Capítulo 21 – Parte 1

A exaustão da batalha ainda pesava nos ossos do grupo, forçando a decisão inevitável: era hora de descansar. Montar um acampamento parecia a escolha mais sensata, não só para recuperar as forças, mas para reorganizar estratégias e acalmar os nervos abalados. A clareira onde estavam, uma extensão de terra firme cercada por árvores de troncos escuros e folhas avermelhadas que brilhavam sob a luz difusa da masmorra, oferecia proteção natural. O som rítmico do mar quebrando contra as rochas distantes reforçava a sensação de que, por enquanto, aquele era um refúgio aceitável. O ar carregava um misto de maresia e o leve cheiro de terra úmida, criando uma calma tensa.

Lisette, no entanto, permanecia inquieta, os braços cruzados enquanto observava o grupo estender panos grossos no chão e improvisar tendas com galhos e cordas.

— É perda de tempo — disse, a voz firme, carregada de pragmatismo. — Se continuássemos, poderíamos eliminar mais criaturas e ganhar experiência.

Não havia hostilidade em seu tom, apenas a lógica fria que a definia, mas a resposta veio rápida e quase unânime.

— Se morrermos de cansaço, não ganharemos nada — retrucou Leonhard, ajeitando os óculos tortos com um sorriso exausto, o cabelo desalinhado grudado na testa suada.

— Concordo — acrescentou Branik, agachado enquanto empilhava galhos secos para a fogueira, as mãos calejadas movendo-se com precisão. — Estamos no limite, e isso é só o começo da masmorra.

Diante da lógica, Lisette suspirou, os ombros relaxando ligeiramente. Ela sabia que tinha um ponto, mas avançar sozinha, mesmo com sua habilidade, seria arriscado. Com um aceno relutante, juntou-se ao esforço, ajudando a fixar uma lona com estacas improvisadas.

O acampamento tomava forma, e Emília, sentada perto da fogueira que começava a crepitar, abraçou os joelhos, o bastão mágico apoiado ao seu lado. O brilho do Fragmento de Ancoragem em seu pescoço refletia as chamas, e ela quebrou o silêncio com uma voz suave:

— Sabe... a primeira masmorra que enfrentei foi completamente diferente dessa.

A curiosidade acendeu nos olhos do grupo. Klaus, que amarrava uma corda numa árvore, virou-se, intrigado.

— Diferente como? — perguntou, limpando o suor da testa com o antebraço.

— Era uma floresta — explicou Emília, um sorriso tímido curvando os lábios. — Mas sem salamandras ou monstros pulando na gente. Era infestada de... fungos.

— Fungos? — repetiu Leonhard, franzindo o cenho, os óculos escorregando pelo nariz.

— Sim, fungos — confirmou ela, o tom ganhando um toque de diversão. — Pareciam inofensivos, só cresciam ali, quietos. Mas se você chegasse perto, liberavam esporos venenosos que faziam você tossir até desmaiar.

O silêncio que se seguiu era quase cômico, enquanto o grupo digeria a imagem.

Branik, ainda agachado, ergueu a cabeça, a expressão incrédula.

— Então... vocês lutaram contra plantas que não se moviam? — perguntou, como se precisasse de confirmação.

— Exatamente — respondeu Emília, rindo baixo. — A turma Bär odiou. Eles queriam ação, monstros gigantes, sangue... E o que tivemos? Uma guerra de paciência contra cogumelos assassinos.

Leonhard soltou uma gargalhada, o som ecoando na clareira.

— Fungos assassinos! De todas as coisas!

Até Lisette, sempre reservada, deixou escapar um sorriso discreto, balançando a cabeça diante do absurdo.

O clima aliviou, e Klaus recostou-se contra uma árvore, os olhos fixos no céu nublado da masmorra, tingido de tons alaranjados irreais.

Uma ironia amarga atravessou sua mente. Erwin passou meses me zoando, dizendo que eu só enfrentei vermes lentos... E no fim, ele encarou fungos que nem se mexiam?

A imagem era tão ridícula que ele precisou morder o lábio para não rir alto. Mas havia algo mais profundo ali, uma sensação sutil de justiça, como se o destino estivesse alinhando as peças de um jogo que ele ainda não compreendia.

Fechando os olhos por um momento, Klaus deixou o corpo relaxar, o som da fogueira crepitando ao fundo. A batalha contra a salamandra classe Elite fora brutal, e a masmorra ainda guardava desafios desconhecidos.

Mas, por agora, o calor da fogueira, as risadas abafadas e a presença de seus companheiros eram o suficiente.

Eles precisavam desse momento — um respiro antes de enfrentar o que a ilha estranha ainda reservava.