Nunca pensei que o nome Eulália, apagado dos registros da história da nossa família, pudesse brilhar com tanta força.
Em menos de duas semanas, a Iniciativa Eulália ganhava menções em blogs feministas, universidades, círculos literários.
Não como um braço da Fundação Teresa.
Mas como algo novo.
Independente.
Bruto.
Verdadeiro.
Clara estava no centro.
Segura.
Serena.
Como se finalmente ocupasse um lugar que sempre existiu — mesmo quando ninguém o nomeava.
Júlia, por outro lado, andava inquieta.
Encontrava-a constantemente em silêncio, rabiscando em cadernos, mas sem terminar frase alguma.
— Está tudo bem? — perguntei.
— Clara tem nome.
Tu tens legado.
Vivian tem coragem.
Lara tem palavras.
Lou tem história.
E eu?
— Tens tudo isso. E mais.
Ela sorriu, mas com tristeza.
— Às vezes sinto que fui criada para ser a ponte…
Mas ninguém mora na ponte.
Essa frase me perfurou.
Porque era verdade.
Naquela tarde, recebi uma mensagem inesperada de Vera:
“Isabel, apareceu uma mulher em Zurique.
Nome: Beatriz Lobo.
Disse que é filha biológica de Teresa.
E quer falar contigo.
Urgente.”
Meu mundo congelou.
Beatriz tinha por volta de cinquenta anos.
Olhos verdes como os de Teresa.
Rosto severo.
Voz controlada.
— Não vim pedir herança.
Nem perdão.
— Então…?
— Vim porque minha mãe morreu…
e deixou uma carta.
Nela dizia que teria tido uma filha com Teresa Guarda, durante o período da guerrilha no norte de Portugal.
A criança foi entregue a um convento.
Essa criança… era eu.
Sentei sem dizer palavra.
Ela continuou:
— Vivi sem saber quem era.
Mas sempre fui diferente.
E agora que sei…
quero apenas a verdade.
— Tens provas?
Ela me entregou uma carta.
Assinada por Teresa.
Com datas, locais… e um nome.
*“Para Beatriz,
Nunca fui tua mãe nos documentos.
Mas fui teu sangue.
E isso… ninguém pode apagar.”*
Chorei.
Porque mais uma vez…
o passado de Teresa batia à porta.
E eu não sabia se abria.
Convoquei Clara e Júlia.
Mostrei tudo.
Clara ficou em silêncio.
Júlia, em choque.
— Então… há outra?
— Parece que sim.
— E o que ela quer?
— Ser reconhecida.
Clara então disse:
— Talvez seja a chance de reescrevermos não só a história de Teresa…
mas de todas nós.
Júlia não respondeu.
Mas seus olhos diziam:
“Quantas mais cabem nessa árvore?”
Naquela noite, escrevi:
“Talvez Teresa nunca tenha conseguido amar todas as filhas que teve.
Mas nós…
Ainda podemos aprender.”