Capítulo 26: Três contra um

Na manhã seguinte

— O que deu na cabeça do Yan para dizer aquilo? — resmungou Kay, sentado, segurando as mãos da mira.

Minutos antes, a divisão liderada por Yan estava reunida no pátio para o treino.

— Agora que estão todos aqui, tenho um anúncio importante. Talvez alguns de vocês gostem, mas a maioria, ou quase todos, provavelmente vão odiar — disse Yan, olhando para o grupo.

— É bucha? — perguntou um dos veteranos, com uma expressão preocupada.

— Não é exatamente trabalho, mas pode acabar dando trabalho. Estou reconhecendo o recruta Kay como vice-líder desta divisão! — declarou Yan.

— O quê?! — exclamaram todos os presentes, incrédulos.

— A decisão já foi passada e aprovada pelo capitão. Não quero ouvir objeções! — afirmou Yan, firme.

— Espera aí, isso é uma piada? Já estamos em abril? Não tem como aceitar isso! — protestou um dos veteranos, indignado.

Os outros veteranos murmuraram em concordância.

— Calma, entendo a rejeição de vocês, já que ele não é exatamente o tipo de soldado ideal para liderar qualquer coisa. Os quinze recrutas aqui presentes serão os que ele vai liderar! Na nossa divisão, ele só está abaixo de mim — explicou Yan, tentando tranquilizá-los.

— O quê? Eu me recuso a ter ele como meu líder! — declarou Ravena, com desdém.

Fiona assentiu, apoiando a rejeição.

— Com licença... o Kay concordou em ser vice-líder? É difícil imaginar isso! — disse Mira, surpresa.

— Não! Ele ainda está dormindo! Mas ele não terá o direito de recusar! — disse Yan, rindo.

— Não vejo o Kay sendo um bom líder — afirmou Mira, cética.

— Se nossa divisão falhar em alguma missão, vou colocar a culpa nele. Não precisam obedecê-lo, o título é só decorativo! — acrescentou Yan, com um sorriso de canto.

— Então era isso!, ele vai ser um bode expiatorio para a divisão! — disse Ravena, soltando um suspiro de alívio.

— Sim! Então, nada de fato vai mudar na nossa divisão! — afirmou Yan. — E essa é uma ordem: não digam nada disso a ele. Vale pra você também, Mira!

— Isso é maldade com o Kay... — protestou Mira.

— Ele não liga para o exército, então deixa ele assumir os erros da nossa divisão! — disse Fiona.

— De toda forma, podem ir treinar e... — começou Yan.

Enquanto isso, em outra parte da base...

— Já falei que não! Pediu um bastão porque quis, então não posso fazer o pedido de outra arma para você, ainda mais duas! — respondeu a cientista Fernanda, andando rapidamente para escapar do Kay.

— O bastão vai ser minha arma principal, mas eu só queria outras secundárias pra eliminar um número maior de ghouls! — disse Kay, seguindo ela, segurando uma garrafa e uma xícara de café.

Fernanda parou e se virou para ele, apontando o dedo em seu rosto.

— Escuta aqui, o exército tem regras, o mundo tem regras. Até que sua arma esteja desgastada ou quebrada, você não vai ter outra! É pra isso que existe o teste de aptidão, pra evitar trocas de armas desnecessárias! — disse ela, firme.

— Mas eu tenho aptidão em quase todas as armas, acho que só a do Kratos que eu não conseguiria usar... — argumentou Kay.

— Aptidão não é só saber usar, Kay. O traje e a arma têm que estar em sintonia ou não faz sentido. — Fernanda começou a andar de novo.

— Entendi. É uma pena! — disse Kay, fingindo desânimo.

— Que bom que finalmente entendeu! — respondeu ela.

— Tem coragem de me acordar pra falar nada e ainda não me ajuda... — murmurou Kay, irritado.

— Ficou com raiva que uma bela moça te levou café na cama, seu ingrato! — retrucou Fernanda, provocando.

Kay sorriu de lado e disse calmamente:

— De verdade, é uma pena... talvez a Emília fique triste ao saber que a conversa dela estava sendo ouvida.

— Do que você está falando? — exclamou Fernanda, surpresa.

— Uma pessoa tão séria e profissional colocando escuta no celular de um recruta sem consentimento e ouvindo uma conversa privada... A Emília vai ficar tão decepcionada. É uma pena. — Kay virou de costas, disfarçando.

Fernanda ficou tensa. "Se isso se espalhar, vai manchar meu nome, ainda mais agora que o instituto me reconheceu!" pensou, preocupada.

— Tudo bem, posso sugerir essas armas como secundárias! — cedeu Fernanda, relutante.

— Obrigado, sabia que podia contar com você! — disse Kay, sorrindo.

— Isso é chantagem! — murmurou Fernanda, indignada.

— Falando nisso, você tem que... — começou Kay, mas foi interrompido.

— Bom dia! — saudaram os líderes, se aproximando, exceto Yan.

— Bom dia! — responderam Kay e Fernanda.

— Parece bem acordado agora. Pegue seu traje, temos uma missão para você! — disse Joana.

