Uma Vida em Minhas Mãos

O local era um corredor de pedra, um verdadeiro labirinto. As paredes eram frias e úmidas, com rachaduras que pareciam bem velhas. O cheiro de mofo e sangue impregnava o ar, criando uma atmosfera opressiva. As tochas, que pareciam nunca se apagar, lançavam sombras dançantes nas paredes.

Logo depois de eu encostar naquele homem, fui teleportado para algum lugar estranho, parece um lugar cavernoso, mas se eu fosse chutar, diria que estamos dentro de uma das montanhas.

Mas não tive sinal dele desde então, acho que eu acabei soltando ele por um segundo quando estávamos vindo e acabei me separando, então estou no lugar certo, só me perdi na metade do caminho, aparentemente.

Levando em conta o tamanho dessa estrutura, muito dinheiro foi investido, não sei se isso sempre esteve aqui e foi esquecido ou foi construído em algum período recente, as marcas nas paredes parecem mais causadas por lutas do que por idade.

Bom, era um esconderijo, isso é um fato. Mas por que um labirinto? E o pior, esse lugar está estranhamente vazio. Claro, para evitar visitantes inesperados, mas então isso quer dizer que existe outra entrada? Talvez uma forma específica de entrar sem ter que passar pelo labirinto? São muitas dúvidas.

Enquanto caminhava, observei bem as paredes rachadas e alguns cortes. Alguém deve ter passado por aqui em algum momento, isso foi confirmado momentos depois, pois em um lado do labirinto havia uma porta. Dentro, estavam correntes e o chão cheirava a sangue. Pessoas já foram feitas prisioneiras aqui.

Eu entrei no quarto e era um local isolado sem nada além de pares de correntes e algemas em volta da parede. Mas não tinha nada além disso.

Esse lugar faz eu me sentir estranho…

Saindo do quarto voltei aos corredores sem fim. Eu não estava conseguindo me localizar direito mesmo com [Consciência Analítica], a ausência de sons e as paredes reforçadas impediam de meus sentidos criarem um mapa eficiente.

Eu só espero que Sentil tenha voltado para a cidade e que Merlin esteja bem. Eu preciso dar um jeito aqui, mas estou preocupado, se por algum acaso mais membros do grupo daquele Honda estiverem aqui, não sei se dou conta de todos ao mesmo tempo, além que preciso levar a princesa de volta.

Então finalmente identifiquei alguma coisa, sons de patas. Me esquivei para o lado de um líquido roxo, aparentemente venenoso. Então aranhas gigantes começaram a aparecer em uma velocidade assustadora.

De onde vocês surgiram?

Sem demora eu estiquei minha mão e as queimei na hora. Foi uma luta bem fácil, então continuei fazendo isso até que as aranhas acabaram.

Eu estava detectando mais presenças a frente, com certeza nada amigáveis. Mas continuei meu caminho.

∘₊✧──────✧₊∘

Há muito tempo, antes mesmo de Cirgo ser fundada, uma colônia de elfos vivia nos arredores daquele local. Com a tecnologia da época, eles faziam o possível para criar moradias e barreiras de ilusão para se defenderem do mundo exterior. As próprias montanhas eram locais perfeitos para tal coisa, oferecendo proteção natural e isolamento.

O imperador dos elfos era um mistério, uma figura envolta em lendas e segredos. Mas isso não é importante agora. O que importa é que, devido a um incidente, os elfos dessa colônia tiveram que tomar medidas drásticas, mudando-se para um local distante.

Histórias são contadas, mas nenhuma confirmação: alguns dizem que os elfos foram embora porque acharam um lugar melhor; outros acreditam que foram vítimas de um ataque dentro da própria colônia, e após conseguirem sua independência e matarem seu líder, se mudaram para restabelecer uma nova ordem. Essas eram as maiores teorias da conspiração possíveis. Na realidade, foi algo simples.

Eles foram atacados por um monstro que apareceu misteriosamente na colônia. Os elfos o chamaram de Gorlak. Uma besta sem consciência que se alimentava de mana, o que a tornava um "predador" natural dos nascidos da magia.

