Zona Morta

"É uma merda ter que passar por todos os setores. Esse setor, por ser isolado, provavelmente era um centro de lavagem de dinheiro. Com toda certeza. Algo corruptivo, definitivamente."

A SIZ, Shinzuku Industrial Zone, fica num ponto estratégico e periférico de Tóquio, depois da Estação Minazoto, mas antes do Porto de Takeuchi-Hamatsu. É um órgão industrial-fabril de larga escala em posse do governo. O cheiro de metal fervido e poeira de concreto crescia conforme avançavam. O corredor era apertado, mas os passos de Luppo estavam precisos. Ele mantinha a bengala ligeiramente à frente, sentindo uma vibração leve.

"Quantas entradas tem esse setor?" perguntou ele, sem virar o rosto.

Reno passou a mão pela parede descascada ao lado, sentindo os veios frios do concreto e o pó acumulado. Seu olhar percorria o corredor estreito como se tentasse ler as memórias do lugar. "Oficialmente? Quatro." Ele parou. "Na prática, sete. Duas delas subterrâneas, para acesso antigo de manutenção elétrica. As outras três foram abertas de forma irregular décadas atrás. Eles conduziram um esquema de tráfico de armas há alguns anos neste setor. Já que é o mais isolado, faz sentido ser esse."

Luppo ergueu a cabeça ligeiramente. "Quem?"

"Um grupo de operários. Eles foram presos mas acho que fugiram, ou morreram, algo do tipo. Eles ficaram famosos. Saíram até no jornal."

"Hm. Entendi."

Reno continuou andando. Ele deu um leve suspiro, como se tivesse lembrado de algo.

"Um amigo meu trabalho aqui, na verdade, muitos conhecidos trabalharam."

Luppo inclinou a cabeça em sua direção. "Ele fazia parte do esquema?"

"Não." Reno riu de forma seca. "Ele foi um dos denunciantes. Mandaram sumir com ele antes da investigação oficial começar."

"E... Então...?"

"Acabaram conseguindo sumir com seu corpo..."

Luppo não respondeu de imediato, ele apenas assentiu com a cabeça, respeitosamente.

"Então essa missão é pessoal?"

"Não." Reno ajeitou o colarinho. "Foi pessoal só da primeira vez que entrei aqui. Agora é só trabalho." Ele olhou em volta. "Platina já deve ter alcançado o outro lado, temos que andar mais rápido. Vamos abrir a sala de fundição do outro lado."

No final do corredor, encontraram uma grande porta de ferro enferrujado, A porta estava parcialmente tombada, presa por um único eixo enferrujado. Reno se aproximou com cautela, tirou um pequeno cartão digital do bolso e o passou por uma tranca holográfica improvisada que ele mesmo havia instalado.

"O lugar é instável. Não libere energia antes de eu vistoriar a área," avisou.

Luppo segurava firme sua Shakuhachi. Sua vibração sugeria um prelúdio avassalador.

"Tem algo aqui."

Reno fez um sinal de silêncio com o dedo, então empurrou a porta com força.

O interior do galpão era vasto e abafado, coberto por uma fina névoa acinzentada. Torres de metal derretido formavam esculturas deformadas nos cantos. A iluminação era fraca, vinda apenas de algumas luminárias de emergência que piscavam em tons vermelhos.

No centro da sala, Reno notou imediatamente uma presença distoante.

Estava no centro do armazém uma jovem, talvez com dezenove ou vinte anos. Sua pele era de um verde ressecado e espinhento, lembrando a textura de cactos queimados ao sol. Seu cabelo era um emaranhado denso de pétalas carmesim, caindo como uma coroa viva ao redor da cabeça. Cada fio parecia latejar como veias abertas. Os olhos, completamente negros, pareciam sugar a luz em vez de refletir. Ela estava ajoelhada, com os dedos mergulhados numa poça grossa de resina avermelhada. Quando notou a presença deles, virou-se com lentidão antinatural e sorriu.

"..."

Reno se posicionou à frente, protegendo Luppo instintivamente.

A mulher se ergueu.

Cada movimento fazia pequenos espinhos se abrirem pelas articulações, e seu cabelo vibrava suavemente como um campo de flores ao vento.

"..."

Luppo se adiantou meio passo.

"Ela tem consciência, se atente-se Luppo, se oriente pela bengala e prepare para liberar a Fenda artificial."

