O tempo parecia ter parado na casa dos Tanaka.
Os dias se alongaram em silêncio, preenchidos por uma tensão que ninguém ousava nomear. As conversas viraram sussurros. Os olhares, evitados. E Hiro… Hiro era um estranho andando pelas tábuas de uma casa que um dia chamou de lar.
Hayato observava o filho de longe. Tentava se convencer de que ainda havia algo do garoto ali. Mas toda vez que via aqueles olhos — frios, distantes, tão calculistas — sentia como se olhasse para alguém que sobreviveu a cem mortes e voltou apenas com ódio e propósito.
Era como viver com um fantasma de carne e osso.
Hiro treinava sozinho, com disciplina cruel. Corria antes do amanhecer. Empurrava o corpo ao limite. À noite, dormia no sótão, afastado. Nunca chorava. Nunca ria. Nunca vacilava.
Ayame fingia normalidade — preparava o jantar, limpava a casa, ajudava Mio com as lições. Mas os olhos dela estavam inchados. Toda madrugada, escutava passos pesados no telhado, o rangido da madeira. E, às vezes, abafado, um choro contido. Não dela. Dele.
Hiro chorava calado.
Mas só quando tinha certeza de que ninguém podia ouvir.
Naquela noite, a chuva caía fina sobre o telhado, como dedos batendo com paciência. No corredor, Mio espiava a porta do sótão entreaberta. Segurava um pequeno lenço nas mãos — ela mesma costurou, com flores bordadas de modo torto. Queria dar ao irmão. Queria dizer que estava tudo bem. Mesmo sem entender o que estava acontecendo.
— Onii-chan? — sussurrou ela, subindo devagar.
Lá em cima, Hiro estava sentado, os olhos fixos na parede como se estivesse em outro mundo. Quando a viu, sua expressão não mudou. Não sorriu. Mas também não afastou a irmã.
— Você tá… triste? — Mio perguntou, ajoelhando-se ao lado dele.
Silêncio.
Ela estendeu o lenço, com as mãozinhas trêmulas.
— Eu não sei o que aconteceu com você… Mas você ainda é meu irmão. Mesmo se estiver quebrado. Eu vou costurar você de novo.
Hiro piscou devagar, como se absorvesse aquelas palavras com a lentidão de quem já havia esquecido o que era ser amado de forma tão pura.
— …Mio.
Foi tudo o que disse. Mas sua mão, pela primeira vez, tocou a dela.
Fraca. Gelada. Mas ali.
Mais tarde, Ayame encontrou Mio dormindo no colo do irmão, no sótão empoeirado. Hiro olhava pela janela, e seus olhos estavam marejados.
Mas ele não chorou.
Apenas fechou os olhos.
E pela primeira vez em muito tempo… descansou.
A tensão ainda pairava. Hayato ainda não conseguia encarar o filho sem sentir medo.
Mas naquela noite, por mais silenciosa que fosse, o gelo deu um estalo.
E onde havia apenas sombras… surgiu uma rachadura de luz.