Dois anos.
Dois anos de silêncio, de treino, de sangue.
Aos olhos da vila, Hiro era apenas um prodígio calado e educado. Um menino reservado, que raramente sorria, mas que cuidava da irmã com dedicação exemplar.
Para Ayame, ele era o filho responsável. Para Mio, o irmão herói.
Mas apenas Hayato sabia a verdade.
Hiro passava noites fora. Voltava com cortes nos braços, o corpo moído, o olhar ainda mais frio. Os bandidos que assolavam as estradas, os saqueadores que cruzavam o interior — um a um, desapareciam.
Ele os matava. Sem hesitar. Sem descanso.
E saqueava seus corpos.
Armas, jóias, cartas de dívida, até pergaminhos mágicos. Tudo cuidadosamente escondido no velho galpão atrás da casa.
Hayato o observava, calado, sempre o esperando voltar. Os dois não falavam muito, mas se entendiam com o olhar.
— Você está montando um futuro, disse o pai certa vez. Só não esqueça por quem está lutando.
Hiro jamais esqueceu.
Aos quinze anos, Hiro se levantou antes do sol nascer.
Vestia roupas simples, mas seus olhos já não pertenciam a um garoto. Havia peso em seu olhar. Firmeza em cada gesto.
A carta da Academia Arcadia repousava sobre a mesa.
Ele havia passado na prova escrita enviada à distância — uma formalidade, dada sua recomendação. Mas não era isso que o movia.
Era hora de mudar tudo.
Na varanda, Ayame estendia uma última toalha. Hiro se aproximou.
— Mãe.
Ela se virou, sorrindo.
— Vai sair cedo de novo?
Hiro respirou fundo.
— Hoje é o dia.
Ela o olhou por um instante, e seus olhos se arregalaram.
— O dia... da Academia?
Ele assentiu.
— Mas não vou sozinho.
Mio correu até eles com um pão na mão, sorrindo sem entender.
— Vamos passear?
Hiro se agachou e bagunçou o cabelo da irmã.
— Vamos morar na capital.
Ayame quase deixou cair a toalha.
— Hiro, isso é...! Nós não temos dinheiro para—
— Eu tenho.
Ela parou. Olhou para Hayato, que saía da casa naquele momento. O homem apenas cruzou os braços e assentiu.
— Ele tem.
Ayame parecia confusa. Hiro se adiantou.
— A capital é mais segura. A medicina é melhor. A educação também. Mio merece isso. E a Academia... é só o começo.
Ela levou a mão à boca, emocionada.
— Você... você pensou em tudo isso sozinho?
— Pensei em vocês.
No final da tarde, a pequena carroça que Hiro havia comprado com seu próprio ouro estava pronta.
Carregada de mantimentos, livros e espadas escondidas sob panos. Ele mesmo guiava, enquanto Ayame mantinha Mio entretida com canções.
Hayato, sentado na parte de trás, observava a estrada.
Antes de partirem, Hiro olhou uma última vez para a vila.
Nada o prendia ali.
Mas tudo o que ele amava estava com ele.
A jornada para Arcadia havia começado.
Não como um herói.
Mas como um irmão.
Como um filho.
Como alguém que jurou nunca mais perder o que ama.