Gorlak era uma larva gigante de aproximadamente 20 metros. Sua boca era um círculo na ponta de seu corpo, repleta de milhares de dentes afiados em todos os lados. Seus olhos eram tão achatados em sua cabeça que pareciam inexistentes. Seu corpo rastejante era coberto por pelos, com pequenas pernas inutilizáveis. Era uma aberração, algo sem sentido algum. Uma criatura que apenas destruía tudo que era magia. Por muito tempo, foi vista como sem utilidade para a natureza, mas poderia ser considerada um guardião, para reduzir massas de mana. Após o incidente com os elfos, nunca mais foi visto um Gorlak novamente.

A fundação de Cirgo ocorreu apenas dois anos após o ataque, mesmo que ainda fosse território de elfos, o que abriu espaço para um tratado entre os elfos e o primeiro rei de Cirgo.

Sentil já estava voltando para a cidade quando a confusão começou. Assim que viu o castelo sendo invadido e os corpos dos soldados espalhados pelo chão, sentiu um nó na garganta. 

O pensamento martelava em sua mente: se eu estivesse aqui…

Pelo menos o ataque não chegou até os cidadãos. Os zumbis foram eliminados antes de atravessarem os portões do castelo. 

No salão principal, o único corpo de um invasor jazia no chão. Sua cabeça não estava mais lá. Sentil olhou para ele com desgosto. Aquele homem matou incontáveis soldados — pessoas que tinham famílias, que nunca voltariam para casa. No fundo, ele queria ter sido o responsável por acabar com ele. 

Seu mestre, Roghan, apareceu logo depois. A maldição que o afetava havia sido curada por um dos curandeiros, mas sua expressão carregava vergonha. 

— Me desculpe… não consegui proteger o rei. 

O rei, ao menos, estava vivo. Se recuperando, mas vivo. 

Sentil mal ouviu as palavras. Seu coração disparou. 

— Minha irmã! Onde ela está?! 

Roghan hesitou. 

— Um dos invasores a levou… sinto muito. 

— Que droga! 

O calor subiu em seu corpo e, sem perceber, sua energia vazou, tremores leves espalhando-se pelo chão. Mas antes que sua raiva explodisse, Roghan se impôs, obrigando-o a respirar fundo. 

— Um rapaz veio aqui. Disse ser seu conhecido. Acho que ele foi atrás do invasor… mas o teletransporte já estava ativado. 

Aquele monstro realmente foi atrás de Serena? 

Sentil fechou os punhos, respirando fundo. Se ele fez isso, então… talvez fosse alguém confiável. E, mesmo que não fosse, no momento, ele não tinha escolha a não ser confiar nele. 

As buscas nas montanhas foram inúteis. O território era vasto demais para ser examinado em tão pouco tempo. No fim, Victor era o único que podia fazer algo por Serena agora. 

Com esse pensamento, Sentil desceu para o salão principal, onde os curandeiros estavam examinando o cadáver do invasor. 

Um deles veio até ele com um relatório. 

— O nome dele é Honda. Tinha 48 anos. Era um antigo aventureiro de classe (B). Nenhuma doença aparente… mas encontramos algo estranho no coração dele. 

— O quê? 

Antes que o curandeiro pudesse explicar, o corpo sem cabeça de Honda começou a se mexer. Primeiro, pequenos espasmos. Depois, convulsões violentas. 

— Afastem-se! — um dos curandeiros gritou. 

Todos recuaram, olhos arregalados. 

— Algo está crescendo dentro dele! 

Sentil franziu a testa, sem entender. 

O cadáver começou a inchar, sua pele assumindo um tom avermelhado. De repente, sangue jorrou para todos os lados. E então… explodiu. 

O silêncio durou apenas um segundo. 

Do sangue, uma larva grotesca emergiu, crescendo sem parar. 

Sentil ao perceber o que estava acontecendo temeu pela segurança de todos ao redor.

