Jun-ho acordou no meio da noite, suando. Sua respiração estava descontrolada, sua mente estava confusa com a realidade. Perturbado, levou um tempo, mas conseguiu se acalmar. Ele sabia que precisava se concentrar.
A angústia de não ter Salin também se misturava a suas dores. Era uma má hora para o passado voltar à tona, mas pensar que Erina também pode passar por isso. O impulsionava a agir mais rápido. E a falta que sentia de Salin, de vê-lo, poderia ser resolvida se voltasse para casa o quanto antes.
Sem conseguir descansar, pegou o carro e dirigiu até onde sabia que deveria ir. Ao chegar à casa onde Natali estava escondida, ela o atendeu com os olhos arregalados ao perceber que Jun-ho ainda estava vivo.
— Você... ainda está vivo? — ela perguntou, com os olhos dela carregados de uma mistura de culpa e medo.
— Estão voce realmente está envolvida? Por que está fazendo isso? Eu não esperava te ver de novo, muito menos assim.
Ela olhou para baixo, como se as palavras pesassem demais.
— Não é o que parece, Jun-ho...
— Ah, não é? — Ele deu um passo à frente, ignorando a dor no ombro. — Então me explique. Por que está envolvida com Colen? Por que você está ajudando alguém que sequestra crianças?
Ela parecia prestes a falar, mas hesitou. Ele notou a mesma culpa que a consumira da última vez que a vira.
— Eu não tinha escolha — ela finalmente disse, com a voz embargada. — Minha família... você sabe que eu faço o que preciso para protegê-los.
— Até mesmo me matar? — Ele sentiu a raiva voltar, mas a dor do tiro em seu ombro o lembrava que ele já tinha sofrido o suficiente por causa dela.
— Eu nunca quis te machucar — ela sussurrou.
— Foi o que você mais fez.
— Eu sinto muito, sei que deve ter sido difícil pra você depois que eu fui embora. Mas eu não sabia o que fazer. Não dava pra continuar daquele jeito, você me magoava também.
Ela ficou em silêncio, sem conseguir sustentar o olhar de Jun-ho. Ele balançou a cabeça, incrédulo.
— Você poderia ter ido embora tranquilamente, mas o que fez depois foi estúpido.
Jun-ho viveu um inferno depois que ela partiu, foi física e psicologicamente castigado. Mas ele sabia que ela também sofreu.
Ele não sentia mais nada por ela. Mas se via acorrentado pelas consequências. E ele não poderia errar novamente.
— Fiz o que foi necessário... — ela começou.
— Não tenho tempo para você. Tenho coisas mais importantes para resolver. — Ele não estava ali para reabrir antigas feridas. Ele estava ali para resolver a situação com Colen.
A família de Natali, era inimiga do conselho, embora parceira da Golden, nem todos os membros se davam bem. Mas não imaginava que Natali estaria com Colen e nem que isso era uma espécie de proteção. Há um acordo entre eles? Pensou Jun-ho por um momento, mas logo focou.
— Me dê o nome do local onde está a filha de Benjamin.
— Eu não posso.
— Fala agora!
Natali encarou os olhos frios de Jun-ho, a forma como ele sequer havia entrado naquele apartamento. Ele não sentia nada por ela. Mas o que ela deveria esperar depois de tudo o que aconteceu? Só havia um motivo para ele estar alí.
Colen estava certo.
— Se você for rápido. Pode ainda encontrar Colen. Ele vai sair em meia hora.
— Quero saber onde está Erina?
Os olhos de Natali tremeram. Ele sequer hesitou.
— Ela está viva.
(...)
Jun-ho dirigiu até o cativeiro determinado a salvar a filha e o motorista de Benjamin. Não havia margem para falhas.
Natali havia lhe dito o local, uma antiga fábrica abandonada, cercada por árvores e com apenas uma estrada estreita de acesso.
Ao longe, as luzes fracas do galpão podiam ser vistas, e Jun-ho sabia que, quanto mais perto chegasse, mais arriscado seria. Ele desligou os faróis e dirigiu o restante do caminho às escuras.
Ao estacionar o carro a uma distância segura, Jun-ho saiu sem fazer barulho, chegando à lateral do prédio. Com sua faca, cortou silenciosamente a grade de metal enferrujada que bloqueava uma das janelas de ventilação. Era uma entrada estreita, mas suficiente para ele passar.
Ele se moveu em silêncio absoluto, ouvindo com atenção os ruídos à sua volta. Os passos de dois guardas ecoavam pelo corredor ao longe. "Não muitos homens," pensou. "Isso facilita as coisas."
Jun-ho seguiu pelo caminho estreito até uma porta entreaberta de metal, onde avistou a filha de Benjamin e o motorista, amarrados e sentados no chão, com as mãos atadas atrás das costas. O medo estampado no rosto da menina fez ele lembrar do terror que viveu. Isso só aumentava sua determinação em salvá-los. Precisava fazer isso o quanto antes.
Ele sinalizou para os dois ficarem quietos, levantando um dedo aos lábios. A garota era uma ótima atriz, mas o pânico em seus olhos suavizaram um pouco ao ver Jun-ho. Ele rapidamente desativou o cadeado na porta e, com um único movimento ágil, eliminou o guarda que estava de costas. O golpe foi limpo, e o corpo caiu silenciosamente no chão.
