Cap 6

O Plano e a Promessa

A alvorada surgiu pálida sobre a floresta do norte, onde Kaela e Riven traçavam o esboço de uma guerra. O plano que crescia entre eles não era apenas ousado — era suicida. Se tivessem sucesso, poderiam libertar Lyra e expor os podres da Coroa. Se falhassem, seriam apagados da história como traidores e fantasmas.

Kaela estava agachada diante do mapa desenhado na terra com um graveto. Riven observava, calado, deixando que ela organizasse as ideias. O destino era a Torre de Drenor, a prisão mágica mais protegida do reino. Para entrar, precisavam da Marca de Celenya. E para isso, precisavam dela. Ou de algo que lhe pertencesse.

— A coroa. — Kaela falou de repente. — Não a verdadeira, mas a usada nas cerimônias da Fogueira Branca. Ela sempre toca nela com as mãos nuas. O sangue real fica impregnado.

Riven ergueu as sobrancelhas.

— E onde está essa coroa agora?

— No Santuário da Luz. Guardada por acólitos e protegida por encantamentos de fogo. Eu já estive lá. Conheço os turnos. Conheço os rituais.

Ele sorriu com pesar.

— Vai ser um furto, então. Contra tudo que você jurou proteger.

Kaela enrijeceu o maxilar.

— Eu jurei proteger a verdade. A verdadeira verdade.

Três dias depois, vestindo trajes de peregrinos e disfarces de poeira e humildade, Kaela e Riven chegaram aos portões do Santuário da Luz. As muralhas douradas refletiam o sol com força quase divina. Guardiões com lanças incandescentes faziam a ronda, olhos treinados para reconhecer mentiras e mentes fracas.

Mas Kaela era filha do fogo. E Riven, mestre da sombra.

Foram autorizados a entrar. Atravessaram os salões sagrados, ladeados por estátuas das antigas rainhas. A coroa estava numa redoma no centro do altar principal, sob um feixe constante de luz dourada. Kaela sabia que aquele brilho era um encantamento que derretia qualquer mão não autorizada.

— Precisamos desativar o selo. — Ela sussurrou enquanto fingia rezar ajoelhada.

Riven fez o mesmo ao lado dela.

— Isso é com você. Eu só sou bom em abrir portas. Você entende a linguagem da chama.

Kaela fechou os olhos e, em silêncio, murmurou a prece invertida. Uma das poucas que aprendera com Lyra antes da queda. Palavras esquecidas, proibidas. A língua da centelha.

O selo vibrou. A luz enfraqueceu.

Riven se moveu rápido como um sussurro e retirou a coroa da redoma com luvas encantadas. Esconderam-na sob o manto e levantaram-se.

Mas ao virarem para sair, deram de cara com um acólito. Jovem. Inexperiente. Mas com os olhos arregalados.

— Você...

Antes que ele falasse mais, Kaela o imobilizou com um toque preciso na base da nuca. O rapaz desmaiou.

— Não o machuquei. — Disse ela, vendo o olhar de Riven.

— Mesmo assim, o tempo correu contra nós.

E correram. Por corredores, escadarias secretas, passagens que Kaela conhecia de sua juventude como escudeira da Rainha. Quando alcançaram os portões traseiros, os sinos do santuário começaram a tocar. Tinham minutos, talvez segundos.

Montaram os cavalos e galoparam rumo às colinas do sul. Atrás deles, os guardiões gritavam ordens. Flechas cruzavam o ar. Riven foi atingido de raspão no ombro, mas não parou. Kaela o cobriu com o escudo que ainda carregava.

Quando finalmente alcançaram uma gruta segura, já estavam ofegantes, cobertos de suor, sangue e poeira.

Kaela examinou o ferimento dele.

— Vai ficar bem.

Riven fez uma careta, mas sorriu.

— Sempre fico. Você é quem preocupa. Quando você luta, parece querer morrer junto com o inimigo.

Ela não respondeu de imediato. Enfaixou o ombro dele com tiras de pano limpas e só então falou:

— Eu não luto pra morrer. Luto porque não sei mais quem sou se parar.

Riven encostou a testa na dela.

— Você é Kaela Viren. A mulher que vai atravessar o inferno por amor. E eu... estou atravessando com você.

Na noite seguinte, acamparam às margens do rio Vulmar. A coroa repousava sobre uma pedra, e Kaela derramava gotas de seu sangue sobre o metal.

— A Marca da Rainha precisa de um elo com a chama — ela explicou. — Meu sangue carrega resquícios da linhagem real por causa do juramento. A ligação entre mim e Celenya ainda não foi quebrada.

Riven observava, cauteloso.

— Isso pode matá-la.

Ela assentiu.

— Pode.

Mas não morreu. O sangue absorvido pelo ouro brilhou, e o selo da rainha brilhou sobre a coroa, como se reconhecesse Kaela. Um caminho fora aberto.

Riven sorriu, aliviado.

— Então agora, vamos à Torre de Drenor?

Kaela olhou para o horizonte, onde torres sombrias se erguiam sob nuvens vermelhas.

— Sim. Mas não como invasores. Vamos entrar como arautos da Rainha. E com a verdade queimando no bolso.

Na borda do deserto que circundava a Torre de Drenor, Kaela e Riven mudaram de vestes. Ela trajava novamente sua armadura escarlate — agora manchada, mas imponente. Riven vestia-se como um emissário da guarda interna, com emblemas falsos, mas convincentes.

O portão se abriu sob a autoridade da coroa cerimonial. A guarda não questionou. Não ousava. Eles eram esperados.

Não sabiam por quem.

No salão principal, foram recebidos por uma mulher de olhos de prata e pele marcada com linhas brancas: Comandante Nyra, a senhora da Torre.

— Vocês trazem o selo. Mas também carregam o cheiro da floresta. E da fuga. — Ela falou com uma voz sem pressa.

Kaela inclinou a cabeça.

— Viemos investigar uma prisioneira que pode conter segredos perigosos. Por ordem de Celenya.

Nyra os fitou com olhos que pareciam atravessar a carne.

— Então entrem. Mas lembrem-se: aqui, a verdade queima mais do que fora.

E as portas do subsolo se abriram.