O Colar

[A Cabana Abandonada]

A tarde estava estranha, e uma névoa leve cobria a pequena vila. Galan havia saído com os filhos e Leo para buscar lenha.

Leo andava silenciosamente por um caminho estreito atrás da casa principal. Os galhos estalavam sob seus pés descalços. Foi quando notou uma pequena construção de madeira parcialmente coberta por heras — uma velha cabana que parecia esquecida no tempo, nos limites da propriedade de Galan.

Ele empurrou a porta com esforço. O interior estava empoeirado e cheirava a madeira úmida. Vasculhando o lugar, entre pedaços de pano velho e caixas vazias, algo chamou sua atenção: uma pequena caixa de madeira, simples, mas com uma trava de metal enferrujada.

Dentro, repousava um colar prateado com um símbolo azul incrustado — um cristal lapidado em forma de gota, com o brasão do Clã Safira gravado delicadamente no metal.

Leo segurou o colar entre os dedos, o cristal frio tocando sua pele. Um arrepio percorreu seu corpo, e por um instante, tudo ficou silencioso. O som dos pássaros cessou, como se a floresta prendesse o fôlego. Um zumbido baixo, quase como um lamento distante, preencheu seus ouvidos. Sua visão escureceu nas bordas, e o peso do colar parecia puxar não apenas sua mão, mas também algo dentro de si.

Ele conhecia aquele símbolo — Galan já havia mencionado em histórias antigas — era do Clã Safira. Mas por que aquilo estava ali? Na propriedade de Galan? E por que ele sentia algo… estranho?

Não era medo. Nem exatamente tristeza. Era um vazio apertado no peito, como se algo estivesse fora do lugar dentro dele. Como se aquilo… faltasse nele.

Antes que pudesse pensar mais, ouviu passos se aproximando. Rapidamente, ele fechou a caixa e enfiou o colar no bolso da túnica.

Era Sarah, com os cabelos presos em duas tranças bagunçadas, sorrindo ao vê-lo.

— Leo? Você tá aqui? — perguntou com o tom inocente de sempre, olhando em volta.

Sem dizer uma palavra, Leo guardou o colar no bolso de sua calça e desviou o olhar.

Sarah sorriu levemente, sem perceber nada.

— O papai disse que ia chover logo… você devia voltar pra casa. — Ela o observou por um instante, como se quisesse dizer mais alguma coisa, mas desistiu e saiu, correndo entre as árvores.

Leo foi logo atrás.

[As verdades sendo ocultadas]

O sol já começava a baixar no horizonte quando o grupo retornava da cabana abandonada. Sarah caminhava à frente com Aaron, falando sem parar. Leo vinha um pouco atrás, de cabeça baixa, com o colar escondido no bolso interno de sua túnica. Galan, silencioso, fechava o grupo, observando tudo em silêncio.

— Leo, lembra daquela vez que eu fui sozinha até a cabana? — disse Sarah, com o rosto animado. — Eu achei um anel! Ele tava todo sujo, mas parecia de princesa. A mamãe disse que era só uma bijuteria velha… mas eu gostei tanto.

Leo apenas assentiu com a cabeça.

— Você viu alguma coisa lá dentro? — ela perguntou, curiosa. — Tipo… algo estranho? Ou brilhante?

Leo hesitou. Por dentro, uma leve pontada de culpa o atingiu. Ele ainda sentia o peso do colar no peito, como se fosse um fardo.

— Não… não tinha nada — respondeu, evitando o olhar de todos.

Aaron parecia já entediado com o assunto e se afastou correndo adiante, brincando com um graveto.

Galan, que até então caminhava calado, parou por um instante. Seus olhos se fixaram nas costas de Leo com uma expressão contida, como se estivesse lutando com pensamentos.

Sarah, distraída, não notou. Mas Leo sentiu. Mesmo de costas, sentiu o olhar pesaroso do homem.

Ele olhou por cima do ombro e viu Galan parado, encarando-o. O homem tentou disfarçar, mas era tarde. Algo naquela troca silenciosa disse tudo. Ele sabia.

Mas, ao invés de perguntar, Galan apenas suspirou… e continuou andando, sem dizer uma única palavra.

Leo apertou o colar escondido contra o peito, com mais força.

[Conversa na Varanda]

Mais tarde, enquanto as crianças já estavam dentro de casa, Galan e sua esposa observavam os filhos de longe, sentados na varanda de madeira.

Judith era uma mulher de postura firme e olhar atento, com cabelos castanhos escuros presos em um coque simples, e traços marcados pelo tempo e pela preocupação. Havia uma gentileza constante em seu semblante, mas também uma força silenciosa — daquelas que sustentam famílias inteiras sem dizer uma palavra.

— Ele tem olhado diferente, não acha? — disse ela, referindo-se a Leo.

Galan assentiu, a voz baixa.

— Os olhos dele… não são mais de uma criança. Ele vê o mundo como quem já sabe o que é perder tudo. Tento dar a ele um pouco de paz… mas não sei se consigo.

Ela segurou a mão do marido, em silêncio, sentindo o peso do que ele não dizia.

— Ele achou o colar, não foi? — ela perguntou, em voz quase inaudível.

Galan demorou a responder. Seu olhar estava fixo na floresta ao longe, onde a cabana esquecida se escondia entre as árvores.

— Sim. Mas não falou nada. E eu… também não consegui.

Ela não insistiu. Havia coisas que, mesmo em família, ficavam suspensas no silêncio.

Galan manteve os olhos no horizonte, como se soubesse que algo se aproximava. Algo inevitável. Algo que ele não conseguiria impedir.