Temporada 2 – Episódio 8: O Silêncio Que Invadiu a Tela
Narrado por Isabel
Luanda acordou inquieta naquela semana.
Cartazes do documentário de Vivian estavam por toda parte.
Jornais locais anunciavam:
“Uma filha de Teresa Guarda revela o lado não contado da guerra.”
Vivian tentava manter-se calma, mas sua inquietação era visível.
— E se ninguém aparecer?
— E se todos aparecerem?
— E se me chamarem de oportunista?
— E se te escutarem? — respondi.
Ela sorriu, tensa.
— Aí… talvez eu finalmente respire em paz.
Enquanto isso, Beatriz ligou de Benguela.
— Mãe, Luan é gentil.
Calmo.
Mas… estranho.
— Como assim?
— Ele foge de perguntas.
Desvia o olhar.
Finge esquecer datas.
E parece ter medo de que a gente descubra algo.
— Achas que ele mente?
— Acho que ele esconde.
E pior: acho que nem ele sabe se quer ser encontrado.
Beatriz relatou que Luan evitava contar sobre o tempo que passou no convento após Teresa.
Disse apenas que "as coisas ficaram difíceis" e que depois disso "nunca mais confiou em ninguém completamente".
Clara suspeitava de trauma.
Beatriz suspeitava de segredos.
— Teresa o deixou com o padre para protegê-lo — ela disse.
— Mas e se... alguém mais o buscou depois?
— Estás a pensar que ele foi usado?
— Estou a pensar que a história não termina com Teresa.
Talvez... apenas tenha começado nela.
Chegou o dia da estreia.
Vivian vestia-se com sobriedade e elegância.
Cabelo preso, maquiagem leve, olhos atentos.
O cinema escolhido era histórico.
Resistiu à guerra, aos anos e aos silêncios.
As cadeiras foram ocupadas.
Havia jornalistas, ativistas, ex-militares, mães e até adolescentes curiosos.
Antes da sessão, Vivian subiu ao palco com o microfone na mão.
“Este documentário não é sobre Teresa Guarda.
É sobre as que nunca foram vistas ao lado dela.
É sobre mim.
E talvez… sobre ti também.”
Aplausos contidos.
Respeito suspenso no ar.
As luzes se apagaram.
O documentário começou.
Imagens de mulheres esquecidas, depoimentos de quem viu a guerra da calçada e não da trincheira.
Vivian aparecia, entrevistando.
Silenciando-se.
Escutando.
O público estava envolvido.
Até que…
a tela apagou.
Do nada.
A imagem sumiu.
O som parou.
As luzes não voltaram.
Um burburinho cresceu.
Um homem se levantou no fundo da sala.
Subiu ao palco sem ser convidado.
— Isto aqui não é documentário.
É ataque.
É reescrita de história feita por quem não viveu nada!
Vivian congelou na poltrona.
Eu me levantei.
— Quem és tu? — gritei.
Ele se apresentou:
— Estive ao lado de Teresa.
Não aceito que agora digam que ela foi menos do que símbolo.
Ela era dura porque o país precisava.
Essas meninas... essas filhas... são apenas sombras que não a compreenderam.
O público começou a se dividir.
Gritos.
Murmuros.
Vivian subiu ao palco.
— Cala-te.
O homem virou-se, surpreso.
— Cala-te — repetiu ela.
— Tu estiveste ao lado dela por três anos.
Eu estive ao lado das consequências por trinta.
Silêncio.
— Não vim aqui apagar Teresa.
Vim mostrar o que ela não pôde salvar.
Se isso te assusta…
é porque ainda não sabes o que é dor herdada.
O público aplaudiu.
O homem saiu.
Sem dizer mais nada.
As luzes voltaram.
O documentário continuou.
Mas ninguém mais respirava do mesmo jeito.
Na saída, Vivian estava em choque.
— Não acredito que ele fez aquilo.
— Eu devia ter travado. Mas não consegui.
— Filha… tu venceste.
Ela se virou.
— Como sabes?
— Porque ninguém ousou te interromper depois.
Clara ligou mais tarde.
— Luan confessou.
— O quê?
— Alguém o procurou quando ele tinha dez anos.
Disse que era amigo de Teresa.
Levou documentos.
E ofereceu levá-lo para estudar na Europa.
— E ele foi?
— Fugiu.
Escondeu-se no porto por dois meses.
Disse que algo no olhar do homem o assustou.
Desde então, viveu sob outro nome por anos.
Beatriz pegou o telefone.
— Mãe, esse homem…
parece ser o mesmo que interrompeu o documentário.
Meu estômago revirou.
— Achas que ele... está nos vigiando?
— Não sei.
Mas acho que Teresa… não nos contou tudo sobre os inimigos que fez.
Na madrugada, escrevi:
“Quando a verdade começa a doer,
é sinal de que o silêncio perdeu.
Mas há quem lute para calar de novo.
E nós…
temos que estar prontas para continuar falando.”