— Todos, saiam do castelo! AGORA! 

A coisa crescia a cada segundo, suas formas se distorcendo enquanto era esmagada pelo teto. Mas, em vez de morrer, continuava se regenerando, fazendo com que o castelo se tornasse um chafariz de sangue. 

Então, finalmente, a estrutura não resistiu. 

O topo do castelo se rompeu, pedras caindo aos pedaços. Um rugido ensurdecedor preencheu o céu. 

Uma criatura colossal — mais de vinte metros de altura — ergueu-se entre os destroços. Seu corpo pulsava com um brilho vermelho.

Roghan ficou pálido. 

— Um Gorlak… não pode ser… 

A lendária criatura devoradora de mana. E ela acabava de surgir no coração de Cirgo. 

Cirgo, onde Serena havia liberado quantidades absurdas de mana por anos. Um verdadeiro banquete para um monstro faminto. 

Naquela noite, pela primeira vez em décadas, as sirenes de perigo soaram pelo reino. 

As portas se fecharam e as pessoas que já estavam escondidas ficaram ainda mais apavoradas.

E, no centro de tudo, o Gorlak rugiu.

∘₊✧──────✧₊∘

Enquanto eu continuava meu caminho, percebi que o lugar era incrivelmente mal cuidado. Quanto mais fundo eu entrava, pior ficava. Havia sangue no chão, nas paredes, passagens quebradas. Mas acho que já estou perto de sair desse labirinto maldito.

Isso não é o que eu esperava quando cheguei aqui... pensei, um pouco desanimado.

Eu estava esperando algo mais... Simples? Talvez uma recepção milagrosa e uma boa oportunidade? Mas não, estou andando num labirinto em um lugar onde provavelmente torturas aconteceram. Tudo é sujo e fedido. Ter sentidos tão apurados é um saco às vezes.

O cheiro de mofo e podridão impregnava o ar, tornando cada respiração um esforço nauseante. O chão estava coberto por uma camada pegajosa de sujeira e sangue seco, que grudam nas minhas botas a cada passo. As paredes, outrora talvez majestosas, agora estavam cobertas de manchas escuras e rachaduras.

Eu não conseguia evitar olhar para baixo com uma expressão triste. Mas então, escutei algo parecido com um "clack". O primeiro som diferente que ouvi até agora.

Esse sentimento... Um frio familiar. Estranhamente, a temperatura caiu ainda mais. Talvez eu já devesse estar bem fundo nesse esconderijo.

O ambiente parecia vivo, como se as sombras nas paredes estivessem me observando, esperando o momento certo para atacar. O ar estava pesado, carregado de uma sensação de abandono.

Com isso, fiz meu caminho pelos corredores do labirinto. Se meus sentidos estiverem certos, a saída deve ser por aqui...

Então, uma porta de metal reforçado estava no meu caminho. Claro, eu a abri sem muitas dificuldades com minhas mãos nuas. O metal rangeu e se dobrou sob minha força, ecoando pelo corredor vazio. Atrás da porta, uma enorme escadaria se revelava. Dessa vez, estava mais limpa, mas ainda assim, o cheiro de sangue estava lá também.

Eu comecei a descer a escadaria, o som da minha bota aumentando a cada passo, "tec, tec". Quanto mais eu descia, mais escuro ficava, mas isso não era um problema, eu conseguia enxergar perfeitamente. As paredes de pedra ao meu redor pareciam fechar-se, tornando o ambiente claustrofóbico. O ar estava pesado, carregado de umidade e um odor metálico.

De repente, um grito de agonia ecoou pelas paredes, reverberando na escuridão. Era um som gutural, cheio de dor e desespero, que me fez arrepiar. Parei por um momento, tentando localizar a origem do som. A criatura estava em algum lugar abaixo de mim, sua voz carregada de sofrimento.

— Aaaaahhh! — o grito ressoou novamente, mais próximo desta vez. — Por favor... me ajude...

