O medo da perda... pode destruí-la tanto quanto
a própria perda.
(Sarah J. Maas)
Nunca era boa coisa quando o Coronel Oliveira chamava alguém. Jef estava mais carregado de tensão do que o normal, o ar que ele respirava parecia denso, quase sufocante. Quando o capitão entrou na sala, o Coronel revisava uma série de documentos com expressão dura.
— Capitão Jefferson, você realmente precisa controlar melhor quem se envolve nas nossas operações — começou o Coronel, a voz baixa e severa. — Agora, sua irmã adotiva, uma detetive particular, se passando por advogada de um menor apreendido? Você acha que posso com essa merda? Se vazar pra corregedoria você ta fudido, e eu junto. Você acha que eu tô a fim de pagar teus B.O.?
Jef sabia que a conversa não ia ser fácil, mas ouvir aquelas palavras o fez cerrar os punhos. Lolis tinha se passado por advogada para conseguir informações sobre o caso, e ele sabia que aquilo havia ultrapassado os limites. Mas, o oficial também sabia que só Lolis podia acessar certas informações, e como havia vidas em risco, valia a pena tentar.
— Coronel, eu sei que foi uma imprudência da nossa parte, mas Lolis conseguiu informações cruciais. Graças a isso, desmontamos aquela célula do Esquadrão Y. Ela tem métodos pouco convencionais, mas eficazes... — tentou argumentar, mas foi interrompido.
O Coronel o encarou com um olhar duro, balançando a cabeça em reprovação.
— Não interessa o que ela conseguiu, Jef. Você colocou toda a operação em risco ao permitir que uma civil se infiltrasse desse jeito. Isso poderia ter detonado todo o nosso progresso! — Ele jogou um papel à frente de Jef. Era uma advertência formal. — Eu esperava mais responsabilidade de você. Sua posição como capitão implica tomar decisões difíceis, e isso foi um erro grave.
Jef olhou para o documento na mesa, sentindo o peso da reprovação. Ele não podia negar que, de certa forma, o Coronel tinha razão. Mas ele também sabia que Lolis era uma peça chave em conseguir informações que a polícia, com seus procedimentos burocráticos, jamais teria acesso tão rapidamente.
Antes que Jef pudesse responder, o Coronel pegou a advertência de volta, olhou-a por alguns segundos, e, para a surpresa de Jef, rasgou o papel ao meio, jogando os pedaços na lata de lixo ao lado da mesa.
— Mas, antes que você pense que estou sendo muito duro, reconheço que essa detetive particular — sua irmã adotiva — tem uma habilidade impressionante em conseguir o que nós não conseguimos — continuou o Coronel, com um suspiro cansado. — Não é a primeira vez que ela nos ajuda, e não vai ser a última. Mas tem que ser feito da forma certa, Jef. Ela precisa entrar no sistema ou parar de se envolver desse jeito. Senão, da próxima vez, eu vou ter que te reportar.
Jef ficou em silêncio por um momento, ainda processando o gesto inesperado do Coronel. Ele sabia que, apesar da rigidez, Oliveira também compreendia a importância da colaboração de Lolis. Havia um equilíbrio difícil de manter entre seguir os protocolos e permitir que métodos não convencionais ajudassem a solucionar casos complicados.
— Entendido, Coronel — Jef respondeu, com uma mistura de alívio e frustração. — Vou conversar com ela, e garantir que da próxima vez seja diferente. O Coronel assentiu, endireitando-se na cadeira.
— Faça isso. E diga a ela que, se quer realmente fazer parte disso, como já disse antes, ela precisa prestar a prova e não desistir da parte prática. Porque o que estamos fazendo aqui não é brincadeira. E você, Jef, você precisa tomar jeito. Se isso se repetir, não vou poder rasgar outro papel assim.
Jef assentiu, sentindo o peso do momento.
— Sim senhor!
