Capítulo 19 Antes que o silêncio chegue

O caderno da mamã ficou ao lado da minha cama durante dias. Sempre que a saudade apertava, eu abria numa página qualquer. Algumas frases eram desconexas. Outras pareciam poemas. Mas todas carregavam uma coisa só: amor. Desajeitado, tremido, puro.

— Achas que ela sabe? — perguntei a Jonas uma noite, deitada sobre o peito dele.

— Sabe o quê?

— Que estamos perdendo ela aos poucos. E que, ainda assim, a gente tenta sorrir como se tudo fosse igual.

Ele fez carinho no meu cabelo, sem pressa.

— Ela sente. Mas mais do que isso, ela confia. E é por isso que sorri.

Os sinais tornaram-se mais evidentes.

Teresa começou a se perder dentro da própria casa. Esquecia o nome da televisão. Chamava Clara de Isabel. Às vezes, acordava no meio da noite perguntando pelo pai, que já partira há tantos anos.

Clara chorava escondido. Miguel se ocupava com listas e horários. E eu... eu apenas sentava ao lado dela e segurava sua mão.

— Está tudo bem, mamã. Estou aqui.

Mesmo quando ela não sabia quem eu era.

Numa tarde de sol fraco, sentei-me com Miguel na varanda.

— Temos que pensar no que vem depois — disse ele, olhando para o quintal.

— Depois do quê?

— Depois dela.

As palavras doeram. Mas eram verdade.

— Eu sei — respondi. — Mas não estou pronta.

— Ninguém está. Mas tu és a única que consegue cuidar dela com o coração. Nós... nós seguimos fórmulas.

Olhei para ele com ternura. — Mas também precisamos de fórmulas. De força. De equilíbrio. E tu tens isso.

Ele assentiu, com os olhos marejados.

Jonas apareceu com uma surpresa no fim de semana.

— Estive a pensar — disse ele, nervoso. — Não quero apenas assistir a tua vida de fora. Quero construir contigo.

Olhei para ele sem entender de imediato.

Ele me entregou uma pequena caixa.

Dentro, um chaveiro com a inscrição:

“Nosso lar começa aqui.”

— Não é um pedido de casamento — apressou-se. — Ainda não. É um convite. Para começarmos algo juntos. Do jeito que der. No tempo que precisares.

Senti o coração acelerar.

— Achas que é o momento?

— Acho que estamos vivos. E isso já é motivo bastante.

Contei para Teresa dois dias depois.

Ela me olhou com olhos perdidos, mas o sorriso... o sorriso era dela.

— Casa... nova? — perguntou.

— Talvez — respondi. — Com amor dentro.

Ela apertou minha mão com força. E disse, bem devagar:

— Não deixes o amor... esperar.

Chorei em silêncio naquela noite.

Não por tristeza.

Mas por gratidão.

Na segunda-feira, organizamos um jantar em família. Pequeno, íntimo. Clara trouxe vinho. Miguel fez massa. Teresa ficou sentada ao lado da janela, olhando o céu.

No fim da noite, quando já recolhíamos os pratos, ela chamou por mim.

— Isabel?

— Estou aqui, mamã.

Ela me olhou nos olhos, como quem, por um instante, voltou completamente.

— És a filha que eu teria escolhido.

Não consegui responder.

Só a abracei.

Como quem sabe que, às vezes, uma frase basta para iluminar a vida inteira.

Nos dias seguintes, escrevi mais do que nunca.

Sobre perda. Sobre permanência. Sobre promessas feitas entre silêncios.

E uma frase se repetia, cada vez que eu fechava os olhos:

“Mesmo quando ela esquecer tudo, eu ainda me lembrarei por nós

Perfeito. O Capítulo 19 será um marco emocional. Agora que Isabel começou a aceitar que sua vida pode — e deve — continuar para além do cuidado, é hora de enfrentar o inevitável: a fragilidade cada vez maior de Teresa. Este capítulo trará um equilíbrio entre a ternura da despedida e a coragem de seguir adiante. Também plantará a semente de um novo futuro entre Isabel e Jonas.