— Por que pra mim? — perguntou Kay, surpreso.

— Você é o mais capacitado! — respondeu Joana, com um sorriso.

— Eu passo! — disse Kay, despreocupado.

— Eu não ouvi relatos de ghouls, por que estão usando seus trajes? — exclamou Fernanda, desconfiada.

— É só um treinamento! — sussurrou Ryuji no ouvido de Fernanda, tentando acalmá-la.

— Precisamos da sua ajuda. Vai negar isso mesmo com vidas em jogo? — exclamou Joana, apelando para o senso de dever de Kay.

Kay ficou parado por um instante, considerando.

— Tudo bem, desde que seja rápido. Vou lá pegar meu traje! — disse ele, saindo com um suspiro.

Quando Kay se retirou, Joana sorriu, satisfeita.

— Não foi difícil! — comentou ela.

— Que tipo de treino irão fazer? — perguntou Fernanda, curiosa.

— Combate três contra um! — respondeu Ryuji, divertido.

— Três capitães contra um recruta? Não acha isso demais? — exclamou Fernanda, preocupada.

— Não! O capitão disse que o garoto foi treinado pela Rem, esposa do capitão! Se isso for verdade, com 100% de compatibilidade no traje e usando o estilo de luta dela, a "Terror dos Ghouls", vai ser divertido enfrentá-lo! — respondeu Joana, animada.

— Tem certeza? Você já perdeu para ele antes. Isso é algum tipo de revanche? — questionou Fernanda, cética.

— Já falei, é apenas um treino! — retrucou Joana, evitando admitir qualquer motivação pessoal.

Momentos depois, na arena de treino...

— Por que estamos aqui? Não era para matar ghouls? — perguntou Kay, confuso, olhando ao redor.

Ryuji trancou a porta da sala de treino atrás dele.

Kay percebeu que todos os soldados estavam afastados, enquanto Fernanda, empolgada, segurava um tablet e um celular, parecendo pronta para gravar. Ele olhou para o centro da arena, onde estava cercado pelos três líderes.

"Entendi... fui enganado!" pensou Kay, tomando um gole de café com um suspiro resignado.

Kay respirou fundo, mantendo-se relaxado, mas com a atenção máxima nos três capitães que o cercavam.

— Só para confirmar, isso é um treino mesmo, certo? — ele perguntou, desanimado.

— Um treino para nós, mas um teste para você, — respondeu Joana, com um brilho competitivo no olhar. — Queremos ver até onde você aguenta.

Ryuji lançou um olhar sério para Kay e, em tom de provocação, disse:

— Vamos ver se toda essa fama é mesmo merecida, garoto.

— Esse garoto realmente vai enfrentar os três? — murmurou a plateia, um pouco incrédula.

Enquanto isso, Fernanda, que estava segurando o tablet e gravando tudo, não conseguiu conter um sorriso malicioso:

— Esse garoto é interessante. Se ele conseguir se virar bem aqui, vou ter material para dias de análise!

Joana então deu um passo à frente, sem tirar os olhos de Kay, e anunciou com um sorriso:

— Vamos começar devagar... ou acha que não vai precisar disso?

— Só para deixar claro, quando isso acabar, vão me deixar em paz? — exclamou Kay.

— Sim! — respondeu Lena.

— Ganhando ou perdendo? — perguntou Kay.

— Faça o que quiser se você ganhar, pode até pegar meu posto, se quiser! — disse Lena.

— Ela está apostando o posto de líder com um novato? — murmuravam os veteranos, preocupados.

— Tô fora, eu desisto! — disse Kay, enquanto colocava mais café na xícara.

— Já é tarde para desistir! — afirmou Joana.

— Por que eu iria querer algo tão trabalhoso? Prefiro ficar de boa aqui! — disse Kay.

— Se ganhar dos três, eu peço ao capitão para te liberar uma vez por mês pra ir onde quiser! — disse Joana.

Kay riu.

— Nem ele sai tanto assim, por que eu acreditaria nisso? — questionou Kay.

— O capitão é diferente; ele precisa coordenar o exército. Nós, líderes, podemos sair uma vez por mês! Se todos nós aqui presentes falarmos com o capitão, ele vai te liberar! — explicou Joana.

— E se não for o caso? — perguntou Kay.

— Eu te libero nos meus dias! — disse Joana.

Os outros líderes também fizeram a mesma proposta.

Kay terminou o café e guardou a xícara e a garrafa no canto.

— Quais as regras? — perguntou Kay.

— Só precisa vencer sem causar danos sérios aos oponentes! Isso vale pra nós também! — explicou Joana.

— Tá bom! — disse Kay, começando a se alongar.

Os veteranos, assistindo à distância, estavam tensos. Alguns cochichavam, preocupados com a proposta.

— Ela não pode estar falando sério! Uma vez por mês de folga para um recruta? Isso é inédito! — murmurou um deles, ainda em choque.

Kay terminou de se alongar, balançou os ombros, ajustou a postura e encarou os três capitães. Ele esboçou um leve sorriso enquanto Lena, Joana e Ryuji assumiam suas posições ao redor dele.