"Sim," murmurou Reno. "E isso é o mais perigoso em um Ardente. Na verdade, quando Ardentes ascendem tão inaturalmente como ela ascendeu, eles são propícios a estarem completamente fora de si e corrompidas, mas este está diferente. Está altamente sensciente, e isso é um pouco raro."

A Ardente inclinou a cabeça, então sorriu novamente, e a pele em sua face se abriu como uma flor grotesca, expondo uma série de dentes pontiagudos e translúcidos.

"Sete metros. Meio passo à esquerda. Ela está com os braços soltos, mas há tensão no pescoço e nas pernas. Preparada pra saltar."

Luppo assentiu, movendo-se com cuidado. A Shakuhachi vibrava com firmeza. O núcleo pulsava quente contra a palma da mão. Ele girou o botão até o primeiro nível.

A Ardente abriu os braços lentamente. Espinhos se projetaram dos ombros até os pulsos. Seus olhos negros não piscavam. A boca deformada se mantinha escancarada, com fios de saliva escorrendo pelo queixo rachado. O pó vermelho que saía de seus cabelos caía em redemoinhos irregulares, dispersando-se pelo chão rachado da sala de fundição.

"Vocês... Vocês queimam. Eu sinto o calor de vocês," ela disse, num tom fragmentado. "Dois corações acesos... e um deles ainda não aprendeu a bater direito."

Reno não respondeu. Deu um passo ao lado, lentamente, deixando o caminho livre para Luppo se posicionar melhor.

"Se ela pular, eu cubro. Mas a primeira abertura é sua," disse Reno, com tom prático. "Você precisa liberar a Fenda. Lembre-se: só quando sentir o impulso."

Luppo respirou. Seus dedos se fecharam com mais força sobre a bengala. Ele não tinha medo, mas havia uma sensação quente e difícil de conter nas costelas. Era como se seu próprio peito estivesse tentando avisá-lo de algo.

A Ardente avançou um passo. E depois outro. Rápida. Os espinhos tilintavam a cada movimento. Quando ela girou o corpo, projetou do ombro um fragmento de osso em alta velocidade.

Reno reagiu de imediato — puxou o braço, desviando por centímetros.

"Contato visual e ataque confirmado," disse, seco. "Ela declarou combate."

"Recebido," respondeu Luppo, ativando o segundo nível da Shakuhachi. A vibração aumentou. O bastão ganhou leveza e força. Ele girou sobre os calcanhares, seguindo as pulsações no chão.

"Dois metros à frente. Ela tá descendo agora!" gritou Reno.

Luppo girou a bengala com ambas as mãos e, no momento exato em que sentiu a presença no ar, ergueu o bastão.

O impacto veio seco. A criatura tentou golpeá-lo com a perna coberta de espinhos, mas a Shakuhachi interceptou o ataque. O metal vibrou em alta frequência, e o som se espalhou pela sala como um estalo de vidro sendo trincado.

Luppo empurrou com força, fazendo a Ardente recuar três passos. Ela soltou um grito agudo, como se estivesse rindo e gritando ao mesmo tempo. Seus olhos brilhavam. Agora ela estava animada.

"Ela quer brincar," Reno murmurou. "Vai escalonar rápido."

A criatura correu pelas laterais, apoiando-se nas paredes. Subiu pelas torres de ferro, girando o corpo como um inseto. Espinhos começaram a brotar em fileiras pela coluna vertebral.

"Ela tá indo pra cima—!" Reno gritou.

Luppo não esperou. Apertou o botão até o fim.

A Shakuhachi tremeu violentamente. O núcleo brilhou com intensidade azulada. Uma onda de energia percorreu o bastão. Luppo deu dois passos à frente, ergueu o bastão como uma lança curta e lançou um golpe vertical contra o ar.

O som do impacto foi abafado, mas a explosão de energia que se seguiu empurrou o ar ao redor. A Ardente foi atingida de raspão, o golpe cortou parte do ombro esquerdo e lançou faíscas densas no teto.

Ela gritou mais alto e sorriu.

A Ardente escancarou a mandíbula com o ferimento ainda quente no ombro, mas não demonstrava dor, pelo contrário, parecia mais viva do que antes. O sangue que escorria de seu ferimento era espesso e escuro. Ela cravou os pés no chão e impulsionou o corpo de volta contra Luppo.

Ele tentou girar a Shakuhachi novamente, mas já era tarde. A criatura atingiu o peito de Luppo com o ombro inteiro, espinhos projetados em alta velocidade como uma salva de pregos disparados. O impacto foi direto e o som abafado de carne sendo atravessada ecoou pela fundição.

