Capítulo 3 – O Domínio do Inimaginável

O céu ainda estava escuro quando Hiro começou.

Seus punhos estavam sangrando, marcados por horas de treino.

Bom.

A dor o mantinha afiado.

Mas agora não era hora de socos ou golpes.

Era hora de magia

Hiro ergueu a mão direita, os dedos estendidos.

— Ignis

Chamas dançaram em sua palma, obedientes. Não eram labaredas selvagens, mas lâminas de calor controlado, moldadas por anos de prática em outra vida.

Ele fechou o punho.

O fogo se comprimiu em uma esfera brilhante, girando entre seus dedos.

— Ignis Lance.

A esfera se esticou, transformando-se em uma lança flamejante. Com um movimento rápido, Hiro arremessou-a contra um tronco distante.

BOOM.

A árvore explodiu em estilhaços carbonizados.

Hiro suspirou, satisfeito

Pelo menos isso não mudou.

Com a mão esquerda, Hiro traçou um círculo no ar.

— Ventus.

O vento obedeceu.

Uma rajada cortante girou em torno dele, levantando folhas e poeira. Ele direcionou o fluxo com movimentos precisos, criando pequenos redemoinhos que se dissipavam sob seu comando.

— Cyclon.

O ar se comprimiu, formando uma lâmina invisível. Hiro cortou o ar, e a lâmina de vento voou, decepando galhos de árvores a dez metros de distância.

Preciso trabalhar mais na precisão.

Cansa mais do que antes.

Mas ainda funciona.

A Testemunha Inocente, Mio estava parada atrás de uma árvore os olhos arregalados, o vestido de dormir balançando no vento que Hiro mesmo criara.

— Você... você é um mago?

Hiro deixou o vento morrer.

— Não conte para ninguém.

Mio correu até ele, pulando sobre as raízes expostas.

— Isso é Incrível! Você vai entrar para o time de magia da Academia? Vai conjurar dragões de fogo? Vai—

— Mio. Hiro colocou as mãos nos ombros da irmã. Isso não é um jogo.

Ela franziu o nariz.

— Claro que é! Magia é divertida!

Hiro olhou para as mãos pequenas da irmã – mãos que em outra vida haviam se agarrado a ele enquanto os demônios as alcançavam.

— Nem todo fogo é para shows, Mio. Alguns... são para sobreviver.

Então você vai me ensinar? Ela esticou os dedos, imitando os gestos que vira Hiro fazer. Ignis! Ventus!

Nada aconteceu. Ela soltou uma risadinha.

Hiro observou o esforço ingênuo da irmã, aquela expressão cheia de esperança que ele já não conseguia sentir. Ela não entendia. E ele faria de tudo para que nunca precisasse entender.

— Prometa primeiro. Ele se ajoelhou para ficar na altura dela, as mãos ainda quentes do treino. Ninguém pode saber. Nem mamãe, nem papai.

Mio fez um biquinho, os dedos brincando com a barra do vestido.

— Mas por quê? Papai ia adorar! Ele sempre—

— Prometa, Mio. A voz de Hiro não era áspera, mas firme como aço.

Ela hesitou por um momento, então ergueu a mãozinha com o mindinho esticado.

— Prometo! Cruz, meu coração, espero morrer se mentir!

Hiro prendeu o mindinho dela com o seu, sentindo como ela era...... frágil

— Se você contar... Ele procurou uma ameaça que a assustasse sem a traumatizar. ...eu nunca mais mostro magia para você.

Os olhos de Mio se arregalaram como luas cheias.

— Não, não! Eu prometo mesmo! Vou guardar seu segredo super bem! Ela fez uma careta de concentração. Vai ser nosso segredo de guerra!

Guerra. A palavra ecoou na mente de Hiro como um sino fúnebre. Ele forçou os cantos da boca para cima, moldando um sorriso que não chegava aos olhos, obviamente falso, mas Mio.... Não percebeu

— Isso mesmo. Nosso segredo.

Mio pulou de alegria, completamente alheia à sombra que passava pelo rosto do irmão.

— Agora mostra de novo! Faz aquele redemoinho! Faz o fogo dançar!"

Hiro ergueu a mão obediente, deixando pequenas chamas amarelas girarem em sua palma – cores brilhantes, inofensivas, bonitas. Apenas o suficiente para fazer Mio rir.

Enquanto ela batia palmas, Hiro observava o reflexo das chamas em seus olhos inocentes. Ela nunca veria as chamas verdadeiras. As que queimavam cidades. As que consumiam corpos.

— Olha, Hiro! Parecem vagalumes! Mio tentou tocar as chamas, mas Hiro afastou a mão rapidamente.

— Não. É perigoso.

Mio fez beicinho, mas logo se distraiu com um pássaro que pousou numa árvore próxima. Hiro apagou as chamas quando ela não estava olhando.

Que continue sendo um jogo para você, Mio. Ele engoliu o gosto amargo da mentira. Que nunca precise saber para que serve o fogo de verdade.

O sol nascia por trás das montanhas quando Mio finalmente cansou, esfregando os olhos sonolentos.

— Amanhã você me mostra mais, né? Ela agarrou a mão de Hiro, confiante.

Ele apertou os dedos dela com cuidado, como se segurasse algo precioso que poderia escorrer entre seus dedos a qualquer momento.

— Amanhã. Mentiu de novo.

Enquanto levava Mio de volta para casa, Hiro sentiu o peso da espada imaginária em suas costas. Mais pesada agora.

Mas valeria a pena.

Tudo valeria a pena, contanto que aquele sorriso despreocupado nunca se apagasse.