A voz era fraca, quase inaudível, mas carregava uma carga emocional que me fez estremecer. Continuei descendo, cada passo me aproximando mais da origem daquele som horrível. O ambiente ao meu redor parecia pulsar com uma energia maligna.

Finalmente, cheguei ao final da escadaria. A escuridão era quase total, mas meus olhos se ajustaram rapidamente. O corredor à minha frente estava coberto de sombras, e o cheiro de sangue era ainda mais forte aqui. O grito da criatura ecoava novamente, desta vez mais fraco, como se estivesse perdendo as forças.

— Por favor... — a voz sussurrou, quase inaudível. — Não me deixe aqui...

Eu avancei cautelosamente, meus sentidos em alerta máximo. De repente, uma figura emergiu das sombras, cambaleando em minha direção. Era um humano, ou pelo menos, o que restava de um. Sua pele estava pálida e em decomposição, os olhos vazios e sem vida, com o estômago aberto, revelando seus órgãos podres. Um zumbi.

— Aaaaahhh! — o zumbi gritou, avançando para mim com uma velocidade surpreendente.

Eu reagi instintivamente, desferindo um golpe com minhas garras. O impacto cortou o ar e atingiu o zumbi, que caiu no chão com um som surdo. O corpo se contorceu por um momento antes de ficar imóvel, um líquido escuro escorrendo de sua ferida. Sua cabeça inteira foi partida em pedaços.

Respirei fundo, tentando acalmar meus nervos. Então era daqui que todos aqueles zumbis vieram.

Olhei ao redor e percebi que estava em uma sala cheia de jaulas e cadáveres. As jaulas estavam enferrujadas e cobertas de sangue seco, e os corpos dentro delas... Estavam bem piores do que o zumbi que acabei de matar.

Sinto muito. Descansem agora.

No fundo da sala, outra escadaria se revelava, descendo ainda mais para as profundezas do labirinto. Engoli seco pensando no que mais eu veria se continuasse, mas segui em frente.

∘₊✧──────✧₊∘

Serena estava mergulhada em uma escuridão familiar, o manto silencioso que sempre a envolveu. Mas algo estava errado. O frio que deveria entorpecê-la não era tão intenso. Seu corpo tremia, e [Rosa Gélida] reagiu instintivamente. 

O homem encapuzado, concentrado no painel da máquina onde Serena estava presa, sentiu a mudança no ar. A temperatura despencou de repente. Ele desviou o olhar do visor – que marcava 67% – e percebeu que algo estava fora de controle. 

Serena despertou com uma onda de confusão. Seu coração disparou ao perceber que não estava mais em seu quarto. As cores e formas ao seu redor eram estranhas, irreconhecíveis. O ambiente ainda era frio, mas não o suficiente. Algo estava errado. 

[Rosa Gélida] não esperou por sua usuária. O sequestrador se moveu para trás no último segundo, escapando por pouco de ser perfurado por lanças de gelo. Ele não saiu ileso. Cortes finos se abriram, e o sangue quente escorreu por sua pele. 

Serena caiu de joelhos ao quebrar a vidraça da máquina, derramando o líquido esverdeado no chão, o corpo dela enfraquecido pela mudança brusca de temperatura. A dor em seu peito era sufocante. Tossiu, lutando para respirar. [Rosa Gélida] continuava a protegê-la, mesmo que ela estivesse indefesa. 

O homem não perdeu tempo. Pegou uma arma com tranquilizante e disparou. 

A agulha voou na direção de Serena. Mas não chegou perto. 

Um escudo de gelo irrompeu do chão e bloqueou o projétil. A agulha congelou instantaneamente, estilhaçando-se ao tocar o chão. 

Ele recuou. A situação saía de seu controle. Serena não era uma vítima indefesa enquanto aquela habilidade estiver ativada, habilidade essa que ele não sabia como lidar.

Antes que pudesse reagir, um tentáculo de gelo avançou em sua direção. 

Ele pensou que seria seu fim. O ataque era rápido, implacável. Mas, a milímetros de seu rosto, o gelo se desfez em uma explosão de cristais, removendo seu capuz. O choque percorreu sua espinha. Se [Rosa Gélida] não estivesse enfraquecida, ele estaria morto. 

