A lua cheia pairava sobre os céus de Vernhollow como um olho silencioso, observando cada movimento na escuridão. Os aldeões dormiam, ignorantes do peso que compartilhavam com o recém-nascido marcado pelo destino.
Mas nem todos dormiam.
No topo da colina mais afastada da aldeia, oculto por um feitiço de distorção, um homem observava a cabana de Mila. Seu manto era feito de peles e sombras, e seus olhos brilhavam em âmbar sob o capuz.
— O herdeiro respira... — murmurou.
Ao seu lado, uma mulher de cabelos cor de cinza o acompanhava. Ela não tinha olhos, apenas fendas costuradas por fios de prata, mas enxergava mais do que qualquer vidente.
— E o selo reagiu ao nascimento. Os Protetores já devem estar sentindo.
— Ainda assim... nenhum deles virá tão cedo. Estão ocupados demais alimentando seus próprios tronos — disse o homem, cuspindo no chão.
Ela assentiu lentamente, virando o rosto na direção da cabana.
— Então nós guardaremos as margens da estrada até que ele caminhe por elas.
E com isso, ambos desapareceram em fumaça escura, como espectros obedientes a uma promessa ancestral.
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Cinco anos depois...
Lior corria pelas trilhas de Vernhollow com um pedaço de madeira na mão, fingindo lutar contra monstros invisíveis. Seus cabelos negros estavam desgrenhados, e o rosto sujo de terra — mas seus olhos, tão parecidos com os de Elion, brilhavam com um fogo inato.
— A rainha das serpentes vai me pegar se eu não chegar na ponte! — gritou, rindo, enquanto saltava entre pedras e raízes.
Mila o observava de longe, sentada no degrau da casa. Seu sorriso era gentil, mas por dentro, ela carregava a constante inquietação de uma mãe que sabe que o tempo não perdoa.
Ela sabia que o mundo ainda não tinha esquecido o nome que jamais deveria ser pronunciado.
Naquela noite, enquanto Lior dormia profundamente com a madeira ainda em mãos, Mila acendeu uma vela e retirou um velho baú debaixo do assoalho.
Lá dentro havia um manto azul escuro com bordados de runas, uma adaga com lâmina curva, e um colar com três círculos entrelaçados — o mesmo símbolo marcado no peito do filho.
Ela passou os dedos sobre os objetos. Sua voz saiu baixa, trêmula:
— Ele não pode saber ainda... mas o sangue dele não pertence a este chão.
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Em algum lugar distante...
No Salão das Almas Seladas, onde apenas membros da Ordem Suprema tinham acesso, os sinos mágicos tocaram pela primeira vez em séculos.
Os Protetores despertaram de seus tronos encantados.
— Está acontecendo — sussurrou Vaelis, com os olhos se estreitando. — A Marca de Elion... está ativa.
Seryan se levantou, lentamente, apoiando-se em seu bastão.
— Então o passado não foi enterrado... apenas adormecido.
Arva, com o olhar cheio de pesar, disse:
— Se ele descobrir quem é... se libertar a herança de Elion...
— ...então não haverá força capaz de contê-lo.
E no centro do salão, um antigo mapa se acendeu, revelando uma nova estrela pulsante no norte de Eltherion.
Os olhos dos seis traidores se voltaram para ela.
— Lior... — disse Seryan, finalmente. — Que os deuses tenham piedade de ti.