Capítulo 5

Ji-Ho despertou de seu sono eterno.

Seus olhos se abriram lentamente, e tudo o que viu foi um vasto céu rosado refletindo nas águas tranquilas ao seu redor. Ele estava flutuando, o corpo leve como se não pertencesse mais a este mundo.

De repente, flashes intensos atravessaram sua mente como lâminas afiadas. Cenas distorcidas de um passado recente invadiram sua consciência — o ataque brutal, a dor insuportável, o brilho assassino nos olhos de Daiki enquanto a lâmina atravessava seu peito. Ji-Ho ofegou, o coração disparando com o choque.

Num ímpeto, ele se sentou, ofegante. Olhou para seus braços.

Nada. Nenhuma ferida. Nenhuma cicatriz.

Tremendo, levou os dedos ao rosto, deslizando-os pela pele impecável. Então, levantou a camisa com pressa, esperando ver o buraco sangrento que a adaga de Daiki deveria ter deixado. Mas não havia nada ali. Nem uma marca.

Seu corpo estava... intacto?

O pânico começou a crescer dentro dele, seu cérebro trabalhando freneticamente para encontrar uma explicação.

"Fui atacado... Senti a dor... Vi a lâmina me atravessar... Eu morri!"

Seus olhos correram para o reflexo na água. Aquela era mesmo sua imagem? Ele engoliu em seco e, num salto, se colocou de pé.

— Certo... Certo... Isso só pode ser um sonho... Um pesadelo! Vou acordar em 3... 2... 1... — Ele fechou os olhos e apertou os punhos.

Nada.

Quando abriu os olhos novamente, continuava ali, naquela paisagem surreal. Um calafrio percorreu sua espinha.

"Então... isso tudo é real? Eu realmente morri? Esse lugar... seria o céu?"

Olhando ao redor, viu que não havia nada além de uma pequena ilha à sua frente. A ilha se estendia até um monte, no qual um precipício se projetava como uma cicatriz na paisagem. E no topo do monte, uma construção majestosa se erguia.

Colunas brancas, enormes e impecáveis, sustentavam um telhado triangular esculpido com detalhes que pareciam contar histórias esquecidas pelo tempo. Não havia rachaduras, nem fissuras. Era como se a estrutura tivesse sido esculpida a partir de uma única pedra maciça.

Ji-Ho não tinha escolha. Se queria respostas, teria que entrar naquela construção.

Com passos cautelosos, começou a subir o morro. O caminho estava tomado por plantas selvagens, como se ninguém passasse por ali há séculos. Quando finalmente alcançou o átrio da construção, viu-se diante de uma imensa porta de mármore entreaberta. Gravuras esculpidas em sua superfície emanavam uma aura inquietante, calafrios percorriam sua pele só de olhar para elas.

Ele respirou fundo e atravessou o pequeno vão.

Ao pisar no interior, uma sensação de vazio absoluto o engoliu. O ar era frio, e sua respiração criava pequenas nuvens brancas no ar. O salão era imenso, com fileiras de estátuas colossais espalhadas pelo espaço. Algumas tinham traços humanos, outras eram monstruosas, evocando pesadelos de divindades antigas.

O lugar estava marcado pelo tempo. Rachaduras no chão, vegetação brotando entre as fendas, musgo subindo pelas paredes e colunas. O teto, repleto de buracos, permitia a entrada de feixes de luz pálida, iluminando a poeira suspensa no ar. Tochas com chamas verdes queimavam em cada coluna, emitindo uma luz fraca e fantasmagórica.

Ji-Ho sentia o cheiro de umidade, ouvia o gotejar insistente ao fundo. Pássaros voavam pelo salão, seus grasnados ecoando na imensidão solitária.

Então, o silêncio foi rompido.

Uma voz feminina, serena e melancólica, ressoou pelo templo. Uma canção.

A melodia era doce e assombrosa ao mesmo tempo. Uma voz que parecia pertencer a um espírito antigo, preso ali por eras incontáveis.

Ji-Ho enrijeceu, os sentidos aguçados. Instintivamente, caminhou pelas sombras das estátuas, se aproximando da origem da canção. Seu coração batia forte.

E então, ele a viu.

Uma mulher, vestida como uma camponesa, cantava enquanto limpava os pés da maior estátua do salão. Sua voz fluía suavemente, como se estivesse imersa em seu próprio mundo.

"Criei o céu, forjei o mar,

Moldei as almas no sopro do ar.

Ergui as estrelas, dei luz ao dia,

Mas fui traída pela ambição fria.

As mãos que deram vida ao mundo,

Agora em correntes, num fardo imundo.