A máquina havia drenado parte do poder de Serena. E isso significava que ela já estava no limite. 

A cápsula diante dele servia para roubar habilidades únicas. O plano era extrair [Rosa Gélida], uma raridade que não podia ser desperdiçada. Na visão dele, era a única coisa de valor que aquela família tinha.

Mas não houve tempo para comemorar. 

O silêncio foi interrompido por passos firmes ecoando do lado de fora. O homem virou a cabeça, seus olhos fixos na porta. 

Então, uma explosão. 

A porta de metal foi arrancada de suas dobradiças e caiu com um estrondo.

A fumaça se dissipou lentamente, mas o homem já sabia quem estava ali. O olhar dourado brilhando na penumbra e as roupas de frio azuis... Não havia dúvidas. 

Victor caminhou para dentro, ignorando o ar pesado de tensão. Seus olhos percorreram o local até encontrarem Serena caída, pálida e trêmula. 

Ele franziu o cenho. 

— Então era você o tempo todo, mestre da guilda, Orion? 

As palavras soaram quase entediadas, mas nelas havia um peso que fez o estômago de Orion revirar. 

Orion abriu um sorriso nervoso, tentando esconder o incômodo. 

— Você não deveria estar aqui. 

Victor cruzou os braços, exalando irritação. 

— Pois é. Mas já que estou... — Ele inclinou a cabeça ligeiramente, os olhos cheios de desdém. — Você sequestrou uma garota cega? Não tem vergonha? 

O veneno na voz de Victor atingiu Orion como uma lâmina. 

Ele sentiu a garganta secar. Seu corpo instintivamente se enrijeceu. 

Merda... O 5º deveria ter me avisado que ele conseguiu chegar aqui por causa do teleporte!

O pânico se infiltra lentamente em sua mente. Tudo deveria estar sob controle, cada detalhe planejado. Mas ali estava ele, diante de Victor, e nada estava saindo como deveria. 

Por quê? 

Ele encarou o garoto à sua frente, buscando algo que o fizesse sentir que ainda tinha vantagem. 

É só um garoto... Dragan era forte, mas impulsivo. Deve ter sido por isso que perdeu. Esse moleque não pode ser tudo isso. 

Mas havia algo errado. Victor não parecia surpreso. Nem irritado com Orion em si. Ele estava simplesmente... cansado. Como se aquilo fosse apenas mais um problema chato para resolver. 

Isso incomodou Orion mais do que qualquer ameaça. 

Ele percebeu que Victor não estava ali para confrontá-lo por fúria ou vingança. 

Ele estava ali por pura coincidência do destino e estava determinado a destruir o que ele planejou por anos, isso era imperdoável.

Orion não sabia da verdadeira natureza de Victor, pois Sentil havia escondido esse detalhe dele. Então Orion se agarrou na falsa esperança de que ele era apenas uma criança.

Orion apertou o punho ao redor da adaga oculta. Seus olhos seguiram cada mínimo movimento de Victor, buscando uma abertura. 

Vou acabar com isso rápido.

A confiança crescia em seu peito à medida que sua mente formulava um plano. Ele lançaria a adaga no ponto cego de Victor e, com Serena enfraquecida pela máquina, teria tempo para acabar com os dois antes que as coisas saíssem do controle. 

Com um movimento rápido, quase imperceptível, Orion lançou a adaga. Ela cortou o ar em um arco mortal, girando diretamente em direção ao peito do garoto. 

Por um instante, Orion teve certeza de que havia acertado. O brilho do metal refletiu a luz e, naquele breve segundo, ele acreditou que era o fim. 

Mas então... silêncio. 

Victor não gritou. Não cambaleou. Não caiu. 

Nada. 

O coração de Orion parou por um instante. Seu olhar varreu a cena, tentando entender o que havia dado errado. 

Foi quando uma voz tranquila cortou o momento. 

