O Sonho de Lancelot

Enquanto dormia, Lancelot teve um sonho.

Ele estava em um lugar escuro e silencioso, que parecia se estender ao infinito. De repente, uma figura feminina se formou à sua frente. Após avaliar a belíssima silhueta diante de si, Lancelot fez uma expressão malignamente cômica e estendeu os braços para tentar agarrá-la.

Conforme avançava em direção à figura, seus dedos se moviam loucamente—ora apertando e afrouxando o ar, ora dedilhando como se tocasse um violão. Já próximo dela, estava tão animado que começava a salivar como um personagem de desenho animado. E, no momento de sua glória... suas mãos atravessaram a imagem, cortando o ar. Era como se não houvesse nada ali. Completamente confuso, ele murmurou:

— Ué?!

Lancelot continuou balançando os braços freneticamente, tentando tocar a imagem etérea, mas sem sucesso. A figura misteriosa, que até então mantinha uma expressão serena, franziu o cenho em desaprovação e disse firmemente:

— Cavaleiro fraturado...

Antes que ela pudesse continuar, Lancelot deu um salto para trás, arregalou os olhos e, em um misto de pavor e confusão, gritou:

— Ai, minha Nossa Senhora!!!

A figura interveio energicamente:

— Recomponha-se, criatura! Tenho algo muito importante a lhe dizer.

Sem graça, Lancelot tentou balbuciar algumas palavras enquanto se levantava:

— Sssabe... é queee... ach... achei que f-f-fosse... um daqueles... s-sonhos... que a g-gente sabe... que tá sonhando... e...

A figura etérea o interrompeu:

— Isso não importa! Meros desejos carnais são insignificantes para minha existência.

Ele rapidamente assumiu uma postura de soldado exemplar:

— Sim, senhora! Estou honrado em estar diante de sua ilustríssima presença!

Mais relaxado, acrescentou:

— Mas, exatamente, quem seria a senhora mesmo?

A entidade respondeu com solenidade:

— Tenho muitos nomes e nenhuma forma. Existo no tempo entre o tempo e ao seu redor. Já fui reverenciada como deusa e antagonizada como demônio. Crio e extingo a vida ao meu prazer, pois o que me é caro é o ciclo eterno da destruição e da reconstrução.

A mente de Lancelot parecia ter queimado um fusível. Ele a observava com olhos confusos, como se sua cabeça estivesse prestes a explodir.

Percebendo a perplexidade do cavaleiro, a entidade acrescentou:

— Eu sou a Vontade do Mundo. E a minha vontade é eterna e insaciável.

Lancelot coçou a cabeça e perguntou:

— Ô, senhora Vontade...

Com certa hesitação, continuou:

— Se a senhora não tem forma, então por que... digamos, é tão atraente?

— Esta aparência é apenas algo que julguei que lhe agradaria e seria compreensível para você. Se isso o incomoda, posso me materializar como o que você entende como homem.

Lancelot respondeu prontamente:

— Não! Que isso...

E, baixinho, com a voz mais fina e manhosa, completou:

— Não me incomoda não... nem um pouquinho...

Ele sorriu marotamente.

A Vontade do Mundo então retomou seu discurso:

— Ó cavaleiro fraturado, em teu tempo, falhaste em tua tarefa e vosso rei faleceu. Trouxe-te a este mundo para que minha vontade e meu desejo sejam cumpridos. Aquele que tu chamas de Alyxzandre carrega o espírito e as virtudes do Artur do teu tempo. Deves lutar ao lado dele, pois ele é a chave para um novo recomeço. Lancelot, eu lhe ofereço uma segunda chance.

Eufórico, Lancelot exclamou:

— Eu sabia! Eu reconheceria vossa majestade, o rei Artur, em qualquer situação!

Mas então, com uma expressão intrigada, continuou:

— Esse mundo... é muito diferente do meu. Onde exatamente estou?

— Tu estás em teu próprio mundo, mas não como o conheceste. Revivi-te e levei-te dez mil anos ao futuro. Quando falhaste, teu espírito se fraturou. O elo que tinhas com teu rei era muito poderoso. Se não o consertar neste tempo, não haverá outros ciclos de reencarnação.

Após uma breve pausa, ela continuou:

— Então, cavaleiro, aceitarás tua segunda chance e cumprirás minha vontade?

Confiante, Lancelot declarou:

— Sim, aceito seu acordo! Mas farei isso pelo meu rei e estimado amigo, não pela sua vontade ou qualquer coisa sobre espíritos e fraturas.

A Vontade do Mundo, enquanto começava a desaparecer, respondeu:

— Que assim seja...