A Força da Princesa II

O espaço ao redor de Mabel se distorceu no instante em que Sekai liberou sua magia.

— Juyona Kawa: Ilusion Area... — murmurou ele, e então tudo mudou.

O chão tremeu levemente, a iluminação oscilou, e a presença mágica de Sekai se espalhou como uma teia. Clones começaram a surgir. Não eram apenas imagens paradas, mas réplicas em movimento, respirando, sorrindo com o mesmo sarcasmo irritante.

Mabel imediatamente saltou para o alto, desaparecendo e reaparecendo acima das cópias. Tentou localizar o original enquanto uma esfera de mana se formava em sua palma. Jogou-a direto contra o que parecia ser Sekai — só para vê-lo desmanchar-se em fumaça.

— Tá brincando comigo? — grunhiu.

Ela girou no ar, pousando de costas contra um pedaço de concreto, e recuou. Outro clone apareceu por trás, com um chute rápido. Ela bloqueou com o antebraço, mas a força era real. O impacto a fez escorregar, os pés arrastando no chão.

— Ah... então tem um entre eles que é o verdadeiro. — Ela cerrou os punhos, olhando ao redor. — Covarde, usando bonecos pra brigar?

A resposta veio de várias direções ao mesmo tempo, com o mesmo tom debochado:

— Se você cair pra um boneco, o problema não sou eu.

Clones avançaram. Mabel desviou de dois socos, desferiu um chute em um terceiro e recuou novamente. Golpeou outro com um direto no estômago — se desfez. Ela rugiu e girou, tentando acertar o próximo, mas só acertava ar. Mais dois vieram por cima e ela se agachou. Um corte real passou de raspão na lateral da barriga.

Ela recuou, ofegante. O campo todo estava tomado. Cada esquina do salão destruído tinha um Sekai. Alguns andavam. Outros apenas a observavam. Todos com aquele mesmo sorriso irritante.

— Me dá um segundo e eu juro que arranco esse sorriso da tua cara — cuspiu.

Ela desapareceu de novo, tentando escapar da confusão, mas reapareceu direto num soco vindo de um clone. O impacto foi real. Ela caiu para trás, rolando entre estilhaços de vidro e tábuas quebradas. Tossiu. Sangue no canto da boca.

Sekai surgiu do alto — talvez fosse ele, talvez não. Ela ergueu uma parede de mana. Protegeu-se de uma lâmina, mas um chute veio por baixo. Ela se desequilibrou e caiu de lado, girando para trás num movimento desajeitado.

— Tá começando a parecer luta de verdade agora — comentou Sekai, surgindo do lado oposto ao chute.

Ela se levantou de novo, com um gemido de dor. As roupas já rasgadas, escoriações pelos braços e pernas.

— Acha que eu vou cair por causa disso? Eu nem comecei a ficar séria — rosnou, cuspindo o sangue no chão e limpando com as costas da mão.

Clones se multiplicaram ainda mais. Havia agora pelo menos trinta ao redor. Um corria, outro pulava, um terceiro apenas assistia. Ela girava os olhos, tentando entender o padrão. Não havia.

Um chute veio de lado. Ela não viu. Um soco veio de cima. Tentou bloquear, mas seu braço já estava pesado. Foi arremessada contra uma coluna caída. A estrutura ruiu com o impacto, e ela caiu sentada no meio dos escombros.

“Merda… onde ele tá...?”

Sua respiração era irregular. A cabeça doía. Não conseguia se concentrar. Cada movimento parecia vir de um ponto cego. Nenhum sentido estava funcionando direito.

Ela se ergueu cambaleando, os olhos fixos em um dos clones. Desapareceu e reapareceu de novo atrás dele, o punho carregado de mana.

Errou.

O verdadeiro Sekai surgiu do lado oposto, deslizando no chão e cravando um chute na costela dela. Mabel girou no ar e caiu de lado, gemendo com raiva e dor.

— Pronto pra admitir que meu estilo é melhor? — Sekai comentou, rodando a espada com uma mão e jogando o peso do corpo de um lado para o outro, como se ainda estivesse aquecendo.

Mabel, de joelhos, cuspiu de novo.

— Teu estilo é chato, só isso.

Ela se levantou. De novo. Mesmo ofegante. Mesmo toda marcada.

— Você acha que isso é suficiente pra me derrubar?

Ela desapareceu de novo.

Sekai não respondeu. O sorriso permanecia. Mas dessa vez, ele ergueu a espada com ambas as mãos. O jogo ia continuar — e ela ainda não tinha vencido.

Mabel limpou a boca com o dorso da mão mais uma vez. O olhar sarcástico dela se apagou por um segundo, substituído por um foco frio e inabalável. O corpo ainda ardia, os músculos pesavam. Mas havia um limite para ser saco de pancada.

— Tá... agora eu cansei — disse, a voz mais baixa. — Você quer lutar de verdade, né?

