescente com espinhos — estavam gravados na pedra, brilhando com uma luz fraca e doentia.

“Não parece abandonado,” murmurou Thomas, a mão instintivamente indo ao cabo da espada. Oloorin franziu a testa, o cajado firme em sua mão. “Não é. Há magia aqui, antiga e viva. Precisamos ter cuidado.” Mira abriu o grimório, os olhos fixos nos símbolos. “A deusa me guiou até aqui por um motivo. Vamos descobrir por quê.”

Eles atravessaram o arco, o som de seus passos ecoando em um salão vasto e vazio, as tochas nas paredes acendendo-se sozinhas em chamas verdes que lançavam sombras retorcidas. O interior era um labirinto de corredores que pareciam se rearranjar, as paredes sussurrando em uma língua esquecida. Em uma câmara lateral, encontraram um mosaico no chão, uma história em cores desbotadas: sacerdotes em mantos brancos adorando uma figura luminosa, depois corrompidos por uma sombra que se erguia como um colosso. O último painel estava faltando, um vazio que parecia gritar.

Mira ajoelhou-se, os dedos traçando o contorno do espaço vazio. “Isso é um aviso. Se encontrarmos o que falta, saberemos como detê-los.” Thomas, explorando as paredes, encontrou uma alavanca disfarçada entre as pedras. Puxou-a, e um rangido ecoou enquanto uma passagem se abria, revelando uma câmara menor. Lá, sobre um pedestal, repousava o painel perdido, guardado por uma figura espectral — um cavaleiro de armadura translúcida, os olhos brilhando com luz etérea.