“Luppo!” Reno gritou, correndo para frente.

O garoto foi jogado para trás com força. Bateu contra uma das estruturas de metal enferrujado e caiu de joelhos. O bastão escapou de sua mão e deslizou alguns metros longe. Havia sangue no uniforme, próximo ao ombro e abaixo das costelas, mas ele ainda estava consciente. Respirava ofegante, com a testa suada e os dentes cerrados.

A criatura arqueou seu corpo para frente com movimentos lentos e predatórios e avançou, enquanto seus espinhos cresciam cada vez mais rápido. A pele dela parecia mudar de tonalidade, ficando mais escura, como se estivesse prestes a endurecer completamente.

Reno já estava em posição. Seus olhos percorreram a cena com precisão absoluta. Ele sacou de dentro da túnica um pequeno bloco dobrado de papel branco, amarrotado e discreto.

Com a mão esquerda, ele retirou uma única folha.

“Você não vai tocar nele de novo,” disse com voz baixa, quase inaudível.

A Ardente se virou em sua direção, mas depois disso, Reno não mexeu mais nenhuma parte do corpo a não ser suas mãos. Seus dedos se moveram com precisão absurda, ele dobrou a folha uma vez, depois outra, e mais uma. As dobras eram firmes, vincos criados de linhas de tensão invisíveis que jamais se soltariam.

A criatura correu, em sua direção, violentamente.

Reno girou a última dobra, e o papel assumiu a forma de um revólver.

Realmente, um revólver de papel. Era como um daqueles revólveres do faroeste de 1850.

Um leve brilho percorreu as bordas da arma improvisada. Era como se, naquele exato instante, o objeto aceitasse sua nova identidade: não mais papel, mas um condutor letal de vontade.

Reno, então, apontou a arma, mirando a cabeça da Ardente.

A arma de papel disparou sem pólvora, sem ruído. O projétil fino, branco, pequeno como uma pétala cruzou o espaço em silêncio absoluto e atravessou o olho esquerdo da criatura, e uma grande explosão veio em seguida.

Do interior do crânio da Ardente, uma erupção branca de energia explodiu com força bruta, destruindo a parte superior do rosto e lançando pedaços do cabelo floral em todas as direções. O corpo caiu de joelhos, e depois de lado, com um baque seco. Os espinhos da pele da Ardente se retraíram. A pele começou a se desmanchar como cinzas pegando fogo do centro para fora. Em segundos, tudo que restava era uma mancha escura avermelhada no chão, acompanhada de um fragmento de um material estranho.

Era como uma estalagmite. Ou melhor, uma garra, ou um bico, algo nesta linha.

Reno soltou um suspiro longo. Jogou o revólver de papel de lado e caiu no chão, com as mãos para trás, sentando-se.

Luppo tentava se levantar, gemendo. A mão tremia, mas ele puxava a Shakuhachi de volta com dificuldade. 

Reno se levantou, e caminhou até o centro da mancha. Se agachou e pegou o fragmento.

“Você está sangrando,” disse Reno, caminhando até ele.

“Eu percebi, mas... Pegou entre as costelas. Não perfurou o pulmão!”

“Tem certeza?”

Luppo assentiu. “Aprendi a distinguir esse tipo de dor. Ainda dá pra lutar. Só... me dá dois minutos.”

Reno se ajoelhou e segurou firmemente o fragmento.

“Isso vai doer, possivelmente. Sim. Deixando claro, a maior dor da sua vida.”

"Tudo bem. Mas o que é isto? Parece uma agulha mágica."

"Isto é o que chamamos de "Estopim".

Reno rapidamente afundou profundamente o objeto do centro do peito de Luppo. Seu corpo tremeu inteiro por três segundos, e os batimentos cardíacos desestabilizaram. Veias saltaram pelo pescoço de Luppo. As bandagens, que estavam cobrindo seus olhos, se desmaterializaram instantaneamente, e seus olhos se reviraram por um instante, enquanto ele se contorcia com violência, como se estivesse sendo eletrocutado. Uma onda de calor percorreu seus membros, do peito às extremidades. 

Reno mantinha a mão no esterno dele, pressionando o fragmento do Estopim contra seu coração.

“Respire, deixa a dor te atravessar e sai do outro lado.”

Luppo arfava como um cão ferido, mas seu olhar focava de novo. A sensação era de estar sendo recosturado. Ainda assim, ele suportou o processo.