Capítulo 19: Antes que o Silêncio Chegue

O caderno da mamã ficou ao lado da minha cama durante dias. Sempre que a saudade apertava, eu abria numa página qualquer. Algumas frases eram desconexas. Outras pareciam poemas. Mas todas carregavam uma coisa só: amor. Desajeitado, tremido, puro.

— Achas que ela sabe? — perguntei a Jonas uma noite, deitada sobre o peito dele.

— Sabe o quê?

— Que estamos perdendo ela aos poucos. E que, ainda assim, a gente tenta sorrir como se tudo fosse igual.

Ele fez carinho no meu cabelo, sem pressa.

— Ela sente. Mas mais do que isso, ela confia. E é por isso que sorri.

Os sinais tornaram-se mais evidentes.

Teresa começou a se perder dentro da própria casa. Esquecia o nome da televisão. Chamava Clara de Isabel. Às vezes, acordava no meio da noite perguntando pelo pai, que já partira há tantos anos.

Clara chorava escondido. Miguel se ocupava com listas e horários. E eu... eu apenas sentava ao lado dela e segurava sua mão.

— Está tudo bem, mamã. Estou aqui.

Mesmo quando ela não sabia quem eu era.

Numa tarde de sol fraco, sentei-me com Miguel na varanda.

— Temos que pensar no que vem depois — disse ele, olhando para o quintal.

— Depois do quê?

— Depois dela.

As palavras doeram. Mas eram verdade.

— Eu sei — respondi. — Mas não estou pronta.

— Ninguém está. Mas tu és a única que consegue cuidar dela com o coração. Nós... nós seguimos fórmulas.

Olhei para ele com ternura. — Mas também precisamos de fórmulas. De força. De equilíbrio. E tu tens isso.

Ele assentiu, com os olhos marejados.

Jonas apareceu com uma surpresa no fim de semana.

— Estive a pensar — disse ele, nervoso. — Não quero apenas assistir a tua vida de fora. Quero construir contigo.

Olhei para ele sem entender de imediato.

Ele me entregou uma pequena caixa.

Dentro, um chaveiro com a inscrição:

“Nosso lar começa aqui.”

— Não é um pedido de casamento — apressou-se. — Ainda não. É um convite. Para começarmos algo juntos. Do jeito que der. No tempo que precisares.

Senti o coração acelerar.

— Achas que é o momento?

— Acho que estamos vivos. E isso já é motivo bastante.

Contei para Teresa dois dias depois.

Ela me olhou com olhos perdidos, mas o sorriso... o sorriso era dela.

— Casa... nova? — perguntou.

— Talvez — respondi. — Com amor dentro.

Ela apertou minha mão com força. E disse, bem devagar:

— Não deixes o amor... esperar.

Chorei em silêncio naquela noite.

Não por tristeza.

Mas por gratidão.

Na segunda-feira, organizamos um jantar em família. Pequeno, íntimo. Clara trouxe vinho. Miguel fez massa. Teresa ficou sentada ao lado da janela, olhando o céu.

No fim da noite, quando já recolhíamos os pratos, ela chamou por mim.

— Isabel?

— Estou aqui, mamã.

Ela me olhou nos olhos, como quem, por um instante, voltou completamente.

— És a filha que eu teria escolhido.

Não consegui responder.

Só a abracei.

Como quem sabe que, às vezes, uma frase basta para iluminar a vida inteira.

Nos dias seguintes, escrevi mais do que nunca.

Sobre perda. Sobre permanência. Sobre promessas feitas entre silêncios.

E uma frase se repetia, cada vez que eu fechava os olhos:

“Mesmo quando ela esquecer tudo, eu ainda me lembrarei por nós duas.”