Permanecer ali era desperdício.
Os carniçais que habitavam o campo de batalha eram presas fáceis — mas ocas. Tecidos mortos, energia mínima. Biomassa fraca. Uma centena deles não renderia o suficiente para minha próxima mutação.
O Codex silenciava, mas eu compreendia sua lógica: progresso exige risco.
Estendi os apêndices e toquei o solo. As vibrações me contaram onde o terreno começava a mudar — a oeste, uma descida curta levava a um vale envolto por vegetação rasteira e raízes amplas. Além dele, o cheiro úmido de madeira viva, fungos e criaturas pulsantes se misturava no ar.
Uma floresta.
Ali, a carne ainda era quente. A vida era real.
Deixei as trincheiras para trás.
Não por impulso — mas por cálculo. Meus fios foram recolhidos. O cadáver do carniçal, abandonado. Seu valor já tinha sido drenado.
Com movimentos baixos e silenciosos, comecei a me mover na direção do vale. As pedras quebradas sob minhas patas não emitiam som algum — eu me adaptara. Cada passo era uma dança invisível.
O mundo à frente tremia com promessas.
Criaturas com sistemas vivos, músculos ativos, cérebros pulsantes.
Biomassa densa.
Sabor verdadeiro.
Avancei para a floresta.
Com fome, com propósito.
E com olhos que já não piscavam.
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O terreno começou a mudar. O ar ficou úmido. As raízes se entrelaçavam com rochas afiadas, e havia insetos — vivos, agressivos, densos. Toquei um deles em silêncio. Ele fugiu. Outros nem chegaram a notar minha presença.
Mas então, algo me notou.
Minha vibropercepção captou uma perturbação no limite do vale — uma sequência sutil, ritmada, humana demais para ser ignorada. Dois passos. Pausa. Três passos mais próximos. Pausa. Como se testasse minha reação.
Eu congelei sob uma pedra carcomida, meus olhos abertos em oito ângulos.
Nada se movia.
Mas a perturbação se repetiu. Três vezes.
Sempre no mesmo ritmo. Sempre atrás de mim.
Virei em silêncio, mas nada estava lá.
Ainda assim… eu sentia.
Estava sendo seguido.
Não por um carniçal. Aquilo não arrastava os pés.
Nem por uma fera irracional — não havia fome naquela aproximação.
Havia… intenção. Observação. Paciência.
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Continuei avançando. Fingindo que não percebia.
Meus fios se desenrolaram em silêncio, fixando-se em troncos e pedras como sensores vivos.
Se algo ousasse se aproximar, eu saberia.
Mas naquele momento, compreendi:
Eu deixara o campo dos mortos… e entrara no domínio dos caçadores.
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📜 Atualização do Codex Devorador
🌲 Zona de Transição: Atingida
🔍 Sinais de criatura de Nível desconhecido: Detectados
🕸️ Sistema de Fios-Sentinela: Ativado
📊 Total de Biomassa: 67g / 1000g