De repente, uma luz amarela, ou laranja começou a se criar em seu peito, e a região da pele perfurada começou a lentamente se transformar.

Primeiramente, a pele começou a se tornar um pouco translúcida, como se fosse aplicado um efeito de "invisibilidade instantânea", mas, pouco a pouco, sua pele começou a se transformar em vidro puro.

Luppo tombou pro lado, tossindo. O gosto metálico de sangue ainda estava em sua boca, mas ele já sentia os músculos estabilizarem e o calor aliviar. Um suor gelado escorria da testa até o queixo.

"Ah, Reno, isto foi horrível!"

“Você está vivo. E mais do que isso, sua conexão com a arma vai responder com mais força agora. O Estopim é um reinício forçado. Nele está condensando toda a energia de sua alma, é assim que Ardentes ficam mais poderosos: eles eliminam outros Ardentes para consumir sua força, mas, como você não tinha exatamente ascendido ainda, introduzir um Estopim diretamente no seu coração apenas acelerou o processo.”

Luppo assentiu lentamente, ainda ofegando.

“Você é o que temos de melhor atualmente.” Reno respondeu, com frieza. “Quer dizer, você não pode lutar sem pelo menos ter uma Fenda para chamar de sua.” Ele se levantou de novo, limpando as mãos na lateral da túnica. Depois virou-se em direção ao corpo desfeito da Ardente e encarou o vazio onde ela havia estado.

“Ela falou sobre dois corações. Um ainda aprendendo a bater.” Reno cruzou os braços. “Essa coisa nos leu. Ardentes não costumam fazer isso. Elas não têm esse tipo de discernimento, não em campo."

Luppo olhou em volta, com sua respiração mais controlada agora.

“E o fragmento? Você disse que se chama 'Estopim'?"

“É uma propriedade exclusiva do DNA de todos os Ardentes..." Reno se virou para Luppo. “Quando um Ardente morre, seu coração se comprime rapidamente num emaranhado de energia.”

Luppo esfregou o rosto, limpando o suor e o sangue.

“Onde está Platina?”

“Hm, eu havia me esquecido, quer dizer, com certeza ela está bem."

Reno levou a mão até o comunicador embutido no colar.

"Platina, status."

Um chiado inicial, depois a voz dela começou a ressoar.

“Olá, Reno.”

“Olá, me dê o status."

“Neste momento, estou observando dois rapazes. Um deles está todo manchado de sangue."

Esta descrição bate com a situação!

De repente, Reno sente dois toques em seu ombro. É lógico que, devido à adrenalina, se virou rapidamente, apontando o revólver de papel para a origem.

O problema era que...

"Olá, Reno, Aomine-kun..."

Platina estava bem ali, já naquele momento. Ela estava segurando o fio do novelo que tinha sido cortado pela metade. A outra metade estava ainda presa no tornozelo de Luppo.

"Você me assustou! Eu poderia ter atirado em você!"

"Essa é a voz da Platina-san?"

"Sim, sim. É sim, Aomine-kun."

Luppo se levantou rapidamente, ou melhor, tentou se levantar. A sequela da ascensão de seu Núcleo ainda latejava e queimava, então qualquer movimento era a fonte de uma dor meticulosa. 

Platina avançou diretamente para a frente de Luppo em um passe de mágica, e segurou-o por debaixo dos ombros.

"Tome cuidado. A ascensão deixa sequelas breves."

Luppo sentiu o calor das mãos de Platina sob seus ombros, mas era um calor suave. As palmas dela tremiam um pouco pela velocidade do deslocamento. Seus olhos estavam fixos nele.

“Você não devia ter usado o Estopim. É necessário esterilizar a área de perfuração,” ela disse, sem encará-lo. “Sua impaciência me decepciona profundamente, Reno.”

"..."

Platina abaixou o olhar para o peito de Luppo, onde a pele de vidro ainda vibrava sutilmente com o brilho âmbar.

“A cristalização está incompleta,” comentou. “Ele precisa estabilizar antes de qualquer nova missão.”

Platina ergueu a cabeça, agora olhando diretamente para ele. Afrouxou o aperto nos ombros de Luppo, mas continuou firme. Seus dedos tocaram brevemente a lateral da cabeça dele, como um gesto involuntário de proteção.

Platina manteve os dedos no cabelo de Luppo por mais um segundo. Depois suspirou baixo, afastando-se dele com leveza.

Platina manteve os dedos no cabelo de Luppo por mais um segundo. Depois suspirou baixo, afastando-se dele com leveza.