Eu era infinita, agora sou nada,

Uma deusa caída, uma sombra apagada. Se meu nome um dia ecoar,

Será no choro do vento a vagar.

Pois quem faz o cosmos florescer,

Também pode, um dia, morrer."

A tristeza impregnada na canção apertou o peito de Ji-Ho. Aquela voz carregava séculos de lamento e dor.

Ele hesitou, mas, reunindo coragem, deu um passo à frente.

— Com licença... — Sua voz soou baixa, hesitante. Coçou a nuca, tentando parecer menos intrusivo. — Meu nome é Ji-Ho. Estou... um pouco perdido. Poderia me ajudar?

A mulher continuou a cantar, como se não o tivesse ouvido. Ji-Ho franziu a testa e se aproximou mais um pouco. Tocou seu ombro de leve.

A reação foi imediata.

A mulher engasgou no próprio canto, arregalando os olhos em choque. Seu corpo enrijeceu como se tivesse acabado de ver um fantasma.

— Desculpe incomodar... — Ji-Ho tentou novamente, olhando ao redor. — Estou perdido...

Ela não disse nada. Apenas o encarava, os olhos inundados de emoções conflitantes — choque, alívio... desespero.

— Quem... quem é você? — A voz dela saiu trêmula, apontando para ele.

— Lee Ji-Ho. — Ele estendeu a mão, tentando dissipar a tensão.

A mulher hesitou, mas aceitou o aperto. Seu toque era frio e frágil.

Ji-Ho a observou melhor. Seus olhos eram grandes, de um azul profundo como o oceano. Seus cabelos loiros estavam presos por um pedaço de pano sujo. Seu corpo era esbelto, quase esculpido, mais perfeito que as estátuas ao redor. Vestia um simples traje de camponesa, desgastado pelo tempo. Ao seu lado, um balde de madeira e uma escova suja de musgo.

Mas o que chamou a atenção de Ji-Ho foram as marcas.

Hematomas desbotados em seu rosto. Cicatrizes profundas nos pulsos, como se tivesse passado muito tempo acorrentada.

— Que lugar é esse? — Ele finalmente perguntou.

— O último templo dos deuses... — A mulher respondeu, lançando um olhar às estátuas. — Há séculos ninguém pisa aqui.

O coração de Ji-Ho acelerou. A ideia de estar morto e ter ido para o além voltou à sua mente.

— Estamos... longe do Japão?

A mulher arregalou ainda mais os olhos.

— A nação mais próxima está a um mês de viagem... Mas não há barcos ou aviões que possam chegar aqui. — Ela então fixou o olhar nele. — Ji-Ho... Como você veio parar aqui?

Ele contou sua história.

Quando mencionou a adaga e a árvore dourada, a mulher tremeu.

E então, para sua surpresa, ajoelhou-se diante dele e beijou sua mão.

Ji-Ho mal teve tempo de reagir.

— Tenho esperado por você há muito tempo.

A voz da mulher ressoou pelo templo abandonado, carregada de uma estranha melancolia. Sem entender nada, Ji-Ho segurou-a pelo braço, tentando arrancar respostas.

— O que está acontecendo? Quem é você?

Mas antes que pudesse dizer mais alguma coisa, a mulher tapou sua boca com a mão fria e trêmula.

— Shhh… Aqui não. Estão nos observando. Logo saberão que você está aqui. — Seus olhos brilharam na penumbra. — Venha comigo.

Ela o puxou pelo braço, conduzindo-o para as sombras do templo. Ji-Ho sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Algo estava errado. Cada passo ecoava pelo salão vazio, e ele jurava que os olhos da gigantesca estátua no centro do templo os seguiam.

— Não temos muito tempo… — a mulher ofegou. Seus dedos apertaram o braço de Ji-Ho com urgência. — No princípio, fui eu quem criou os céus e tudo que há abaixo deles. Criei os humanos, os animais, as flores…

Um tremor percorreu o templo, interrompendo suas palavras. Poeira caiu do teto como um prenúncio de algo muito pior.

— Por ter dado aos humanos a única arma capaz de desafiar os deuses, fui banida. Torturada pelos meus próprios filhos. Violada pelos que antes me reverenciavam. E então, tudo o que me restou foi esperar... Esperar pela profecia de Tesseron.

Ji-Ho sentiu um frio na barriga. Ele estava diante de um deus.

Ele não deveria sentir medo? Não deveria lutar contra ela? Mas algo naquela mulher era diferente das histórias que sempre ouvira. Ela não era um ser supremo distante e impiedoso. Ela carregava dor. Sofrimento. Um sofrimento humano.

— Que profecia? — perguntou ele, sua voz saindo quase num sussurro.