Sekai girava a espada em uma das mãos, ainda sorrindo.

— Até que aguenta bem. Só fala demais

.

— O problema — ela começou, estalando os dedos — é que eu ainda não consigo controlar minha magia direito… — a energia começou a vazar, escapando pelas mãos, ombros e costas — …e nem alcancei o primeiro estágio como você.

Sekai parou. O sorriso permaneceu, mas os olhos estreitaram. Ele sentiu. A cidade inteira sentiu.

A mana de Mabel se expandiu como uma onda de calor. Ela não veio de uma vez — se espalhou lenta e constante, como uma pressão invisível descendo sobre os prédios. Em toda a região, magos, soldados e até refugiados olharam para o céu, sentindo o ar pesar. Ferme, Clemearl, True, todos notaram. Aquilo não era mana comum. Era energia real, bruta e primitiva. Mana de linhagem real.

— E mesmo assim... eu ainda sou mais forte do que você. — Ela ergueu as duas mãos. — Chrono Reverbis.

Runas se acenderam nos palmos de Mabel em um tom azul translúcido. As marcas giravam lentamente, formando uma seta circular que se conectava ao redor de uma esfera de mana transparente. Era pequena, elegante, mas pulsava com um peso absurdo. A aura do tempo em torno da esfera fazia o ar vibrar em distorções curtas, quase imperceptíveis.

Ela lançou a esfera contra o chão.

Assim que tocou o concreto, a esfera se partiu em feixes de energia azulados que espalharam-se como raízes, cobrindo o chão sob os pés dos dois combatentes. O tempo no campo de batalha mudou. Era como se um novo ritmo fosse imposto ao mundo. Sekai franziu o cenho — não havia entendido ainda.

Mabel desapareceu.

Reapareceu com um chute, Sekai bloqueou — mas sentiu o impacto. Ela chutou de novo, desta vez com força real. Sekai se afastou, girando no ar para se reposicionar, mas um chute de Mabel fez ele se desequilibrar.

— O que você fez? — gritou.

— Nivelei o jogo!

Sekai avançou com uma sequência de estocadas, rápidas e afiadas. Ilusões o seguiram, distorcendo seus rastros. Mabel girou no ar, desviando de duas lâminas, tomando outra de raspão. Mas seu corpo não sangrou.

O ferimento sumiu diante dos olhos dele.

Ela tombou no chão ao cair, o ombro deslocado — mas com um estalo de energia azul, o braço voltou para o lugar. A dor permaneceu — a expressão dela ainda tremia, os dentes cerrados — mas o corpo resistia.

— Esse feitiço… ele tá… retrocedendo os ferimentos? — Sekai arregalou os olhos.

— Não exatamente. — Ela o encarou, séria, enquanto se aproximava. — Ele apenas reverte o estado do corpo e desfaz qualquer efeito causado por feitiços. Não vai curar, mas impede que você me machuque mais em troca de eu sentir toda a dor ainda.

Ela sumiu de novo. Reapareceu em cima dele, soco direto no rosto. Sekai bloqueou, mas a mão dela prendeu a dele. Chute no estômago. Ele se dobrou, ilusão desaparecendo.

Outro clone se projetou para distraí-la. Ela o atravessou com a palma envolta em mana.

— Ilusão? Já entendi a estrutura. Você repete padrões demais. Agora só precisa de força. — Ela girou e chutou Sekai, que havia surgido por trás.

Ele se arrastou pelo chão e bateu contra a parede. Tentou se erguer, as pernas falharam.

— Droga… — murmurou, finalmente com o sorriso rachado. O sarcasmo sumira por alguns segundos.

Ela parou, ofegando. O corpo ainda tremia. Mas agora era ela quem dominava a luta.

— Eu não vou conseguir manter por muito mais tempo...

Sekai se ergueu com dificuldade, olhando para a esfera no chão que continuava a pulsar. Mabel ainda sentia dor — os músculos ardiam, a visão oscilava de tanto esforço — mas não parava. As ilusões dele que o favoreciam, agora mal duravam. O feitiço de Mabel estava fazendo mais do que apenas reverter os ferimentos dela. Estava afetando a a mana ao redor deles. Cada ilusão de Sekai sumia tão rápido quanto surgia, como se estivessem retrocedendo. As sombras e cópias dele desintegravam-se no ar, desfeitas pelas distorções temporais da esfera.

Mabel avançou, os olhos fixos em Sekai. Ele estava começando a ficar visivelmente frustrado.

Quando as lâminas apareceram ao seu redor, ela as viu com clareza — não havia mais distorção. Ela cortou o ar com um movimento rápido e, em um segundo, todas as lâminas desapareceram. Ele estava indefeso.

Sekai recuou, tentando mais uma vez criar uma ilusão para confundi-la, mas não havia mais tempo. A distorção do tempo lhe dava menos do que um segundo para reagir antes que ele fosse descoberto, e Mabel já havia aprendido como se esquivar das lâminas de metal.