O Coronel o olhou por mais um instante, depois fez um gesto com a mão, dispensando-o. Jef se levantou e saiu da sala com um misto de alívio e responsabilidade. Apesar do sonho do Coronel que Lolis entrasse para a polícia, ele sabia que era impossível para ela, ela odiava tudo aquilo e ajudava porque se sentia na obrigação de ajudar, não era por prazer de brincar de polícia e ladrão… Era porque se sentia responsável em ajudar, mesmo não sendo, não de verdade.
*
Lolis não dormia direito desde o incidente no cinema, seu apartamento estava uma bagunça, a parede do escritório com um quadro com todas as pistas e conexões que havia encontrado sobre o grupo e a possível identidade do Capitão Y. A polícia federal havia sido acionada e agora os hackers do governo também estavam envolvidos em achar a cabeça por trás de tudo.
Ao que tudo indicava, o grupo tinha também alguém muito bom em TI que os ajudava a usar servidores estrangeiros para que suas localizações ficassem ocultas. O tempo estava correndo e os outros adolescentes que ela conseguiu "entrevistar" também não tinham nenhuma informação completa. Ela juntara tudo que achou relevante em seu quadro de investigação e olhava para ele noite e dia.
Ainda saía vez ou outra para investigar uma traição conjugal - seu maior ganha pão - e também para treinar Carine nos fins de semana. Ah! Carine era outro motivo para achar aquele desgraçado logo. Ele sabia sobre os poderes dela e isso não poderia ficar assim. Ela precisava pôr as mãos nele logo - literalmente. Os fins de semana eram o ponto alto da sua rotina, ver Carine fazia tudo se iluminar. Ela era uma loba solitária, já tinha desistido de se apaixonar a muito tempo, é difícil se envolver quando não pode ser 100% sincera com alguém.
Por mais que Lolis acreditasse na bondade humana, a detetive também estava mais que ciente que as pessoas são traiçoeiras e podem trair. Querendo ou não, era exatamente com isso que ela trabalhava. E em um mundo super conectado com internet e redes sociais, para conter os danos de seu segredo ser revelado e ela acabar em seila uma cadeira de experimentos do exército ou pior, era um risco muito grande contar para alguém que não era como ela. Com Jef era diferente, ele era como se fosse seu irmão, e é difícil esconder algo de alguém que cresceu com você descobrindo todo e qualquer segredo de qualquer pessoa. Ele cuidava dela desde criança e ela sabia que podia confiar nele de verdade. Mas em desconhecidos? Isso era mais difícil. Com Carine era diferente, ela também tinha o seu segredo, ela era como ela, uma sobrevivente das merdas da vida que por acaso tinha poderes.
Era quinta-feira e ela precisava ir ao terreiro, fazia muito tempo que não aparecia e estava precisando tomar um passe daqueles e também um bom banho de descarrego grosso para limpar toda aquela carga pesada que estava carregando aqueles dias. Além disso, fazia um bom tempo que não via sua vó, e ela com certeza estaria lá.
*
Carine mal havia terminado de conversar com Laura na sorveteria quando sentiu o telefone vibrar em seu bolso. Era uma mensagem de Lolis:
"Quer dar um pulo no terreiro de umbanda comigo hoje à noite? Vai rolar uma gira à noite. Acho que vai ser bom pra gente..."
Carine leu a mensagem algumas vezes, refletindo sobre o convite. Ela nunca havia ido um terreiro antes, mas algo sobre a ideia de acompanhar Lolis, de estar em um ambiente diferente e, talvez, até encontrar algum tipo de resposta espiritual diferente da opressão que aprendera quando mais nova, parecia ser uma boa ideia. E claro: estar com Lolis era sempre uma boa ideia.
Ela respondeu rapidamente: "Claro, eu topo. Que horas?".
*
A noite estava quente e carregada de uma energia que Carine não sabia explicar. Quando chegaram ao terreiro, o som dos atabaques já ecoava pelo ar, criando uma atmosfera mística, ancestral. O terreiro era simples, mas, ao mesmo tempo, imponente, com seu chão de terra batida e uma roda de pessoas aguardando o início da gira. Lolis explicava para Carine calmamente como as coisas funcionam.
