Capítulo 14: O Mundo sem Fortuna

O silêncio foi a primeira coisa que Isabella notou.

Não o silêncio da ausência de som, mas o silêncio *interno* — aquele espaço em sua mente onde, por um breve período, o sistema Fortuna havia se alojado como um parasita. Agora, apenas um vazio pulsante permanecia.

Ela levantou do leito do hospital em Lumenford Central, seu corpo ainda dolorido dos ferimentos da explosão. A janela mostrava uma cidade diferente: prédios antes iluminados por holobanners agora escuros, o tráfego aéreo reduzido a meros 10%. Sem o sistema, o mundo parecia ter esquecido como funcionar.

— *Nada de notícias dele?* — Isabella perguntou a Clarisse, que digitava furiosamente em três laptops simultaneamente.

A hacker sacudiu a cabeça, seus olhos vermelhos de cansaço.

— Nada. Mas... tem algo estranho.

Ela girou a tela. Imagens de sobreviventes do sistema em todo o mundo — todos relatando o mesmo sonho: *um homem com olhos azuis andando por um corredor infinito de espelhos.*

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**O Limbo Digital**

Leon caminhava sem destino. Seu corpo (era um corpo?) não cansava, não sentia fome ou sede. Apenas passos intermináveis em um espaço que não era espaço, cercado por reflexos de si mesmo em diferentes idades, diferentes vidas.

Alguns espelhos mostravam memórias:

- *Ele com 7 anos, segurando a mão da mãe antes do acidente*

- *Daniel Kovács em seu último momento*

- *Edward Whitford assinando o contrato com o Consórcio*

Outros mostravam *o que poderia ter sido*:

- *Leon como um magnata cruel, seu império construído sobre cadáveres*

- *Isabella morta em seus braços*

- *O sistema consumindo a Terra inteira*

Uma voz ecoou, familiar e estranha ao mesmo tempo:

*"Você não pertence aqui."*

Leon virou-se. Edward Whitford (ou o que restava dele) estava sentado em uma cadeira de praia, observando um mar que não existia.

— *Como saio?* — Leon perguntou.

Edward sorriu tristemente.

*"A mesma forma que você entrou: escolhendo."*

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**Lumenford - 72 horas após a queda**

O caos reinava. Bancos entravam em colapso sem o algoritmo do Fortuna para prever mercados. Ex-hosts vagavam como zumbis, seus cérebros acostumados a uma voz que não existia mais.

E no meio disso, Clarisse encontrou *algo*.

— Isabella, você precisa ver isso.

Era um sinal fraco, quase imperceptível. Alguém (ou algo) estava reconstruindo partes do código do Fortuna — mas diferente. Mais limpo. *Humano.*

— *É ele* — Isabella respirou, suas mãos tremendo sobre o teclado. — Ele está tentando voltar.

Nas profundezas do que antes fora o mainframe do Consórcio, uma única luz piscava em um servidor abandonado.

[*Reinicializando...*]