O dormitório estava silencioso. A noite envolvia a Academia Arcadia com um véu frio e escuro.
Na penumbra de seu quarto, Hiro Tanaka permanecia sentado no chão, encostado na parede, a espada repousando sobre os joelhos. Seus olhos estavam abertos… mas pesados.
A cada trinta segundos, sua cabeça tombava. Um microsono. Um mergulho instantâneo num pesadelo que não queria ver — mas que sempre voltava.
A cidade ardia em chamas.
A placa derretida do portão ainda podia ser lida: 'Bem-vindo a Lysgard'.
Cadáveres cobriam as ruas, humanos e bestas irreconhecíveis, misturados ao cheiro de sangue e carne queimada. O céu estava vermelho, os edifícios em ruínas.
Ele e seu antigo esquadrão lutavam contra os Voidborns — criaturas bestiais, e criaturas deformadas, com olhos brancos como a lua.
Gritos. Explosões.
— Capitão, nos cercaram! — ecoava a voz de alguém.
— Onde está o reforço?!
— Não tem reforço!… estamos sozinhos!…
Hiro acordava com um leve espasmo. O olhar vazio voltava para a espada. Suas mãos a seguravam com firmeza.
Mas ele não estava em Lysgard.
Ainda não.
Em outro canto da Academia, Sakura estava deitada na cama… mas não dormia.
O quarto estava escuro, exceto pela luz da lua que atravessava a janela. Sua katana repousava ao lado da cama, mas o que mais doía nela não era o corpo,
era o orgulho.
— Ela virou as costas para a luta... — murmurou.
— E ainda assim... poderia ter me matado.
Ela fechou os olhos com força. A cena da adaga contra sua garganta se repetia como uma cicatriz invisível.
— Como alguém sem honra nenhuma pôde me humilhar assim...?
A raiva queimava dentro dela.
Mas não era só raiva. Era medo.
Medo de que talvez, só talvez… ela nunca fosse forte o bastante.
No alto da torre da ala leste, Yumi Kazehara deitava-se em sua cama macia. Os criados já haviam saído. A Santa estava apenas Mari ali, sua empregada e melhor amiga.
Mas sua mente não estava em orações.
Ela olhava para o teto, a luz da lua dançando entre seus cabelos prateados.
Hiro.
Desde o primeiro dia… desde o primeiro olhar… algo dentro dela mudou.
— Por que eu não consigo parar de pensar nele…? — sussurrou, com o rosto corado.
— Por que meu coração acelera só de lembrar do jeito como ele me olha…?
Ela tocou os próprios lábios, envergonhada com seus próprios pensamentos.
Não sabia mais o que era isso. Nunca mais havia sentido. Nunca mais fora tratada como uma garota comum após seu dom ser revelado. Apenas como 'a Santa'.
Mas agora… ela se sentia viva. Assustada, mas viva.
No sofá próximo à lareira, Mari lia em silêncio.
Um grosso livro de romance aberto em seu colo, os olhos firmes, apesar do cansaço da noite.
Ela lançava olhares discretos para Yumi, mas não dizia nada.
Apenas fechou o livro com suavidade, abraçando-o contra o peito.
“Ela está diferente…”, pensou.
“Esse garoto… mexeu com ela.”
Na ala norte, cercada por livros e relíquias mágicas, Saori Kurosawa se sentava à escrivaninha. Seus dedos tamborilavam a madeira enquanto ela fitava a parede.
— Ele é um lixo. Um camponês.
Sua voz tremia.
— Como alguém assim domina os quatro elementos? Eu passei anos para dominar o vento…
Ela se levantou de repente, andou de um lado para o outro.
— E aquela garota…
A imagem de Hikari surgiu em sua mente.
— O que era aquela presença...? Aquilo não era sede de sangue normal. Aquilo era... monstruoso.
Ela abraçou o próprio corpo. Pela primeira vez, se sentiu pequena.
Um plebeu com cinco elementos.
Uma garota com velocidade sobre-humana.
E ela… a filha do Duque da Magia… parecia estar ficando para trás.
A noite seguia silenciosa…
Mas os gritos de Lysgard ainda ecoavam na mente de Hiro.
O passado o assombrava.
O presente o confundia.
E o futuro… ainda não havia sido escrito.