A tronqueira, que era a primeira coisa que se via ao entrar, ficava em um canto à esquerda da entrada do terreiro. Era um espaço reservado, um pequeno altar de proteção dedicado a Exu e às entidades guardiãs do terreiro. Ali, havia uma pequena estrutura de tijolos, onde se encontravam velas acesas, garrafas de cachaça, charutos e oferendas de comida como farofa e dendê. Carine notou que a tronqueira irradiava uma energia densa, mas não pesada, como se fosse o ponto de filtragem de todas as energias que entravam naquele espaço. Era onde Exu fazia sua morada e mantinha a ordem no terreiro, garantindo que nenhuma energia negativa adentrasse o ambiente.
Já o congá, o altar principal, ficava ao fundo do salão, do lado oposto à tronqueira. Carine observou Lolis fazer uma reverência para seus santos. Ela havia explicado que congá era o coração do terreiro. Era um grande altar adornado com estátuas de santos católicos, como Nossa Senhora e São Jorge, assim como representações de Orixás, como Oxalá e Iemanjá. Ela achou interessante que havia santos cristãos por lá, sua mãe acharia isso só mais uma prova da presença do demônio, para ela não se podia adorar imagens de nenhum tipo, nem de santos. Carine espantou as imagens de sua mãe de sua mente, os preconceitos e julgamentos dela não faziam parte das crenças de Carine, ela havia se libertado daquela culpa.
Havia imagens de Preto Velho, Caboclo e outras entidades que faziam parte da corrente espiritual do terreiro. Flores frescas, velas e objetos simbólicos completavam o espaço sagrado. Tudo ali irradiava paz e força, criando um contraste entre a proteção bruta da tronqueira e a serenidade espiritual do congá.
O som da gira começou a tomar conta do espaço. No centro do salão, os atabaques começaram a tocar. O ritmo era forte e compassado, chamando as energias das entidades, enquanto os médiuns batiam palmas, acompanhando o som dos tambores. O canto, entoado com reverência, era uma saudação a Exu, e as palavras repetidas traziam uma vibração que ecoava por todo o terreiro. A melodia era hipnotizante, uma mistura de vozes e tambores que parecia vir de outro plano.
O cheiro de incenso e de defumação preenchia o ar, misturando-se com o calor das velas e o som dos atabaques. Carine, ainda absorvendo o ambiente, sentiu-se envolvida por essa atmosfera poderosa.
Lolis, usando uma saia branca longa e uma camiseta de algodão, parecia em paz ali, como se aquele fosse um dos poucos lugares onde ela realmente podia respirar. Carine observava, admirando a segurança com que ela se movia pelo ambiente.
— Você já esteve em uma gira antes? — Lolis perguntou enquanto se aproximavam.
— Nunca, mas estou curiosa. — Carine admitiu, um pouco nervosa, mas animada por estar com Lolis.
A música começou, e a energia no ambiente parecia ganhar vida própria. As batidas dos atabaques penetravam no corpo de Carine, fazendo-a sentir algo profundo, como se uma parte dela, que ela não sabia que existia, estivesse sendo chamada.
A gira começou, e logo os médiuns incorporados pelos Exus e Pombas Giras começaram a dançar e suas vozes mudaram. Os vestidos das mulheres chamaram sua atenção com lindas saias rodadas de tecidos brilhantes que refletiam a luz das velas. Após esse momento começaram a dar suas mensagens. Carine sentia uma energia diferente em seu corpo, mas não de uma forma negativa, era um formigamento que fazia seu poder também querer dançar. Era como se houvesse algo ali esperando por ela.
Quando chegou a vez de Lolis receber o passe, ela deu um passo à frente, pedindo proteção para sua jornada e forças para continuar sua missão. Carine assistia atentamente, sem conseguir desviar o olhar. De repente, uma das entidades, um Exu de voz rouca e misteriosa, olhou diretamente para Carine. Seu olhar parecia penetrar fundo, como se ele soubesse tudo sobre ela.
