Capítulo 18 – Parte 3

A caminhada até o portal da masmorra, sob o céu acinzentado que pairava sobre a Falkenflug Akademie, era tranquila, mas carregada de expectativa. O zumbido distante do portal verde-musgo crescia a cada passo, preenchendo o ar com um sutil peso de mana.

O grupo trocava palavras, conhecendo-se melhor antes da incursão que os separaria assim que atravessassem.

Emilia foi a primeira a quebrar o silêncio, mexendo no Fragmento de Ancoragem que pendia discretamente em uma corrente fina ao redor de seu pescoço. O brilho azul do cristal contrastava com sua túnica simples.

— Para ser sincera... — começou, a voz firme, mas com uma hesitação sutil. — Eu me sinto meio deslocada na minha turma.

Klaus virou o rosto para ela, os olhos atentos, enquanto ajustava o peso da marreta nas costas.

— Você é da turma Bär, né?

O vento frio bagunçava seus cabelos castanhos, e Emilia assentiu, oferecendo um sorriso amarelo que não alcançava os olhos.

— A turma Bär é... forte. Muito forte. Mas também é cheia de gente que resolve tudo com socos, machados ou gritaria.

Ela deu de ombros, o tom despreocupado, mas carregado de aceitação.

— E eu... sou suporte mágico.

Leonhard, caminhando ao lado, com seus óculos tortos, sorriu com empatia.

— Deve ser difícil mesmo.

Comentou, a voz suave.

Emilia continuou, os olhos fixos no caminho à frente.

— Não é que me tratem mal. Eles me toleram, sabem que sou útil. Mas não... não me encaixo. Sou mais uma ferramenta do que parte do grupo.

Ela revelou que sua melhor amiga, uma maga da turma Falke, já estava comprometida com outro grupo.

Sua esperança era encontrá-la dentro da masmorra, se a sorte permitisse.

Klaus notou o broche preso à túnica de Emilia, um pequeno adorno de prata com um símbolo delicado, quase imperceptível contra o tecido cinza.

— Você é de uma casa nobre?

Perguntou, a curiosidade genuína na voz.

Emilia o olhou de soslaio, a expressão neutra, como se avaliando o quanto revelar.

— Mais ou menos.

Respondeu, hesitante.

— Sou uma bastarda. Meu pai é de uma família importante, mas eu... não sou reconhecida oficialmente.

Klaus aguardou, paciente, sem pressioná-la.

Ela suspirou, os ombros relaxando ligeiramente.

— Usar o nome da família só atrai problemas. Os filhos legítimos do meu pai já me odeiam o suficiente, e a esposa dele... bem, ela finge que não existo.

Fez uma pausa, pesando as palavras, antes de adicionar:

— Mas, se quer saber, meu sobrenome é von Hohenberg.

O nome atingiu Klaus como um eco distante.

Von Hohenberg.

Ele se lembrava de folhear livros antigos na casa de sua família, em Edelheim, quando os von Hammer ainda tinham algum prestígio.

Os Hohenberg eram uma linhagem colateral da realeza de Reisenmark. Não príncipes ou reis, mas com sangue real correndo em suas veias.

Uma ramificação que adotara um novo nome para preservar a hierarquia monárquica.

Emilia, com sua túnica simples e jeito reservado, carregava esse legado.

Klaus não disse nada, respeitando o desejo implícito dela de manter isso em segredo.

Mas uma nova admiração cresceu em seu peito pela ruiva de olhos determinados, que caminhava ao seu lado.

Branik, sentindo que era sua vez de se abrir, decidiu puxar conversa, sua voz leve contrastando com o peso do escudo de carvalho preso às costas.

— Sou de uma fazenda pequena, bem longe daqui, nos campos de Niederfeld.

Contou, o sotaque rural suavizando suas palavras.

— A vida lá era dura, mas a gente se virava. Plantávamos cevada, criávamos algumas vacas... simples.

Ele ajustou o escudo, o couro rangendo, claramente à vontade com seu peso familiar.

— Quando fiz cinco anos, como toda criança, passei pelo teste de disposição. Todos esperavam que eu tivesse aptidão para agricultura ou, quem sabe, ferreiro, como meu pai. Mas veio outra coisa.

Ele sorriu, os olhos verdes brilhando com nostalgia.

— Disposição para defesa. Seis estrelas, voltada para escudos.

Klaus piscou, impressionado.

Disposições tão específicas, como escudos, eram raras, quase lendárias.

Leonhard, sempre ávido por dados, interveio, animado.

— Disposições incomuns representam menos de 10% dos casos. Você é especial, Branik.

Branik deu de ombros, humilde, esfregando a nuca.

— Especial ou não, ainda tenho que treinar até os braços doerem.

O grupo riu, a tensão aliviando por um momento, enquanto continuavam a caminhada.

O portal estava próximo, o ar vibrando com a densidade crescente de mana, um aroma metálico misturado com terra úmida impregnando-se no ambiente.

Klaus observava seus companheiros, cada um trazendo algo único ao grupo.

Leonhard, com seu otimismo incansável e mente afiada, sempre pronto a calcular riscos.

Lisette, silenciosa, mas inabalável, sua presença como uma âncora em meio à incerteza, a trança firme balançando com seus passos decididos.

Branik, sólido como uma muralha, seu sorriso simples escondendo uma determinação feroz.

Emilia, a maga de suporte com um passado nobre disfarçado por sua aparência comum, os olhos carregando uma história não contada.

Klaus ajustou a marreta nas costas, o couro da alça mordendo seu ombro, e pensou:

Este é um bom grupo.

Pela primeira vez em muito tempo, uma confiança genuína floresceu em seu peito, aquecendo-o contra o frio que precedia a masmorra.