Klaus nunca se considerou um grande filho, muito menos um irmão exemplar. Apesar do seu potencial de sete estrelas e dos feitos na Falkenflug Akademie começarem a ecoar entre os instrutores e colegas, ele carregava uma inquietação interna. Sempre se via como alguém que ainda precisava fazer muito mais para merecer o orgulho de sua família. As lembranças das noites em que Eleni trabalhava até tarde, do olhar distante de seu pai Erich, preso à casa por conta de sua locomoção limitada, e da alegre Greta, que parecia viver uma infância despreocupada, pesavam em seu coração.
Por isso, naquela tarde abafada em Edelheim, ele aceitou sem hesitar o convite da mãe para acompanhá-la ao Santuário da Luz, o templo central do bairro. Mesmo cansado da viagem, com o corpo ainda dolorido dos treinos exaustivos e dos combates brutais nas masmorras, Klaus sentia uma necessidade profunda de estar ali. Não era apenas por ele, mas pela família, pela sobrevivência e pelas oportunidades que, mesmo difíceis, continuavam surgindo.
Ele orava todas as noites antes de dormir e, ultimamente, sentia que Der Eine parecia ouvi-lo. Mesmo nos momentos mais solitários dentro da masmorra, nunca se sentira verdadeiramente sozinho.
O Santuário da Luz, com suas paredes de pedra branca polida e vitrais coloridos que projetavam mosaicos de luz no chão, parecia um oásis de serenidade em meio à pobreza dos subúrbios. As grandes portas de carvalho estavam abertas, deixando escapar o aroma doce de incenso misturado com cera derretida. Embora fosse possível iluminar o espaço com luzes mágicas, os templos geralmente preferiam velas—uma tradição que reforçava a humildade do culto.
Alguns moradores oravam em silêncio, sentados nos bancos de madeira envelhecida, enquanto outros ficavam em pé, admirando a tapeçaria da criação. A obra retratava a história de como Der Eine criou o mundo e de como o Altíssimo—como também era chamado—salvou seu povo.
Klaus, Eleni e Greta entraram juntos, os passos ecoando suavemente no piso frio de mármore gasto. Greta segurava a mão de Klaus com força, seus dedinhos quentes transmitindo uma confiança infantil que o fez sorrir. Eles se ajoelharam diante da tapeçaria principal. A religião proibia imagens de Der Eine, pois se dizia que qualquer representação feita pelas raças seria inferior ao esplendor divino.
Fechando os olhos, Klaus deixou o silêncio do templo envolvê-lo. Em sua oração, agradeceu pela vida, pela força que o sustentava, pela proteção que o guiara nas masmorras, onde tantos outros haviam perecido. Ele pensou nas pedras mágicas que entregara à mãe, no brilho nos olhos de Greta ao vê-las, e na esperança que, mesmo tímida, começava a crescer em Eleni.
Ao abrir os olhos, Klaus notou o Reverendo Mathis se aproximando.
O velho sacerdote do bairro o conhecia desde criança e caminhava com uma serenidade que parecia desafiar o tempo. Seus cabelos brancos ralos, sua postura firme e o bastão entalhado com runas antigas davam-lhe um ar imponente e sábio.
— Ora, ora, se não é o jovem Klaus Erich von Hammer — disse ele, o sorriso gentil iluminando seu rosto enrugado. — Parece que ontem você era só um menino correndo por essas ruas, tropeçando nas próprias pernas.
Klaus riu, um pouco envergonhado, e se levantou para cumprimentá-lo com uma reverência.
— O senhor ainda parece mais forte que eu, Reverendo.
Mathis soltou uma gargalhada rouca, sacudindo a cabeça.
— O corpo pode fraquejar, meu rapaz, mas a alma se renova com fé. É bom ver que ainda lembra de suas raízes. Muitos esquecem de onde vieram quando conhecem novos mundos.
Klaus abaixou o olhar, sentindo o peso daquelas palavras.
— Quase fiz isso, senhor. Mas não quero esquecer. Sei que não cheguei até aqui sozinho.
Mathis assentiu, os olhos brilhando com uma compreensão silenciosa. Então, apontou para uma sala lateral do templo, onde ficava o Espelho de Avaliação—um artefato mágico raro, mantido pela Ordem da Luz. Sua superfície prateada pulsava, cercada por uma moldura simples de bronze, como se contivesse uma energia viva.
Eleni e Greta o incentivaram a se aproximar, e Klaus, sentindo um estranho misto de curiosidade e reverência, tocou o espelho.
Um calor sutil percorreu sua pele, e quando abriu os olhos, letras douradas flutuaram à sua frente.
Potencial Inato: 7 Estrelas (Especializado em Armas).
Potencial Atual: 1.8 Estrelas.
Klaus respirou fundo, o coração acelerado.
Em apenas seis meses, estava a um passo de alcançar duas estrelas—um feito notável para alguém de sua idade. Ele sabia que o progresso era lento, muitas vezes levando anos para um único avanço, e que seu crescimento não vinha apenas do talento, mas da dedicação incansável, das noites sem dormir e das cicatrizes que carregava dos combates.
Greta, ao seu lado, puxou sua manga, os olhos arregalados de espanto e entusiasmo.
— Irmãozão, quase duas estrelas? Isso é incrível! Conta como foi na academia! Você lutou com monstros de verdade?
Klaus sorriu, prometendo contar tudo mais tarde.
Eleni observava em silêncio, um brilho de orgulho misturado com preocupação no rosto.
O Reverendo Mathis, ainda observando de longe, falou com voz calma.
— Estrelas são apenas um reflexo, Klaus. O que você constrói no coração é o que define sua grandeza.
Klaus assentiu, sentindo aquelas palavras ecoarem dentro de si.
Ele não precisava de glória ou reconhecimento.
Queria ser digno da fé de Greta, do sacrifício de Eleni e da graça que o mantinha vivo.
Diante da tapeçaria da criação, com Greta ao seu lado segurando sua mão, ele fez uma promessa silenciosa.
Vou me tornar alguém que honre tudo o que recebi.