CAPITULO 5 - A NOVA CONTRATADA.

Na manhã seguinte, o sol parecia mais atrevido sobre o espelho d´´agua do jardim Kravet. Tudo seguia como sempre, mas havia algo no ar.

Rafaela de blazer cinza grafite e olhar afiado, caminhava pelo saguão da empresa sem saber que aquela terça-feira traria uma mudança definitiva.

Leticia Amaral havia chegado- curriculo impecável, postura discreta, e uma elegância que não pedia licença.

-Nova do financeiro? - cochichou uma das recepcionistas.

- Não... Nova na vida da chefe, só não sabe ainda - respondeu uma voz de copa sorrindo.

E assim, entre planilhas, contratos e um passado recente ainda quente demais, Rafaela cruzou os olhos com Leticia pela primeira vez. O resto... o destino trataria de escrever.

MEMOÓRIAS: TEMPESTADE,TOALHAS E TERRITÓRIOS INVADIDOS.

A primeira gota caiu no meio do caminho de volta.

A segunda em cima do chapéu de Laura.

A terceira, direito no peito de Rafaela - que olhou paro céu sorriu como quem já sabia.

-Isso é normal por aqui? - perguntou Laura, cobrindo a cabeça com a jaqueta emprestada.

- Só quando a gente finge, com rajadas, trovões e um cheiro delicioso de terra molhada.

O carro atolou a duzentos metros da porteira.

E arealidade caiu como um raio: elas teriam que passar a noite ali. Juntas. Na fazenda. Sozinhas.

CASA DE FAZENDA / NOITE

-Tem só um quarto pronto - avisou Rafaela, tirando as botas encharcadas. - Mas posso dormir no sofá, se você preferir manter o protocolo.

- Protocolo é coisade assessoria. Eu sou fã do improviso - disse Laura, aceitando a toalha que Rafaela ofereceu. 

A energia caiu.

E fcou só a Luz das velas.

Laura riu, nervosa:

-Isso é cena de filme, né? A proxima é o quê, um beijo de cinema?

Rafaela não respondeu. Só acendeu outra vela - e o clima.

Laura com a camiseta cinza de algodão de Rafaela. E Rafaela com um short de moletom irresistivel.

O quarto era pequeno, com lençois brancos e o som da chuva no telhado.

Laura deitou de lado. Rafaela também.

Elas não se tocavam. Mas o ar entre elas estava prestes a pegar fogo.

- Você está arrependida de ter vindo? - Sussurou Rafaela.

- Não. Estou arrependida de não ter vindo antes.

Silêncio.

- E você? - perguntou Laura.

- Eu estou com medo.

- Medo de mim?

- Medo de querer demais e fingir que é só parte do contrato.

Um trovão forte fez Laura se encolher, instintivamente. Rafaela puxou a coberta.

E, no impulso mais sincero da noite, as mãos se encontraram debaixo do lençol.

Não foi beijo.

Mas foi quase mais íntimo que isso.

- Esta tudo bem se a gente só dormir d emãos dadas? - perguntou Rafaela.

- Esta tudo ótimo. Mas só se prometer que não vai soltar antes d emim.

Mão entrelaçadas. Corações disparando.

E uma promessa silenciosa no escuro.

Laura acordou com o som do gotejar da chuva que resistia no telhado, e com o cheiro. Aquele cheiro. Café coado na hora, com aquele toque de canela que denuncia uma mulher que sabe o que faz.

Abriu os olhos devagar.

A cama ao lado estava vazia. Mas o lençol ainda morno.

E na mesinha, um bilhete manuscrito em letra torta e charmosa:

Estou na cozinha. Se vier com cara amassada, ganha uma fatia extra de bolo.

- Laura levantou. Vestiu a camisa de flanela de Rafaela que ainda estava ali. Cheirava lavanda, terra e perigo emocional.

Desceu as escadas da casa da fazenda sentindo algo novo: tranquilidade com borboletas no estômago.

COZINHA RÚSTICA, CAFÉ E BOM DIA COM FLECHA

Rafaela estava descalça, cabelos soltos, mexendo o café na chaleira de barro.

Usava short jeans e uma camiseta com estampa do Raul Seixs.

E um sorriso que dava bom dia antes mesmo da boca abrir.

- Bom dia, dorminhoca de contrato - provocou.

- Bom dia, barista rural que serve tensão sexual com café.

Sentaram- se a mesa. Rafaela passou o café em filtro de pano, com mãos leves.

Serviu duas canecas.

Laura tomou o primeiro gole e quase suspirou alto.

- Isso aqui tem magia?

-Não. Só tem intenção.

Laura encarou.

Rafaela também.

O silêncio entre elas já falava mais que cláusula assinada.

-Dormiu bem? - Perguntou Rafaela.

-Melhor do que em muitos hotéis cinco estrelas.

- Deve ser o colchão...ou a companhia.

Laura queria puxar assunto sobre o contrato.

Sobre a cidade. Sobre trabalho.

Mas tudo parecia pequeno perto daquele momento de paz, com cheiro de bolo e olhar que acaricia.

-Você sempre foi assim? - Perguntou Laura.

- Assim como?

- Calma por fora e furacão por dentro.

Rafaela sorriu de lado.

-E você sempre tentou fingir que não sente nada, mesmo quando sente tudo?

Laura mordeu o canto da boca. Estava sem argumentos. E, sinceramente, sem vontade de contra-atacar.

Na varanda da fazenda, coma caneca ainda quente nas mãos, Laura olhou para o céu aberto e pensou:

"Se isso for encenação, que espetáculo mais verdadeiro".

O celular vibrou. Mensagem de Mariana:

"As fotos de vocês juntas ontem viralizaram.

Já estão dizendo que o casal do ano é real.

Boa sorte.

Laura não respondeu.

Olhou para Rafaela, que sorria distraid perto do fogão.

E pensou:

"Talvez eu não queira explicar nada."