Capítulo 6: O Diário da Mãe
Narrado por Isabel
Foi por acaso. Ou talvez não. Às vezes, penso que certas descobertas nos escolhem. Estava arrumando o quarto da mãe depois de uma dessas conversas pesadas que deixaram a casa em suspensão. Entre caixas de fotos e cadernos antigos, encontrei um caderno de capa azul-marinho, gasto nas pontas. Reconheci a letra de Teresa logo na primeira linha.
Meu coração acelerou. Havia algo de sagrado em abrir aquele diário — como invadir um templo onde, por tanto tempo, só existiam suposições.
Sentei-me na beira da cama e comecei a ler.
"Hoje senti uma pontada no peito quando olhei para Isabel dormindo. Ela não sabe. Ninguém sabe. Mas ela veio quando eu já tinha desistido de acreditar que algo bonito ainda podia acontecer comigo."
As palavras me atingiram como um sussurro e um trovão ao mesmo tempo. Era como ouvir a voz da minha mãe, despida de todas as máscaras que usava no dia a dia. Continuei lendo.
"Às vezes, tenho medo de amá-la demais. Como se o mundo pudesse tirar ela de mim, como tirou o outro. Não quero que os outros pensem que é favoritismo. Mas é que amar Isabel... é como respirar depois de quase se afogar."
Fechei os olhos. Nunca imaginei que o amor que ela sentia por mim tivesse esse tom desesperado de sobrevivência. Não era sobre mim. Era sobre ela. Sobre a dor que ninguém viu, a perda que ninguém nomeava.
O diário estava cheio de pequenas entradas. Algumas falavam de mim, outras dos meus irmãos. Em todas, havia uma tentativa quase desesperada de manter todos nós inteiros, mesmo quando ela mesma estava em pedaços.
Quando terminei de ler, algo mudou dentro de mim. Pela primeira vez, entendi que o laço entre mim e Teresa não era uma escolha dela — era uma necessidade. Eu fui a tábua de salvação dela, e ela, sem querer, me amarrou a esse papel. Mas agora, eu podia finalmente soltar esse peso.
Desci as escadas com o caderno no colo. Meus irmãos estavam na sala. Estavam prontos para ouvir. E eu, pela primeira vez, estava pronta para contar. Não a minha versão — mas a verdade que vinha da própria mão da nossa mãe.