Jun-ho correu até os reféns, cortando as cordas que os mantinham presos.
— Vocês conseguem andar? — ele sussurrou, enquanto os libertava.
— Sim, eu acho que sim... — murmurou a filha de Benjamin, a voz trêmula.
O motorista, mais velho e claramente abalado, fez um aceno rápido.
— Vamos sair daqui rápido e sem fazer barulho — Jun-ho continuou, os olhos fixos nas portas ao redor, atento a qualquer movimento.
Eles começaram a se mover, mas então, um ruído de passos pesados ecoou pelo corredor. Um dos capangas de Colen, armado, vinha na direção deles. Jun-ho, com reflexos rápidos, puxou a garota e o motorista para uma pequena sala ao lado, os empurrando contra a parede. Ele se posicionou na entrada, esperando o momento certo.
O guarda passou direto pelo corredor, sem notar o esconderijo, e Jun-ho aproveitou. Com um movimento veloz, ele o agarrou por trás, imobilizando-o antes que pudesse reagir. Com precisão mortal, o eliminou e escondeu o corpo.
— Agora — sussurrou ele para os reféns.
Eles seguiram novamente, cruzando os corredores estreitos até chegarem à saída, porém havia uma pequena clareira à frente do galpão que estava iluminada, e mais guardas estavam de patrulha.
— Fiquem aqui — ordenou Jun-ho, deixando os dois escondidos atrás de um arbusto.
Ele avançou sozinho, rápido e silencioso, eliminando os guardas um por um. Logo, o caminho estava livre.
Quando Jun-ho e os reféns finalmente emergiram do galpão, a escuridão da noite parecia mais suave ao se aproximarem da entrada. A filha de Benjamin e o motorista estavam ofegantes, mas seguros. O momento que se seguiu foi silencioso, apenas o som das respirações pesadas preenchendo o ar. Jun-ho os colocou em seu carro, com as mãos sujas mas com a mente limpa.
Quando Benjamin apareceu na porta, os olhos dele brilharam com incredulidade, antes de um sorriso largo se formar no rosto dele. Lágrimas desceram de seus olhos enquanto ele abraçava sua filha e logo sua mãe correu para fazer o mesmo.
— Jun-ho... — ele disse, a voz embargada pela emoção. — Como você fez isso?
Jun-ho simplesmente balançou a cabeça, sentindo a frustração de não ter conseguido capturar Colen.
— Fiz o que era necessário.
O olhar perplexo de Benjamin se desfez em um sorriso. Era loucura o que o herdeiro de Golden era capaz de fazer.
Mas ao ver a expressão de Jun-ho, Benjamin pode entender. Ele sabia que Jun-ho havia feito muito mais do que o esperado. E sabia que isso tinha custado algo.
— Colen... — Benjamin murmurou, como se pesasse a situação. — Ele ainda está por aí, não está? Eu sabia que não seria fácil. Mas, mais cedo ou mais tarde, ele vai pagar.
Jun-ho sentiu a tensão aumentar em seu peito. Ele havia falhado em capturar Colen, mas sabia que essa batalha não tinha fim ainda. A guerra com Colen estava longe de ser resolvida, e o olhar de Benjamin confirmava isso.
A menina correu na direção de Jun-ho cortando o clima pesado e o abraçou o mais velho agradecendo silenciosamente. Como se aquilo fosse tudo que importasse. Jun-ho sentiu uma sensação de alívio.
— Olhos claros, cabelo branco. — Ela disse após se afastar. — Ele tem uma cicatriz feia na bocheca.
— Quem?
— O cara mal.
Jun-ho piscou os olhos, digerindo a informação. De repente uma faísca de esperança surgiu em seu rosto. Alguém com essas características deveria ser mais fácil de encontrar, mas porquê ainda não encontramos?
— Lembra de mais alguma coisa?
— Ele está sempre coberto, tem medo da luz.
Coberto? Será que ele é sensível a luz ou apenas precavido.
— Ele é quieto.
O motorista apenas confirmava.
— Obrigado pequena Erina. São informações valiosas. — disse Jun-ho, com um sorriso. — É bom saber disso. Ele não vai ficar impune por muito tempo. Mas não se preocupe, ele nunca mais vai vim atrás de você. Eu vou pegar ele
— Você consegue! — Ela disse.
Benjamin sorriu, sua filha parecia bem apesar do que houve. Ele então apertou a mão de Jun-ho com força, o olhar grave, mas grato.
— Eu sou eternamente grato, Jun-ho. Agradeço por ter salvado minha filha e meu motorista. Não vou esquecer disso. Mas, como disse, Colen... Ele não vai escapar. Você vai conseguir pegar ele.
Jun-ho assentiu, sentindo o peso das palavras, ele sabia que o verdadeiro confronto ainda estava por vir. Ele olhou para a família de Benjamin, o alívio nos rostos deles era palpável, mas seu pensamento estava longe, focado no que ainda tinha que enfrentar.
Com a missão parcialmente cumprida, Jun-ho embarcou de volta para casa. Seus pensamentos, no entanto, estavam longe de descansar. Não porquê pensava na sua missão ou em como encontrar Colen. Mas sim porque ele não conseguia parar de pensar em Salin. Estava com saudades. Ele só queria voltar para casa e reencontrar a pessoa que lhe trazia conforto. Era tudo o que ele precisava naquele momento.