A mulher fechou os olhos, como se estivesse recitando algo gravado em sua própria alma:

"Quando a lua prateada em sangue se tornar,

E os sinos do vento deixarem de cantar,

Das sombras virá aquele sem dom,

Cujo nome os deuses temem em tom.

Nenhuma marca, nenhum sinal,

Apenas o eco de um destino fatal.

Pois aquele que nada deveria ser,

Trará o império divino a tremer.

O trono dos céus, um dia imortal,

Ruirá ao toque do filho mortal.

E os que ergueram correntes e dor,

Beberão do cálice do próprio temor."

Outro tremor. Mais forte dessa vez. Ji-Ho engoliu em seco.

— Ji-Ho, você foi escolhido muito antes dos cosmos se formarem. A humanidade depende de você. — A mulher passou os dedos delicadamente pelo cabelo do jovem.

Ele recuou, tirando as mãos dela de sua cabeça.

— Eu? Escolhido? — sua voz tremeu. — Eu sou fraco. Não consegui proteger minha família. Meus amigos. Não consegui nem me proteger… Como posso fazer parte de uma profecia que desafia os deuses? Você se enganou, senhora. Eu não sou esse homem.

A mulher sorriu. Um sorriso triste.

— A Árvore que te prendeu jamais erraria. Você não ouviu o som do coração dela se conectando ao seu? Aquela árvore nasceu sobre o corpo de um titã… e agora, a alma dele vive dentro de você.

Era informação demais. Rápida demais.

— Meu nome é Freya — ela disse por fim. — Deusa da Criação. E eu escolho você como meu campeão.

Então o chão rugiu. Ji-Ho sentiu cada fibra do seu corpo se arrepiar. Freya olhou para a estátua no centro do templo. Os olhos antes inertes agora brilhavam com um fogo maligno. A criatura se moveu, seus membros de pedra rangendo enquanto se levantava do trono colossal.

— Eles descobriram. Rápido! — Freya correu até um balde de madeira cheio de água. Ela umedeceu o dedo com saliva e misturou à água. A substância borbulhou, ganhando uma coloração dourada. Freya o estendeu para Ji-Ho. — Beba. Até a última gota.

— O quê?! — Ele hesitou.

O chão tremeu novamente. A estátua virou sua cabeça para eles. Passos pesados ecoaram pelo templo. Não havia tempo para dúvidas.

Ji-Ho pegou o balde e bebeu. O líquido queimou sua garganta. Seu coração disparou em uma dor lancinante. Ele caiu de joelhos, segurando o peito. Cada batida parecia explodir dentro dele.

Freya segurou seus braços.

— Corra! Volte para o mar de onde veio! — Com o polegar, marcou a testa de Ji-Ho com um símbolo brilhante. — Eu o distrairei. Vá!

Ela o empurrou para frente. Ji-Ho tropeçou, mas se forçou a correr.

Atrás dele, a estátua abriu sua boca e bradou em um idioma antigo.

Zûrn kael, morr ûn dar Freya? (Onde está o humano, Freya?)

Freya respondeu no mesmo tom sombrio.

Thûrn ael'va, tarra în suul. Fhatos. (Não há ninguém aqui, Fhatos.)

Ji-Ho alcançou a porta. Mas antes que pudesse atravessá-la, a estátua girou a cabeça na sua direção.

Os olhos rubros o encontraram.

Freya veth'aa ilin mor'kaan… (Freya, você pagará caro por isso.)

O titã avançou. Cada passo era um terremoto. O templo desmoronava ao seu redor. Ji-Ho correu com todas as suas forças.

— Por que sempre estou correndo pela minha vida?! — gritou, a frustração misturada ao medo.

A porta! Ele estava quase lá!

A mão colossal da estátua se estendeu para agarrá-lo… mas, antes que o alcançasse, algo agarrou o pé da estátua. Freya.

Seu último ato de poder, Freya lançou uma magia que empurrou Ji-Ho além da saída.

Ji-Ho rolou pela areia, se virando a tempo de ver Freya olhando para ele uma última vez. Um sorriso gentil em seus lábios. Então, as portas do templo se fecharam.

Um rugido furioso explodiu de dentro do santuário. As nuvens se tornaram um céu de sangue. O trovão rompeu os céus e um raio desceu como um martelo divino, reduzindo o templo a ruínas.

Entre os escombros, a estátua se ergueu.

Procurando por ele.

O coração de Ji-Ho acelerou. Sem hesitar, mergulhou no mar. Sua pele ardeu. A marca em sua testa brilhou como um farol pálido.

E então…

Ele acordou.

De volta à sua realidade.