Ela o empurrou para trás, e a luz azul da esfera iluminou a sala com uma intensidade mais forte. Sekai agora estava completamente exposto. Ele não podia mais se esconder atrás de suas ilusões. Mabel o dominou em uma série de golpes rápidos — mais eficazes, mais certeiros, com o feitiço desintegrando suas ilusões e retrocedendo suas tentativas de defesa.

Ele estava agora em uma posição extremamente desfavorável.

— Acabou, Sekai. — Ela sorriu, e sua voz era leve.

Sekai ainda estava ajoelhado no chão, ofegante, o corpo vibrando com a sobrecarga mágica. O suor escorria pela testa enquanto ele se levantava com esforço. As ilusões haviam sido quebradas, o campo de batalha estava devastado, e a mana de Mabel ainda era gigantesca. Ela permanecia ali, de pé, com a aura de Chrono Reverbis girando ao redor de seus pés, firme e estável, anulando os efeitos do combate anterior.

Ele ergueu a mão. Sua mana fluiu novamente, prontos para um segundo round.

Mas um impacto repentino no chão interrompeu tudo. Poeira se ergueu, os destroços próximos foram jogados para os lados. Uma silhueta feminina surgiu do meio da névoa, com passos firmes e olhar neutro. Ela carregava True nos ombros — ele arfava, a pele marcada pelas veias arroxeadas do veneno de Clemearl.

A garota lançou um olhar direto para Sekai.

— Já deu. Vamos embora.

Sekai a encarou com fúria nos olhos, mas se calou por um segundo.

— Você tá atrasada, Aiko.

Ela ignorou o comentário. Com uma mão, puxou um pequeno objeto de dentro da bolsa presa ao cinto e o exibiu no ar. Um artefato mágico dourado e estranho.

Mabel imediatamente perdeu o sorriso. Seus olhos se estreitaram. Ela deu um passo à frente.

— Onde conseguiu isso? — perguntou, a voz firme.

Aiko olhou para ela com desprezo, como se o simples fato de estar diante da princesa fosse ofensivo. O tom foi seco, direto:

— Isso não te diz respeito. E eu não preciso justificar nada pra uma nobre.

Mabel permaneceu parada, mas seu olhar ficou mais sério. Toda a leveza irônica de antes sumiu. Ela não respondeu de imediato. Observou o estado de True, depois analisou o artefato e Aiko.

Sekai, ainda ofegante, chutou um pedaço de entulho ao lado.

— Tava ficando divertido. A luta tava no ponto certo. Mas é claro que você ia estragar. Sempre estraga.

— Sekai, cala a boca e anda. — Aiko respondeu sem olhar pra ele. — Ou quer que ele morra?

Ele rangeu os dentes. Queria continuar. Queria ver até onde Mabel podia ir. Mas não ia deixar True ali para morrer. Respirou fundo e apontou para Mabel.

— A gente vai terminar isso, princesa. Não esquece esse nome: Sekai.

Mabel respondeu sem arrogância, mas com firmeza:

— Eu não vou esquecer. Nem o seu... nem o dela.

Aiko lançou um último olhar a Mabel — um misto de raiva e nojo — e sumiu em meio à fumaça ativando uma bomba de evasão. Sekai hesitou por um instante, depois sumiu com ela, deixando apenas o som abafado dos passos desaparecendo ao longe.

Mabel soltou a respiração que estava segurando, desativando o Chrono Reverbis. A esfera estalou com energia e se desfez em pequenas partículas azuis.

— Isso foi... perigoso — murmurou. — E eles estavam atrás do artefato desde o começo.

O campo de mana ao redor de Mabel cessou — e, no exato segundo em que a magia foi desativada, o peso real do combate caiu sobre ela como uma avalanche.

Os músculos da princesa enrijeceram. Um espasmo a fez recuar um passo. Em seguida, seus joelhos cederam.

— Ngh...!

Ela caiu com força no chão, apoiando-se com uma das mãos enquanto a outra apertava o abdômen. As feridas que haviam retrocedido com o feitiço não haviam desaparecido — estavam apenas suspensas no tempo. E agora, com o feitiço finalizado, todas as dores colapsaram de uma só vez sobre seu corpo.

Seu rosto, antes calmo e altivo, se contorceu. Os dentes cerrados. A respiração pesada. Suor escorria pela testa, colando alguns fios prateados ao rosto.

— Eu... droga... — sussurrou, quase inaudível. — Ainda não consigo controlar isso direito...

Seu corpo inteiro tremia. Os músculos estavam rígidos como pedra e queimavam por dentro. Os ferimentos internos que ela forçou a ignorar durante o combate agora exigiam resposta.

Ela tentou se erguer, mas seus braços cederam e ela voltou a cair, com o rosto quase tocando o chão.