Capítulo 0 - Ecos do Vazio

“Em tempos antigos, quando o mundo ainda se chamava Sünethera, magia e ciência caminhavam lado a lado. Harmonia e progresso floresciam sob três luas. Mas nem todo equilíbrio dura para sempre.”

Há 1246 anos, o pior aconteceu.

Uma guerra.

Não por terras, não por riquezas... mas por ideologias. A magia, com seus mistérios, runas e espíritos, contra a ciência, com suas fórmulas, engrenagens e precisão. O que antes era complementar tornou-se oposição. O mundo partiu-se ao meio — as nações arcanas de um lado, e as tecnocracias do outro.

Ao longo dos séculos, essas duas forças se enfrentaram inúmeras vezes. Cada guerra mais cruel. Cada armistício, mais frágil. Mas nenhuma foi como a que viria...

A última grande guerra.

Uma guerra global.

Nas planícies, monstros de aço rugiam contra a terra. No céu, máquinas encantadas e dragões artificiais disputavam o domínio das nuvens. Nos mares, encouraçados rúnicos e torpedos mágicos transformavam oceanos em cemitérios. Terra, mar e céu se tornaram palco de um único confronto brutal e cruel.

E então, quando tudo parecia perdido...

...duas almas nasceram.

Nael Einsenhart, um jovem forjado entre marchas militares, camadas de fumaça e engrenagens metálicas.

Sayune Mikazari, uma híbrida de sangue mágico e coração ferido, peregrina entre ruínas e julgamentos.

Nascidos em lados opostos, unidos por algo que nem o próprio mundo entendia:

Dor semelhante. Sonhos semelhantes. Cicatrizes semelhantes.

Inspirados por um mito antigo de uma terra esquecida chamada Ergavia, onde ciência e magia coexistiram em paz, eles ergueram Toravon — uma nação onde nenhuma criança precisasse escolher entre o dom e o raciocínio.

[Império de Eldravia, noite – muito anos depois]

— É verdade que vocês quase se mataram? — perguntou a garotinha, os olhos arregalados de curiosidade enquanto subia no colo do pai.

O irmão mais velho, encostado no batente da porta, suspirou:

— Você sempre acredita em tudo que escuta...

O homem riu, balançando a cabeça.

— Bom... não foi exatamente assim. Mas sim, foi um longo caminho até aqui.

— Então conta! — insistiu a mais nova, abraçando as pernas do pai.

— Hmm... Já está ficando tarde. Vão perguntar pra sua mãe se podem ficar acordados só mais um pouquinho.

A pequena correu pelo corredor animada:

— Mãããe! Posso ficar acordada pra ouvir uma história do papai?

Uma voz respondeu da cozinha, com ternura e um leve tom de rendição:

— Só se prometer que não vai dormir no meio.

— Prometo!

O irmão mais velho rolou os olhos, mas se aproximou com um leve sorriso escondido. Sentou-se ao lado do pai no chão da varanda, de onde era possível ver as luzes vivas da cidade — sem muralhas, sem divisões, apenas telhados distintos e torres usando engenharia como base.

O homem observou os dois por um instante. Depois, ergueu os olhos para o céu, onde as três luas de Sünethera pairavam em silêncio, iluminando a terra que ele e a mãe deles ajudaram a reconstruir.

— Então escutem bem...

— Porque essa história começa muito antes de vocês nascerem. Muito antes da paz.

Numa época em que o mundo era dividido por medo.

E esperança... era apenas um sussurro entre as ruínas.