Capítulo 26: Brisa e Tentação
O calor já anunciava o início da estação seca, e os ventos mornos que cortavam as ruas de Nova City traziam consigo um toque de salitre. Gabriel, agora no nível 6 e cada vez mais confiante com sua força, acordou naquele dia sem qualquer vontade de enfrentar monstros ou bandidos. Seu corpo queria descanso, e sua mente… distração.
— Uma praia cairia bem.
Esse pensamento surgiu leve, quase como uma brisa. Mas foi o suficiente para colocá-lo em movimento.
Ele já havia ouvido falar de uma praia não muito distante dali, conhecida por suas águas cristalinas e — segundo boatos — pela grande movimentação de turistas, incluindo caçadores, aventureiras, mercadoras e pessoas comuns. Gabriel não era exatamente do tipo "social", mas a ideia de ver algo diferente, longe do cheiro de sangue e monstros, era tentadora.
No entanto, ele não poderia ir vestido como um caçador. Sua capa reforçada e botas resistentes o faziam parecer um mercenário a qualquer distância. Então, pela primeira vez em muito tempo, ele decidiu fazer algo raro: ir às compras.
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O centro comercial de Nova City era um contraste gritante com as zonas de monstros e os becos onde se escondiam bandidos. Ali, a música tocava suave nas ruas, pequenos autômatos mágicos flutuavam acima das lojas com placas luminosas e chamativas. Vendedores sorriam, clientes negociavam animadamente, e o ar cheirava a perfume, couro novo e frutas exóticas.
Gabriel caminhava por entre as vitrines como um predador em território estranho. Mas havia algo em sua postura que chamava atenção: a maneira como andava, seguro, atento, com os olhos sempre calculando o ambiente.
Entrou em uma loja de roupas com fachada branca e detalhes dourados. O ambiente era fresco, graças aos cristais de ar frio espalhados pelo teto. Uma atendente se aproximou quase que instantaneamente.
— Boa tarde, senhor. Posso ajudá-lo? — perguntou, sorridente, seus olhos avaliando a capa de couro e a espada embainhada nas costas de Gabriel.
— Quero roupas leves. Algo… pra praia — respondeu ele, sem rodeios.
A atendente arregalou os olhos por um instante, mas logo assentiu com profissionalismo.
— Claro! Temos algumas peças que chegaram recentemente de Mirasha, cidade litorânea. Tecidos leves, cortes modernos, ideais para descanso ou encontros casuais.
Ela trouxe algumas opções: camisas de linho branco com botões de pedra polida, bermudas de algodão escuro com costuras reforçadas, e até mesmo um par de sandálias encantadas que evitavam que a areia grudasse nos pés. Gabriel escolheu uma camisa azul-marinho com abotoamento lateral, bermuda bege com bolsos discretos e um par de sandálias simples, porém elegantes.
— Vou levar. — disse ele, jogando algumas moedas sobre o balcão.
Saiu dali pouco depois, já vestido com as roupas novas. Sentia-se… diferente. Mais leve. Quase um estranho dentro de si mesmo, mas não de forma ruim. Talvez fosse isso que queria: lembrar-se de que era mais que um caçador.
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Mais tarde, com sua bolsa mágica discreta presa à cintura e a aura de magia quase totalmente retraída, Gabriel deixou a cidade pelas estradas do sul. Seu destino: a praia de Khalemar, um local distante, mas acessível para alguém com seu poder e resistência. Lá, talvez não encontrasse monstros — mas encontraria outros tipos de tentações. E ele, naquele momento, não via problema algum nisso.
Ele não queria lutar. Queria ver o mar. Queria ver mulheres bonitas. E queria simplesmente... viver.
Ao chegar na praia de Khalemar, Gabriel parou por alguns minutos apenas para observar. O som do mar era como uma música desconhecida, mas estranhamente familiar. As ondas quebravam na areia dourada com suavidade, e o vento salgado bagunçava seus cabelos, como se estivesse lhe dando boas-vindas.
Havia muita gente ali. Alguns tomavam banho de mar, outros apenas caminhavam na orla. Mulheres de diferentes estilos usavam roupas leves, algumas em biquínis encantados que se ajustavam ao corpo, enquanto homens riam e jogavam bolas mágicas flutuantes, criadas por cristais de vento. Era outro mundo. Um mundo sem violência, sem caçadas, sem monstros.
Gabriel caminhou pela areia com tranquilidade. Vestindo sua camisa azul-marinho, aberta até o peito, e bermuda leve, parecia apenas mais um jovem aventureiro em férias. Mas seus olhos estavam atentos. E mesmo com o clima relaxado, ele ainda carregava, discretamente, uma adaga presa ao lado interno do cinto.
Ele sentou-se em uma das espreguiçadeiras de madeira à beira-mar. Havia bares com música, garçons oferecendo bebidas tropicais, sucos de frutas raras, e até mesmo coquetéis levemente encantados para refrescar a mente e o corpo.
Um atendente se aproximou.
— Vai querer alguma coisa, senhor?
— Um suco de gelo flamejante — respondeu Gabriel, curioso com o nome. Era uma mistura popular entre caçadores: refrescante e com um toque picante no final.
Enquanto bebia, Gabriel observava as pessoas ao redor. Havia algumas mulheres que olhavam discretamente para ele — seu porte, o jeito que ficava sempre calmo, parecia atrair atenção. Mas ele não se levantou para ir até nenhuma delas. Estava apenas aproveitando o momento.
Até que uma garota se aproximou.
Cabelos longos e prateados, amarrados em um coque solto. Pele bronzeada e olhos âmbar. Usava um biquíni branco com detalhes dourados, e trazia uma tatuagem mágica em forma de flor sobre o ombro esquerdo — uma marca de que dominava algum tipo de magia.
— Você é caçador, não é? — ela perguntou, sem rodeios.
Gabriel olhou de lado, um leve sorriso no canto dos lábios.
— É tão óbvio assim?
— Para quem também é, sim. Eu me chamo Lysa — disse, sentando-se ao lado dele sem pedir permissão.
Eles conversaram por algum tempo. Gabriel descobriu que Lysa era uma caçadora nômade, que viajava de cidade em cidade, sem se prender a nada. Gostava do mar, de praias e de liberdade. Ela também estava no nível 6 — embora, segundo ela mesma, tivesse demorado dois anos para alcançar.
— E você? Quanto tempo levou? — perguntou, desconfiada.
— Menos de um ano — respondeu Gabriel, sem entrar em detalhes.
Os olhos de Lysa se arregalaram por um instante, mas ela não insistiu. Em vez disso, o chamou para caminhar pela praia.
Eles andaram lado a lado, descalços, sentindo a areia fria sob os pés enquanto o sol começava a se pôr no horizonte. O céu ficou pintado de laranja e dourado, e Gabriel, por um instante, esqueceu completamente da cidade, dos monstros, dos bandidos.
Naquela noite, ele não pensava em caçar. Nem em recompensas. Só caminhava. Só ouvia. Só sentia.
E mesmo que aquele momento durasse pouco, seria suficiente para lembrá-lo de que havia vida além da força.
Gabriel apenas queria aproveitar… antes da próxima luta.