Cap. 4 - O Salto Para a Morte

O sol cortava a superfície do mar em pequenas moedas douradas, refletidas nos vidros do iate ancorado em um píer grandioso na costa dos Hamptons. Sam chegou cedo, impecável em um blazer leve, camisa aberta até o peito, óculos escuros e aquele nervosismo mudo de quem, mesmo relativamente acostumado com aquele mundo de aparência, sempre sentia um nervosismo como se fosse a primeira vez. 

No caminho, repetira mentalmente o briefing de Victor DeLuca: “O cliente é Alex Grant. Não esquece: postura, descrição, simpatia como sempre. Não me decepcione!” Àquela altura de sua breve carreira como “acompanhante”, Sam já tinha acompanhado várias mulheres ricas pelos mais variados eventos, desde noites de ópera a tardes quentes no jockey club. Na certa, Alex seria mais uma dessas peruas do Hamptons querendo exibir um “Homem Troféu” em um evento cheio de grã finos. 

O deck do iate era um desfile de copos cintilantes, convidados dourados de sol e dinheiro, tudo recortado pelo jazz ambiente. Sam avistou Alex Grant antes mesmo de ser anunciado: um homem alto, na casa dos 40 e poucos anos, bronzeado, cabelos e olhos negros intensos, uma camisa floral aberta revelando o peito atlético, o corpo marcado pelo hábito de não fugir da academia. Alex não parecia, nem de longe, um CEO cansado; carregava uma presença quase predatória, que faria qualquer mulher — ou homem — se sentir intimidado.

Mas o que…, Sam pensou, sem entender, então Alex é um homem? O DeLuca me paga!

Quando se olharam, foi como se o roteiro falhasse por um instante. Sam prendeu a respiração, engolindo o nervosismo. Não era nada do que esperava. Do outro lado, Alex quase praguejou em silêncio contra DeLuca. Esperava uma acompanhante charmosa, capaz de provocar ciúme na ex-mulher. No lugar, um garoto de vinte e poucos anos, bonito, corpo firme, ar meio tímido, meio atrevido. Quase riu da situação, mas algo em Sam o impediu. Uma simpatia imediata, desconfortável e inesperada.

— Você é… Sam? — Alex perguntou, tentando parecer casual enquanto avaliava discretamente o rapaz à sua frente. — Eu esperava alguém… diferente. 

— Isso mesmo, senhor Grant — respondeu Sam, sorrindo sem jeito, a voz tentando soar segura. — O Victor me mandou por engano no lugar da… da pessoa que o senhor imaginava, mas posso ir embora, se assim preferir. 

Alex ficou alguns segundos em silêncio, absorvendo aquela surpresa. Depois, suspirou fundo e acenou com a cabeça, resignado:

— Não… Pode ficar. Já que você está aqui, não faz sentido desperdiçar sua vinda. Acho que posso sobreviver a mais esse imprevisto… Para ser sincero, eu estou precisando mais de alguém para conversar hoje. 

Após a inesperada apresentação, os dois circularam entre os convidados, brindando em taças geladas, as máscaras sociais se revezando entre sorrisos ensaiados e olhares de curiosidade. Alex, apesar de toda a pose, estava desmoronado por dentro. Entre um gole e outro de champanhe, abriu-se para Sam, confessando a ruína da própria vida. 

— Sabe, ninguém nunca me perguntou o que eu realmente sinto por aqui… nenhuma dessas pessoas que tanto me bajula, nenhuma delas realmente se importa com o que se passa comigo — disse ele de repente, encarando o horizonte, com o vento balançando seus cabelos preto acinzentados. — Eu deveria estar feliz. Tive tudo: uma empresa de sucesso, família, esse tipo de vida que vendem sobre o self made man.

Ele riu, mas o som morreu no ar. Continuou:

— Até que eu descobri que tudo isso era tudo mentira. Que meu filho que eu criei por 22 anos não é meu… Que eu sou infértil e fui enganado até hoje pela minha mulher…

Sam respirou fundo, buscando algo entre o conforto e a distância profissional.

— Sinto muito, senhor Grant.

— Por favor, só Alex. Eu não me sinto mais senhor de nada, não depois de tudo — Ele tomou o resto da taça em um gole só. — Contratei você para fazer ciúmes à minha mulher… quer dizer, não você, mas eu esperava uma mulher chamada Sam e não um cara… É mesmo um gesto patético, não? Eu a amava tanto até descobrir…

O silêncio pairou entre eles, denso, enquanto o barco balançava suavemente entre jazz e vento da tarde.

As ondas se abriam sob a proa, olhando por aquele ângulo, Sophie entendeu o real valor do dinheiro. Ser rico é mesmo bom para caramba!

Ela hesitou, olhando para o rosto devastado de Alex, o esforço dele em manter a compostura.

— Às vezes a gente faz coisas assim quando não vê saída — arriscou, num tom calmo, tentando passar conforto. — Eu mesma já fiz… — procurou a palavra mais cuidadosa. — Coisas impensadas.

Alex sorriu de lado, mas era só cansaço.

Sua taça escorregou da mão, tombando no deck.

— Eu realmente não vejo sentido em mais nada, cara.

Ela ia dizer alguma coisa, mas antes disso Alex já se afastava de costas, passos largos e inseguros em direção à amurada.

Por um segundo, tudo ficou suspenso: os risos ao fundo, o barulho do mar, o olhar curioso de meia dúzia de convidados distraídos.

Então, de repente, ele se virou, subiu no parapeito e, sem hesitar, lançou-se ao mar.