O Segredo Fora do Mapa

O sol mal havia atingido o topo das árvores quando o grupo se reuniu próximo à borda da floresta. Kael observava a paisagem ao redor, o contorno suave das colinas recortado contra o céu tingido de um azul pálido. No ar ainda pairava o frescor da madrugada, e um silêncio carregado de expectativa envolvia tudo.

Nara Velz ajustava seu monóculo, o olhar afiado captando cada detalhe do terreno. Ela era a cartógrafa da vila, uma mulher que carregava em suas costas um mapa tatuado de linhas finas e misteriosas, como se seu corpo fosse um pergaminho vivo. Seus dedos deslizaram pela superfície da pele enquanto ela analisava uma folha amassada, parte do mapa que indicava cavernas e passagens subterrâneas.

— A caverna que procuramos não está em nenhum mapa oficial — disse ela, com um tom meio sarcástico, mas a inquietação era clara em sua voz. — É como se ela tivesse desaparecido do mundo, um segredo guardado pela terra.

Solva Iyren estava ali, silenciosa como sempre. Seus olhos, profundos e serenos, pareciam buscar algo além do que as linhas dos mapas revelavam. Ela carregava uma pequena bolsa de couro, onde guardava amostras minerais e artefatos que recolhera ao longo da vida. Para ela, a viagem era muito mais do que exploração; era uma conexão espiritual com o mundo oculto.

— As histórias antigas falam de lugares assim — comentou Solva, quase num sussurro. — Espaços esquecidos pela geografia, onde o tempo e a terra se dobram em segredos.

Kael sentiu o peso daquela ideia. A caverna que eles buscavam, localizada além da última trilha conhecida, não aparecia em nenhum registro. Não constava nos mapas que os mineradores usavam, nem mesmo nas descrições dos antigos exploradores. Era como se a terra quisesse mantê-la escondida.

O grupo começou a caminhar pela trilha estreita que descia pela encosta da colina, entre raízes retorcidas e arbustos baixos. O ar estava úmido, carregado com o aroma terroso da floresta, e o som distante de um riacho completava a atmosfera. Kael notou que, a cada passo, as marcas no seu rosto pareciam vibrar levemente, como se reagissem à energia daquele lugar.

Enquanto avançavam, Nara murmurou algo para si mesma, quase sem que alguém ouvisse.

— Não deveria ser possível que um lugar assim exista sem registro… a não ser que a própria terra o tenha apagado.

Solva caminhava à frente, guiando o grupo com passos seguros e uma confiança tranquila. Em vários momentos, ela parava para tocar as árvores ou rochas, como se estivesse escutando uma conversa silenciosa.

Kael tentou acompanhar os rastros que encontravam: marcas nas pedras, fissuras no chão, pequenas formações cristalinas que brilhavam com a luz do sol filtrada. Era como se o solo estivesse vivo, contando uma história que só eles podiam ouvir.

De repente, Nara levantou o braço, sinalizando para todos pararem.

— Ali! — exclamou, apontando para uma abertura entre as rochas, quase camuflada por musgo e raízes pendentes.

O ar à frente parecia mais frio, e um silêncio profundo tomou conta do lugar. Era uma entrada pequena, mal visível, que levava para dentro da terra. Kael sentiu uma mistura de apreensão e fascínio.

Ele deu um passo à frente, hesitando por um momento. O coração batia forte, a respiração mais rápida. Aquela caverna não era apenas um espaço físico; era uma passagem para algo maior, um mistério que desafiava sua compreensão.

Solva fez um gesto para que todos seguissem, descendo com cuidado para dentro da escuridão. Kael acendeu uma pequena lanterna, a luz tremeluzindo contra as paredes irregulares. O ambiente era estreito, mas o som do eco de seus passos criava uma sensação de profundidade infinita.

Enquanto caminhavam, o silêncio era interrompido apenas pelo som distante de água pingando, misturado a uma vibração leve, quase imperceptível, que fazia as paredes parecerem respirar.

Kael parou diante de uma formação cristalina que se erguia do chão, um prisma perfeito que refletia a luz da lanterna em milhares de cores. Ele estendeu a mão e sentiu uma corrente quente subir pelo braço, uma conexão direta com algo antigo e poderoso.

Nara observava tudo atentamente, anotando cada detalhe em seu caderno improvisado. Solva murmurou palavras que Kael não compreendeu, uma língua que parecia feita de sons minerais, cheia de ritmos e pausas.

Eles seguiram por corredores que se bifurcavam, labirintos naturais onde o tempo parecia perder sua forma. O mapa tatuado nas costas de Nara parecia reagir à energia daquele lugar, linhas que se moviam e se modificavam conforme eles avançavam.

Em um momento, Kael percebeu que algo os observava das sombras. Uma presença sutil, que não se mostrava, mas que ele sentia nos ossos. As fissuras em sua pele ardiam levemente, como se a própria terra reconhecesse seu passo.

Foi quando ele ouviu o primeiro sussurro.

Não uma voz humana, mas um som profundo, áspero, que vinha das pedras ao redor. Era uma linguagem antiga, uma canção esquecida, um convite ou um aviso.

Kael parou e virou-se para seus companheiros. Nara, Solva, Tragg — todos também sentiam. O tempo parecia suspenso, e a caverna respirava junto com eles.

A caverna que não estava em mapa nenhum não era apenas um espaço perdido. Era um ponto onde a terra falava, onde o passado e o presente se encontravam, onde a jornada deles começava a se transformar em algo que nenhum deles poderia prever.

Kael respirou fundo e deu o próximo passo.

A viagem para dentro da terra estava apenas começando.