Prólogo

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O sol da manhã mal atravessava as janelas altas do grande salão. A luz dourada filtrava-se pelas vidraças, lançando sombras longas e austeras pelas paredes de pedra. O silêncio era quase absoluto, quebrado apenas pelo som de passos lentos e firmes ecoando pelo chão frio. As portas pesadas rangeram ao se abrir, e Jane entrou.

Seu sobretudo branco ondulava levemente atrás de si, contrastando com as roupas negras que moldavam seu corpo. Sua pele morena absorvia a pouca luz, e seus olhos vermelhos, com um toque rosado, capturavam cada detalhe do ambiente. Seus cabelos curtos, de um vermelho intenso, pareciam brilhar sob os raios tímidos do sol. Na cintura, a espada longa balançava suavemente a cada passo, a bainha branca destacando-se contra suas vestes escuras.

À sua frente, o rei a aguardava. Sentado em seu trono, rodeado por conselheiros de expressão severa, ele parecia uma figura esculpida em mármore, inabalável. O olhar dele não expressava afeto, apenas expectativa. Jane já sabia o que viria.

— Os relatórios das guarnições — disse ela, sem emoção, estendendo um rolo de pergaminho.

O rei pegou os documentos sem desviar o olhar dela.

— E o progresso? Os soldados estão evoluindo como esperado?

— Algumas unidades demonstram avanço, principalmente ao leste. Mas o norte... — ela hesitou, sabendo que seu pai detestava fraquezas. — Está atrasado. Sem instrutores adequados, eles não passarão de peso morto.

O rei franziu o cenho brevemente antes de acenar para um dos conselheiros, que tomou nota. — Providenciarei reforços para o norte — respondeu, sem surpresa.

O rei respirou fundo antes de prosseguir. — Agora, sobre a outra questão...

O ar pareceu congelar. Jane manteve-se imóvel, mas sentiu o peso daquilo em cada músculo do corpo. Ela já sabia a quem ele se referia.

— Ele ainda está no reino — disse o rei, sua voz carregada de uma firmeza quase cruel. — Já se passaram meses, e você ainda não conseguiu trazê-lo de volta.

Jane abriu a boca para responder, mas o rei continuou antes que ela pudesse dizer qualquer coisa.

— Você é uma comandante capaz. Uma guerreira formidável. Mas sua força nunca esteve em questão. O que está em questão é sua lealdade à coroa. Seu irmão precisa voltar, e você ainda não o trouxe.

O silêncio no salão era opressivo. Os conselheiros observavam sem dizer uma palavra, mas Jane sentia a pressão nos olhares frios e calculistas. Não era apenas uma ordem. Era um ultimato.

— Ele não pode continuar fugindo de suas responsabilidades — continuou o rei. — E você não pode continuar voltando de mãos vazias. Isso não é apenas uma missão. É uma ordem real.

Ela baixou os olhos por um instante, sentindo a raiva fervilhar sob sua pele. Não apenas por causa de seu irmão, mas pelo destino que lhe fora imposto. Por mais que lutasse, nunca seria vista por si mesma, mas sempre como a sombra do príncipe fugitivo.

Finalmente, levantou o olhar e respondeu com a voz firme, mas carregada de algo mais profundo.

— Não retornarei até que ele volte.

O rei relaxou minimamente, aprovando sua resposta. — Bom. Faça o que for necessário.

Jane virou-se e saiu do salão. Seus passos eram tão firmes quanto antes, mas dentro dela, a tensão crescia como uma correnteza prestes a romper suas margens. Seu peito queimava, sua mente fervilhava.

Ela prometera cumprir a ordem. Mas, no fundo, não podia ignorar a dúvida inquietante que crescia dentro dela.

E se, no fundo, ela não quisesse que ele voltasse?

Se seu irmão retornasse, seu dever estaria cumprido. Mas ela sabia que isso significaria algo mais. Significaria perder sua própria liberdade.

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