A redação do Planeta Diário estava mais silenciosa que o normal, o zumbido das rotativas abafado pela tensão que pairava no ar. As manchetes do dia, espalhadas pelas mesas, ecoavam a divisão de Metrópolis:
“Superman Falha: Cidade em Ruínas” competia com “Herói ou Vilão? A Verdade Sobre o Homem de Aço”. Clark Kent, sentado em sua mesa, encarava a tela em branco de sua máquina de escrever, os dedos imóveis.
O cristal kryptoniano, escondido em seu bolso, parecia mais pesado que nunca, pulsando com a promessa de respostas
— e o risco de novas perguntas.
Ele ouviu os passos decididos de Lois Lane antes de vê-la. Ela parou ao lado de sua mesa, segurando um exemplar do jornal com sua última matéria, a tinta ainda fresca. “Você leu isso, Kent?”
Sua voz era cortante, mas havia um traço de preocupação por trás da fachada. “A cidade está rasgada ao meio por causa dele. E eu ainda não sei se Superman é a solução... ou o problema.”
Clark ajustou os óculos, forçando a timidez que se tornava cada vez mais difícil de sustentar. “Ele salvou pessoas, Lois. Você viu. Talvez... talvez ele só precise de uma chance.” Ele hesitou, os olhos encontrando os dela por um instante.
“Você não acha?”
Lois cruzou os braços, o olhar penetrante. “Chances são para quem explica, Kent. Ele hesitou ontem. Algo o está abalando, e eu vou descobrir o quê.” Ela se inclinou, a voz baixando. “E você, Clark, precisa parar de se esconder. Ou vou começar a achar que você sabe mais do que diz.”
Antes que Clark pudesse responder, Jimmy Olsen entrou correndo, ofegante. “Lois! Clark! Vocês têm que ver isso! Luthor está na TV, fazendo um pronunciamento!”
Na sala de conferências do Planeta Diário, uma televisão antiga exibia Lex Luthor em um púlpito reluzente, o logotipo da LexCorp brilhando ao fundo.
A multidão na tela
— políticos, jornalistas, cidadãos comuns
— o encarava com uma mistura de admiração e medo. Luthor, impecável em seu terno, ergueu as mãos para silenciar os murmuros.
“Cidadãos de Metrópolis,” começou, sua voz firme como aço, “ontem, testemunhamos a verdade sobre o chamado ‘Superman’. Ele destruiu nossa tecnologia de defesa, deixou nossas ruas em ruínas e fugiu sem explicações.
Pergunto: é isso que queremos? Um alienígena com poder ilimitado, sem lealdade à humanidade?”
Clark, de pé ao fundo da sala, sentiu um nó no estômago. Ele viu Lois anotando furiosamente, os lábios apertados, enquanto Jimmy balançava a cabeça, murmurando: “Isso não é justo...”
Luthor continuou, apontando para uma projeção holográfica: uma silhueta de Superman, com a palavra “AMEAÇA” estampada em vermelho.
“A LexCorp oferece uma alternativa,” disse Luthor, revelando um novo drone, maior que os anteriores, com um brilho verde em seu núcleo. “Este é o Guardião, projetado para neutralizar qualquer força alienígena. Com ele, Metrópolis estará segura
— sem depender de um estranho do espaço.”
A transmissão terminou com aplausos, mas na redação, o silêncio era ensurdecedor. Lois jogou o caderno na mesa, furiosa. “Ele está transformando Superman em um monstro.
E a cidade está comprando isso!”
Clark pigarreou, a voz suave. “Talvez... se alguém contasse a história de Superman, mostrasse quem ele é de verdade...”
Lois o encarou, surpresa com a intensidade em sua voz.
“Você tá sugerindo que eu defenda o cara? Depois de ontem?” Ela hesitou, então suavizou. “Talvez você tenha razão, Kent. Mas pra isso, eu preciso de fatos, não de façanhas heroicas. Quem é ele? De onde veio?”
Clark desviou o olhar, o cristal pulsando em seu bolso. Ele queria contar, mas as palavras de Jor-El
— perigo
— o seguravam. “Você vai encontrar as respostas, Lois,” ele disse, por fim. “Você sempre encontra.”
Naquela noite, Kal-El voou para o Ártico, o vento gelado cortando sua capa enquanto ele mergulhava na caverna de gelo.
O cristal, agora em suas mãos, brilhava com mais intensidade, como se respondesse à sua presença. Ele o inseriu em uma fenda na rocha, e a caverna se iluminou com projeções holográficas.
A voz de Jor-El voltou, mais clara, mas ainda fragmentada.
“Kal-El, a colônia kryptoniana sobrevive em Zorath, um planeta escondido na borda da galáxia. Mas o Farol que você encontrou... ele atrai um inimigo antigo. Se ativado, pode trazer esperança... ou destruição.”
A imagem mostrou uma paisagem alienígena: torres cristalinas sob um céu vermelho, kryptonianos trabalhando em harmonia. Então, a cena mudou para uma sombra colossal, uma máquina viva que engolia as torres como um predador.
Kal-El recuou, o coração disparado. Um inimigo antigo. Seria isso que Luthor estava explorando?
Ele pegou o cristal, decidido a protegê-lo, mas uma dúvida o corroía: e se a colônia precisasse dele? E se seu lugar não fosse na Terra? Ele voou de volta a Metrópolis, a cidade brilhando como um farol sob as estrelas, mas pela primeira vez, sentiu que não pertencia totalmente a ela.
No dia seguinte, Lois publicou uma nova matéria: “Superman: Um Herói Sob Julgamento”. O texto não absolvia o Homem de Aço, mas desafiava as acusações de Luthor, apontando inconsistências na narrativa da LexCorp.
Ela usou fotos de Jimmy, mostrando Superman salvando pedestres durante o ataque do robô, e questionou: “Por que Luthor teme tanto um homem que arrisca tudo por nós?”
A matéria causou alvoroço. Clark a leu na redação, escondendo um sorriso. Lois estava lutando por ele, mesmo sem saber quem ele era. Mas quando ele se aproximou para parabenizá-la, ela o cortou, a voz fria.
“Kent, você é bom em sumir, mas péssimo em aparecer quando importa. Se quer ser repórter, comece a agir como um.” Ela passou por ele, deixando-o com uma pontada de culpa.
Clark sentou-se, o cristal pesando em seu bolso. Ele precisava deter Luthor, proteger o Farol e, acima de tudo, ganhar a confiança de Lois
— não como Superman, mas como Clark. Mas com a cidade virando as costas e um inimigo kryptoniano à espreita, ele sabia que o símbolo em seu peito nunca parecera tão frágil.