“Não se levante ainda. Eu cuido disso.”

Ela se ajoelhou ao lado da ferida e estendeu a mão para o ar, com os dedos suavemente afastados. Um brilho esbranquiçado percorreu a palma de sua mão até formar um contorno curvo e flutuante. Uma estrutura etérea em forma de flor invertida, flutuando acima de sua mão como se estivesse conectada por fios invisíveis surgiu sobre ela. Do centro dela, surgiram três agulhas finas, alongadas de coloração violeta.

“Essas agulhas vão acelerar a cristalização."

“Vai queimar mais?” Luppo arfou, com um leve sorriso torto.

“Sim. Bastante.”

Platina direcionou a primeira agulha diretamente ao centro do cristal parcialmente formado no peito de Luppo. Assim que a ponta tocou a pele translúcida, uma reação imediata aconteceu. O vidro vibrou, espalhando um calor branco por toda a extensão do tórax. A dor veio como um raio. Luppo mordeu o punho fechado com força, tremendo dos pés à cabeça. Era uma dor precisa, mas cortante como um bisturi entrando direto na alma. A segunda agulha penetrou em sequência, e a terceira logo depois, seguindo linhas específicas de energia que apenas Platina parecia enxergar.

Com cada inserção, a pele ao redor do cristal ganhava definição, e nervuras invisíveis estavam começando a ser instituídas sob a epiderme. A luz âmbar oscilou, depois estabilizou rapidamente. O peito de Luppo passou de translúcido para algo mais nítido, uma espécie de "vidro orgânico".

Platina então retirou a Fenda com um gesto sutil, fazendo com que as agulhas se dissipassem em partículas de luz violeta.

Uma última onda de energia percorreu seus membros. 

“Isso é um protocolo de emergência horrível!” ele sussurrou, exausto.

“Vamos encerrar isso antes que os sensores da Estação Central captem os rastros de energia residual,” disse ela.

“Eu bloqueei os sensores.” Respondeu Reno, com calma. “Podemos sair sem acionar alarmes.”

“Ótimo. Eu limpei o outro lado do setor. Só encontrei algumas larvas de resina e uma carcaça inativa. A única Ardente era mesmo esta.”

Reno caminhou até a lateral do galpão, onde um painel antigo de controle estava coberto por poeira. Ele acionou uma pequena alavanca, e uma escotilha oculta se abriu atrás de uma pilha de torres metálicas.

“Passagem segura. Túnel de manutenção número três. Sai direto nos dutos das Torres Yushima. Ainda temos que recuperar os dados da célula de energia do setor e selar o reator antigo. Isso encerra a missão.”

Luppo assentiu com dificuldade, mas já estava de pé, apoiando-se na Shakuhachi. O brilho âmbar do cristal no peito havia cessado, e embora sua respiração ainda fosse pesada, seus olhos estavam firmes outra vez.

Reno se aproximou e caminhou ao lado dele. Platina foi à frente, iluminando o caminho com um pequeno globo de luz que flutuava à sua frente.

O túnel de manutenção era estreito e úmido, revestido por paredes de metal corroído. O silêncio entre eles era exatamente o silêncio de pessoas que sobreviveram juntas.

Alguns minutos depois, já nas Torres Yushima, Reno adentrou uma das torres. Platina e Luppo aguardaram do lado de fora.

"Parece que está tudo bem...", Reno disse enquanto caminhava para fora.

Platina cruzou os braços. “Então voltamos.”

“Sim,” Reno confirmou. “Mas vamos a pé. O canal de evacuação está instável. Se quisermos sair discretamente, vamos ter que usar o elevador dos arquivos industriais.”

“Perfeito." Disse ela. “Essa missão foi surpreendentemente limpa.”

“Luppo perdeu sangue, teve o coração ativado à força, quase foi empalado, e enfrentou uma Ardente sensciente,” comentou Reno. “Isso é o seu parâmetro de missão limpa?”

“Comparado às outras? Totalmente.”

“Vamos, Aomine-kun."

O trio caminhou em direção ao elevador dos arquivos industriais. Luppo ia ao centro, ainda apoiado, mas com o olhar firme e focado, como se algo dentro dele finalmente tivesse despertado. O som do elevador antigo preenchendo o poço metálico foi a última coisa que se ouviu antes das portas se fecharem, levando os três para fora do subterrâneo da SIZ.

Esta foi a primeira missão de Aomine Luppo como um Ardente!