Cap 19

O Sangue de Vael-Mir

As terras de Vael-Mir se estendiam diante do grupo como um oceano de cinza e prata. Ao longe, torres cobertas por heras encantadas se projetavam entre colinas que sussurravam com o vento antigo. Ali, onde as árvores tinham olhos e os rios cantavam em idiomas perdidos, Kaela pisava no coração do que restava da linhagem da Chama.

— Nunca pensei que voltaria aqui — disse Lyra, a voz carregada de memórias.

— Este lugar está adormecido... mas ainda respira — murmurou Kaela, sentindo o Orun vibrar sob seu manto.

Eles atravessaram os arcos de pedra do antigo templo do fogo primordial, onde sacerdotes da Velha Aliança haviam selado fragmentos do Orun para impedir que fossem corrompidos.

Na entrada, um único guardião aguardava. Um homem de meia-idade, olhos dourados e pele marcada por runas vivas.

— Sangue da Chama — disse ele, ajoelhando-se. — Você finalmente retornou.

— Quem é você? — perguntou Riven, instintivamente à frente de Kaela.

— Sou Nahrem. Guardião do Selo Dormido. E fui nomeado para proteger o que restou... até que alguém digno voltasse.

Kaela caminhou até ele, o Orun flutuando em sua mão. O templo respondeu, iluminando-se por dentro com labaredas ancestrais. Portas de pedra se abriram sozinhas.

— É chegada a hora — disse Nahrem. — De acordar a Fonte.

No coração do templo, havia uma pira antiga, cercada por símbolos que dançavam sob a luz da relíquia. Kaela colocou o Orun no centro. A pira explodiu em chamas de cor âmbar e violeta.

Vozes ecoaram. As memórias da linhagem despertaram.

— Kaela, filha de Íria. Portadora não do poder... mas da escolha — disse a chama.

Imagens surgiram: os antigos guardiões, as perdas da Velha Guerra, a traição da linhagem de Celenya. A verdade escondida veio à tona: Celenya era uma descendente de um dos primeiros corrompidos do Orun, sua alma ligada a um fragmento invertido. Ela não queria apenas o poder — queria reintegrar as partes da relíquia para alterar a própria essência da realidade.

— Se ela reunir todos os fragmentos — disse Nahrem — o Orun não só deixará de proteger... ele passará a destruir. A existência será reescrita.

Kaela fechou os punhos.

— Então ela não pode vencer. Não enquanto eu respirar.

Ela tocou a pira. A chama a envolveu. Não queimava, mas transformava.

— A Fonte aceita sua alma, Kaela. Você é agora Condutora Maior. O Orun se completará em você.

Riven a segurou quando ela cambaleou. Seus olhos estavam diferentes: uma espiral de luz e sombra. Poder, sim. Mas também consciência.

— Precisamos voltar para Elyrion — disse Lyra. — Ela virá. E agora, temos algo que ela teme de verdade.

Kaela se virou para Nahrem.

— Você vem conosco?

Ele assentiu.

— A chama foi acesa. E onde ela queimar... eu lutarei.

Ao partirem, a pira se apagou. Mas no céu de Vael-Mir, estrelas outrora esquecidas começaram a piscar novamente.

A guerra final se aproximava.