A última limpeza da masmorra havia sido concluída. O portal, outrora pulsante e vivo no centro daquele mundo artificial, começou a se desintegrar lentamente, como se desfizesse sua própria existência. A energia que permeava o ambiente enfraquecia a cada segundo, e os alunos restantes da Divisão Eule—agora apenas setenta e oito—foram reunidos no descampado para a partida.
Carruagens já os aguardavam, enfileiradas no campo onde tudo começara. Para alguns, aquele momento era um alívio. Para outros, um peso.
Antes de embarcarem, os alunos precisaram devolver suas pulseiras de registro aos instrutores responsáveis pelo monitoramento da expedição. Era um procedimento padrão—cada pulseira continha os registros de batalha, as estatísticas de sobrevivência e os créditos conquistados.
Quando Klaus entregou a sua nas mãos de Annemarie von Drachenfels, algo inesperado aconteceu.
A mulher, que raramente perdia uma oportunidade de fazer comentários ácidos, não disse uma única palavra.
Ela ergueu uma sobrancelha ao examinar os números, seus olhos cinzentos fixos no visor brilhante da pulseira, e então olhou para Klaus com uma expressão estranha—um misto de surpresa e curiosidade contida.
O silêncio dela foi desconfortável.
Klaus, sem saber exatamente como reagir, apenas assentiu educadamente e subiu na carruagem, deixando a instrutora para trás. Mas algo na postura dela permaneceu em sua mente—como se tivesse visto algo improvável nos registros e ainda estivesse tentando processar aquilo.
Dentro da carruagem, o clima entre os sobreviventes era um misto de cansaço, alívio e luto silencioso.
Ninguém comemorava abertamente.
As conversas eram baixas, quase sussurradas. Alguns riam de forma nervosa, outros apenas encaravam o vazio pela janela. Era uma vitória, sim—mas uma vitória amarga.
Os alunos da Eule 1 mantinham-se afastados do resto, falando entre si com sorrisos discretos e olhares de superioridade.
Nenhum deles havia morrido na masmorra.
Para muitos ali, isso justificava a arrogância velada que transparecia em seus gestos controlados e postura impecável. Eles eram diferentes. Melhores. Sobreviventes perfeitos.
Enquanto isso, as demais turmas, especialmente a Eule 5, mal conseguiam disfarçar o abatimento. Foram eles que sofreram as maiores perdas. Os olhos cansados e a ausência de risos eram provas suficientes de que aquela experiência não havia sido uma simples missão—mas um teste brutal de resistência e sacrifício.
O retorno à Academia Falkenflug foi imediato, mas sem aulas.
A direção concedeu quatro dias de licença para descanso e reorganização.
Os alunos poderiam viajar para ver suas famílias, permanecer na Academia, ou simplesmente aproveitar o tempo livre como desejassem.
Klaus, como a maioria, permaneceu.
Não tinha dinheiro suficiente para pagar um teleporte até sua casa, e, além disso, queria recuperar suas forças antes de qualquer coisa.
Durante os dias de descanso, a Academia seguia em um ritmo mais calmo, mas os murais de classificação foram atualizados—como era esperado.
Klaus não se preocupou com sua colocação. Nunca havia se visto como um dos melhores. Mas quando encontrou seu nome entre os registros, um pequeno choque percorreu seu corpo.
Klaus Erich von Hammer — 708 mortes registradas.
Número total confirmado.
Era o segundo colocado entre todos os alunos da Eule.
O primeiro lugar era Lisette von Stragberg, com impressionantes 731 mortes—vinte e três a mais que ele.
Ainda assim, Klaus tinha quase cem mortes a mais do que o terceiro colocado, algo que ninguém na Academia esperava.
Seu feito não impressionava apenas os alunos da Eule, mas também outras divisões, incluindo os combatentes da Bär, um grupo reconhecido por seu potencial físico superior.
E foi lá, entre os alunos da Bär, que surgiu Erwin Krüger.
Erwin era o estereótipo do jovem orgulhoso.
Alto, forte, de cabelos loiros curtos e olhos azul-acinzentados, carregava um sorriso convencido estampado no rosto como uma insígnia de sua autoconfiança. Seu broche de família cintilava no peito, reluzindo como um símbolo de poder.
Ao ver Klaus observando a classificação, Erwin riu alto, um som que exigia atenção e servia de convite para suas provocações.
— Ora, ora… Então é esse aí o prodígio que fez bonito contra vermes? — zombou, sua voz carregada de desprezo teatral.
Ele cruzou os braços, inclinando ligeiramente o corpo para frente, como se estivesse avaliando Klaus com falsa curiosidade.
— Aposto que, se fosse contra monstros de verdade, não passava do primeiro golpe.
Seu pequeno grupo de seguidores riu junto, incentivando ainda mais a provocação. O som ecoou pelos corredores da Academia, a risada cheia de condescendência.
Klaus, fiel a si mesmo, apenas lançou um olhar frio para Erwin e se afastou sem responder.
Mas no fundo, ele sabia.
Essa rivalidade estava apenas começando.