Makonnen Dula permaneceu imóvel por alguns instantes, como se saboreasse o silêncio pesado que havia envolvido a sala após sua última declaração. Seus olhos percorreram os rostos atentos dos alunos, analisando quem realmente absorvia suas palavras e quem apenas fingia compreendê-las. Então, sem alterar o tom de voz ou a expressão severa, ele retomou.
— Mesmo com toda essa imprevisibilidade — disse, sua voz grave preenchendo o espaço com um peso quase físico — nós conseguimos estabelecer, ao menos dentro dos portais, uma classificação funcional.
Ergueu uma mão no ar, como se sustentasse algo invisível.
— Ouçam bem: essa classificação não é perfeita. Mas ainda é a melhor ferramenta que temos.
Seus passos ecoaram pela plataforma enquanto ele caminhava lentamente, suas palavras se estendendo como uma sombra sobre os alunos.
— Tomemos o exemplo dos goblins — criaturas que, infelizmente, vocês conhecerão em breve.
Um ou dois alunos riram baixinho, talvez nervosos. Makonnen os ignorou completamente.
— Um goblin com pouca mana, sem habilidades especiais e sem inteligência estratégica é considerado um Comum. Seu poder é bruto, primitivo e facilmente derrotado por qualquer guerreiro minimamente treinado.
Ele pausou e ergueu dois dedos.
— Mas se um goblin demonstra astúcia — se arma emboscadas, trabalha em equipe com eficiência ou utiliza armas e armaduras de maneira inteligente — mesmo possuindo a mesma quantidade de mana que um Comum, ele é classificado como Elite.
Passou o olhar pela turma, certificando-se de que sua explicação estava sendo absorvida.
— Um Elite geralmente tem o dobro de mana em relação aos outros monstros do mesmo portal. Não subestimem isso.
Makonnen manteve a mão suspensa por mais um instante antes de prosseguir.
— E se a criatura possui uma quantidade anormal de mana, mesmo sem muita inteligência ou habilidade, nós a classificamos como Semi-Chefe.
Ele fechou o punho lentamente.
— Semi-Chefes são formidáveis. Eles se destacam pela força bruta, resistência e, às vezes, até por habilidades mágicas instintivas que tornam o combate contra eles mais perigoso do que deveriam ser por natureza.
Então, sua voz ganhou um tom ainda mais grave.
— Por fim, quando encontramos uma criatura com imensa quantidade de mana, e que possui inteligência, técnica e uma diversidade de habilidades, nós a reconhecemos como um Chefe.
A sala parecia prender a respiração, como se os alunos sentissem o peso daquela palavra.
— Um Chefe é, frequentemente, o terror de um portal. — A frase foi dita com uma solenidade sombria.
Makonnen cruzou os braços.
— Em muitos casos, o Chefe é o responsável pela própria existência daquele espaço. Derrotá-lo não é apenas vencer uma batalha — é silenciar toda uma dungeon.
Ele caminhou até a ponta da plataforma, e, pela primeira vez, sua voz perdeu a dureza implacável e tornou-se quase reflexiva.
— Ainda assim... — disse, como quem pondera uma verdade desconfortável — a classificação não é garantida.
Seu olhar afiado se dirigiu à turma, como se desafiasse qualquer um a discordar.
— Haverá vezes em que um monstro Comum agirá como um Elite.
Fez uma pausa.
— Outras vezes, um Elite se comportará como um Chefe.
Seu tom ficou ainda mais baixo, quase um aviso sussurrado.
— Ou um Semi-Chefe, desprovido de inteligência, se mostrará mais mortal do que qualquer Chefe que já enfrentamos.
Ele cruzou os braços, como se delimitasse uma linha invisível entre a ordem e o caos.
— Essa é a natureza da distorção.
Olhou cada aluno nos olhos antes de concluir.
— E é por isso que o verdadeiro perigo nunca é o que você vê — mas o que você não espera.
Makonnen girou sobre os calcanhares, seu manto escuro ondulando no movimento.
— Nos portais, essa classificação nos permite organizar expedições, treinar novatos e manter o controle sobre os riscos conhecidos.
Fez uma pausa, como se ponderasse por um breve momento sobre o que viria a seguir.
— Mas fora dos portais... não há garantias.
A sala ficou ainda mais silenciosa, como se as palavras tivessem drenado qualquer certeza que ainda pairasse no ar.
Seu olhar endureceu.
— Na natureza selvagem, monstros não obedecem a qualquer escala.
A afirmação parecia carregar o peso de incontáveis batalhas e massacres.
— Um goblin isolado pode se tornar uma ameaça regional.
Os olhos de Makonnen se tornaram ainda mais sombrios.
— Um simples bicho-papão pode devorar exércitos inteiros.
Ele inspirou fundo, como se sua próxima frase fosse algo que raramente se ouvia dentro da academia.
— É por isso que o Reino de Reisenmark não busca expandir suas fronteiras.
Os alunos se entreolharam. A frase parecia quase contradizer a postura imperial do reino, mas Makonnen não os deixou tempo para contestar.
— Isso não é covardia.
Levantou um dedo indicador.
— É sabedoria.
A luz das lâmpadas mágicas refletiu contra seu rosto enquanto ele explicava.
— Consolidar zonas de baixa densidade mágica, proteger os portais estabilizados, treinar soldados capazes de reagir... Este é o caminho da sobrevivência.
Baixou lentamente o dedo, como quem sela um destino.
— Vocês — ele disse, com um peso imenso em cada sílaba — são parte dessa estratégia.
Não havia promessa. Não havia ilusão de grandeza. Apenas a crua realidade do mundo em que estavam prestes a enfrentar.