O relógio marcava nove da manhã quando Zaria entrou na sala de reuniões privativa da empresa. O ambiente era silencioso, iluminado apenas pela luz natural que entrava pelas janelas amplas. Seu empresário, Sr. Kang, estava sentado à cabeceira da longa mesa de madeira escura, com um tablet em mãos e uma expressão carregada.
Ela sentiu um aperto no peito. Sabia exatamente o motivo daquele encontro.
— Sente-se, Zaria. Precisamos conversar.
Zaria respirou fundo antes de puxar a cadeira e se acomodar. Sua mente estava acelerada, mas ela manteve a postura firme.
Sr. Kang deslizou o tablet para ela, e seus olhos percorreram as manchetes que se destacavam na tela:
"Zaria e Yuna: Apenas amigas ou algo mais?"
"Rumores sobre um possível relacionamento entre Zaria e a atriz Yuna tomam conta da internet!"
"A proximidade das estrelas gera discussões: será que a Coreia está pronta para isso?"
Ela sentiu um nó na garganta, mas manteve o olhar impassível ao devolver o aparelho para ele.
— São apenas especulações. A mídia sempre procura algum escândalo para falar. Antes, diziam que eu tinha algo com a Luna.
Sr. Kang apoiou os cotovelos na mesa e entrelaçou os dedos, escolhendo bem as palavras antes de responder.
— Zaria, você sabe o que acontece quando esses rumores crescem. Pode começar como uma especulação inofensiva, mas logo vira algo fora do nosso controle. Você já viu o que aconteceu com o Hunter.
Zaria franziu o cenho, surpresa com a comparação.
— Hunter? Como assim? Ele foi cancelado por ser um agressor. Por abusar de mulheres. O caso dele não tem nada a ver com isso.
— Não estou comparando os casos, mas sim as consequências — Sr. Kang rebateu de imediato. — A carreira dele acabou em questão de dias. Ele perdeu contratos, patrocinadores, fãs. Foi apagado da indústria. O cancelamento foi tão massivo que hoje ninguém ousa sequer mencionar o nome dele.
Zaria apertou as mãos no colo, inquieta.
— Mas isso é diferente. Estamos falando de um crime no caso dele. No meu, é um rumor de relacionamento.
— E você acha que a indústria se importa com essa diferença? — ele retrucou, a voz carregada de preocupação. — O público pode amar você hoje e te rejeitar amanhã. O que acha que vai acontecer se a Coreia começar a te enxergar como alguém que está “desviando do padrão”? Como alguém que pode “influenciar” milhões de jovens de um jeito que o público conservador não aprova?
Zaria desviou o olhar, mordendo o lábio. Ela sabia que a Coreia ainda era tradicional, que o amor entre duas mulheres não era uma situação amplamente aceita. Mas ouvir isso assim, de forma tão direta, a fazia encarar o peso real da situação.
— O que você quer que eu faça? — perguntou, sua voz saindo mais baixa do que gostaria.
Sr. Kang suspirou e se recostou na cadeira.
— Não estou te dizendo para parar de ver a Yuna. Mas vocês precisam ser mais discretas. Sua carreira está no auge. Você tem contratos, turnês, patrocínios gigantes. Pode estar colocando tudo isso em risco. E, sinceramente, você está preparada para lidar com as consequências?
Ela não respondeu. Parte de si queria gritar que não se importava, que Yuna valia qualquer sacrifício. Mas outra parte sabia que nada era tão simples.
Após um longo silêncio, ela finalmente murmurou:
— Eu vou pensar sobre isso.
Sem esperar resposta, se levantou e saiu da sala, o coração pesado. Ela amava Yuna, mas até onde estava disposta a ir para proteger esse amor? Ou melhor, para proteger ela? Yuna também estava no auge de sua carreira e a última coisa que Zaria queria era prejudicá-la.
Zaria saiu do prédio da empresa com passos apressados, sentindo o peso da conversa com seu empresário ainda pairando sobre seus ombros. O sol da manhã já iluminava as ruas de Seul, mas ela sentia um frio interno, uma inquietação que não conseguia dissipar. Precisava ver Yuna.
Entrou no carro e pediu para o motorista levá-la até a casa da namorada. O caminho foi silencioso, apenas seus pensamentos tumultuados ecoando em sua mente. Ela nunca gostou de esconder nada de Yuna e não começaria agora.
Assim que bateu na porta, Yuna a atendeu rapidamente. Seu sorriso habitual surgiu, mas não durou mais que um segundo.
— O que foi? Aconteceu alguma coisa? — Yuna perguntou, segurando a mão de Zaria e a puxando para dentro.
Zaria suspirou e passou os dedos pelos cabelos, visivelmente nervosa.
— Tive uma reunião com o Sr. Kang hoje cedo.
Yuna fechou a porta atrás dela e a abraçou pelos ombros.
— E?
— Ele está preocupado com os rumores sobre nós. Assim como você mencionou na outra noite. Disse que isso pode prejudicar minha carreira, que o público pode não aceitar bem... e me comparou com o Hunter.
Yuna franziu o cenho, surpresa e indignada.
— O quê? Como assim? O caso do Hunter foi um escândalo de abuso. Como ele pode comparar isso com um possível relacionamento?
— Ele não quis dizer que era a mesma coisa, mas que o cancelamento pode ser tão forte quanto. Ele acha que, se as pessoas começarem a me ver como alguém que foge do padrão, minha carreira pode desmoronar do dia para a noite.
Yuna suspirou, pegando as mãos de Zaria e apertando-as com carinho.
— Isso te assustou?
Zaria suspirou.
— Assustou, sim. Não por mim, mas pelo que isso pode significar para nós duas. Eu nunca escondi quem eu sou, mas também nunca precisei enfrentar algo tão grande assim. E eu tenho medo... medo de como isso pode afetar você também.
Yuna sorriu, mas Zaria percebeu que havia preocupação no seu olhar.
— Na verdade, eu também tive uma conversa sobre isso hoje.
Zaria arqueou a sobrancelha.
— Com quem?
— Minji. Ela também mencionou os rumores, mas foi bem mais tranquila. Disse que a sociedade está mudando, mesmo que lentamente. Ainda há resistência, mas também há espaço para pessoas que querem desafiar os padrões.
— E você concorda com isso?
Yuna assentiu.
— Tanto que estou considerando aceitar um papel em uma série chamada Framed.
Zaria franziu o nariz.
— E o que isso tem a ver com tudo isso?
— O roteiro tem elementos de girls love. A protagonista que me ofereceram tem um arco romântico com outra mulher. Não é apenas um detalhe, é parte essencial da história. Se eu aceitar, estarei assumindo um papel que vai contra os padrões da indústria coreana. Isso pode ser uma jogada arriscada para minha carreira, mas também pode ser revolucionário.
Zaria ficou em silêncio, absorvendo a informação.
— E você quer aceitar?
— Quero. Mas queria conversar com você antes. Porque, se eu fizer isso, significa que estaremos enfrentando duas batalhas ao mesmo tempo. A minha, como atriz assumindo um papel desafiador, e a sua, lidando com os rumores sobre nós. Eu preciso saber se você está pronta para isso.
O coração de Zaria acelerou. O medo ainda estava ali, mas ao olhar para Yuna, viu força e coragem. Yuna estava disposta a arriscar, a desafiar as normas, a lutar pelo que acreditava.
— Eu não sei o que vai acontecer, Yuna. Mas sei que não quero fugir disso. Não quero fugir de nós.
Yuna sorriu e puxou Zaria para um abraço apertado.
— Então vamos enfrentar isso juntas.
E ali, tomaram a decisão que mudaria tudo.