— Tá tudo bem? Ele te machucou? 

Orion congelou. 

A voz vinha de trás dele. 

O suor frio escorreu por sua testa. Ele não tinha visto Victor se mover. Não tinha sentido sua presença mudar de lugar. 

Lentamente, ele virou a cabeça, como se seu próprio corpo se recusasse a acreditar no que estava acontecendo. 

Victor estava ajoelhado ao lado de Serena, sua expressão não carregava nenhuma fúria ou urgência. Apenas uma calma desconcertante. 

Ele nem sequer olhava para Orion. 

Orion sentiu algo apertar dentro de seu peito. 

Ser ignorado... era insuportável. 

Ele, o mestre da guilda. O líder. O estrategista. O que sempre teve o controle. 

E agora, ali estava Victor. Um garoto que o tratava como se ele fosse irrelevante. Como se ele não fosse sequer uma ameaça digna de atenção. 

A raiva borbulhou dentro dele, alimentada pela inveja. 

Ele nem se esforça...

Serena, aquela garota, nasceu forte. Nunca precisou lutar pelo poder que tinha. E agora Victor, outro prodígio, mais forte que ele sem nunca ter batalhado para alcançar aquilo. 

Por que eles tinham tudo tão fácil? 

Enquanto sua mente fervilhava, Victor ignorava completamente sua existência. 

Ele colocou a mão no ombro de Serena com gentileza, seus dedos passando de leve sobre o tecido frio de sua roupa. A [Rosa Gélida] não reagiu, era como se ela nem estivesse ali. 

Serena soltou um suspiro baixo, seu corpo relaxando. 

— Sim… obrigada pela preocupação… 

Seu tom estava fraco, mas diferente de antes, havia uma calma genuína em sua voz. 

Ela não enxergava Victor, mas sentia sua presença. Ele era quente. Seguro.

Os dedos de Victor deslizaram pelo braço dela, levemente. 

— Você consegue se levantar? 

Serena tentou mover os braços, mas sentiu as pernas pesadas. A máquina a drenou muito e a mudança de temperatura não ajudava.

Victor não esperou. 

Com um movimento firme, mas cuidadoso, ele passou um braço sob as pernas dela e outro pelas costas, erguendo-a nos braços sem esforço. Serena sentiu o calor do corpo dele contrastar com a frieza de seu próprio corpo. 

Victor deu uma leve franzida na testa, notando a diferença de altura entre os dois. 

— Isso parece meio estranho... — murmurou ele, como se estivesse falando consigo mesmo. — Você é mais alta que eu. 

Serena soltou um riso fraco, sincero. 

— … E você reclama disso agora? 

Victor deu um meio sorriso, mas não respondeu. 

Para Orion, porém, aquela cena foi insuportável. 

Seus punhos se apertaram até os nós dos dedos ficarem brancos. 

Eles me ignoram.

Eu sou o mestre aqui!

Victor caminhou com Serena nos braços, a colocando cuidadosamente em um canto seguro da sala. Seus movimentos eram rápidos, precisos, mas cheios de cuidado. Era como se, naquele momento, ela fosse a prioridade máxima dele. O que de fato era.

— Fique aqui. Logo eu vou te levar pra casa. 

Serena apenas assentiu.

Então, Victor finalmente se voltou para Orion. 

Agora, ele estava pronto para lutar. 

O olhar dourado pousou sobre Orion, e sua expressão era séria. Não havia raiva. Não havia ódio. Apenas uma determinação inabalável. 

Por dentro, porém, Victor sentia seu peito apertar. 

Eu nunca lutei com alguém como ele antes. Eu nunca lutei de verdade para proteger alguém...

A pressão era esmagadora. 

Mas ele não iria demonstrar isso, não agora.

Se eu hesitar, ela pode se machucar, talvez morrer.

Seus dedos se fecharam levemente. 

O nervosismo ainda estava ali, cravado em sua mente, mas ele não poderia permitir que isso o travasse. 

Uma vida depende unicamente de mim. Não posso falhar… Não posso perder.

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