— Menina, você tem um peso grande nos ombros, não é? — um dos Exus se dirigiu a ela, caminhando lentamente em sua direção. — Seu coração carrega culpa, medo... e poder. Um poder que você ainda teme.
Carine ficou paralisada. Era como se aquela entidade estivesse lendo sua alma. Ela olhou para Lolis, que assentiu levemente, incentivando-a a ouvir.
— Você quer enfrentar os demônios do seu inimigo, menina? — O Exu continuou, a voz soando como um trovão suave. — Então primeiro, precisa enfrentar os seus próprios. Não adianta correr. Não adianta esconder.
Carine sentiu o coração acelerar. As palavras do Exu ressoavam como uma verdade incontestável. Era isso. Ela sempre soube, no fundo, que não poderia continuar fugindo do que havia acontecido dez anos atrás. A morte dos colegas, o massacre... era um peso que carregava sozinha. Ela havia tentado enterrar a culpa, esconder o medo, mas tudo isso a impedia de usar plenamente seus poderes.
— Eu... eu não sei se consigo. — Ela murmurou, a voz embargada.
O Exu sorriu de forma enigmática, um sorriso que não trazia julgamento, apenas sabedoria.
— Você vai ter que enfrentar a si mesma. Só assim poderá enfrentar o que está por vir. Lembre-se: o verdadeiro inimigo mora dentro antes de morar fora.
— Obrigada, eu vou tentar! Como posso te agradecer, qual é seu nome?
— Nem sempre você precisa saber nosso nome menina, mas saiba que eu tô dentro de você, dentro dos seus ossos, da sua caveira. Mas, pode me dar um marafo e um pito, que para mim está ótimo.
Logo Lolis buscou um copo de cachaça e um cigarro de palha e deu para Carine entregar a entidade que agradeceu com um aceno de cabeça e deu um passo para trás se dirigindo a outras pessoas que estavam esperando sua vez, encerrando seu contato. Carine sentiu um calafrio percorrer sua espinha, mas, ao mesmo tempo, uma leveza, como se aquela verdade tivesse finalmente encontrado um lugar dentro dela. Mais tarde, Lolis explicou para ela que provavelmente ela havia falado com Exu Caveira, uma entidade muito sábia e poderosa, que não distingue os seres humanos, para ele, todos são como são, apenas ossos por de trás de um invólucro de pele.
Depois da gira, Lolis e Carine ficaram um pouco mais para conversar com Marcela, a avó de Lolis. A senhora, com seus cabelos brancos presos em um coque, se movia com serenidade. Tudo nela trazia calma, a mesma calma que o poder de Lolis transmitia para ela, mesmo em meio a música, a dança, e as consultas espirituais, ela estava em paz.
— Lolis, minha menina... — a anciã começou, chamando a neta para perto. — Você precisa voltar mais vezes. A carga que você carrega está te pesando mais do que deveria.
Lolis baixou a cabeça, sentindo o peso das palavras da avó. Era verdade. A investigação, os sentimentos crescentes por Carine, o medo constante de falhar — tudo isso estava drenando suas energias.
— Eu sei, vó. — Lolis respondeu, com um tom de quem sabia que estava sendo repreendida com amor. — Mas as coisas têm sido tão intensas. A cada dia que passa, parece que estou correndo contra o tempo.
Marcela tocou o rosto de Lolis com gentileza, um toque leve, mas cheio de afeto.
— Não importa o que esteja acontecendo lá fora, minha filha. Você tem que lembrar de cuidar de você aqui dentro. Só assim vai ter força para ajudar quem precisa, inclusive essa moça bonita aí. — Ela olhou para Carine com um sorriso afetuoso, como se já soubesse de tudo que estava acontecendo entre as duas. Ela nunca conhecera nenhuma de suas avós, já haviam falecido quando nascera e sempre imaginou como seria ter tido esse tipo de amor.
Lolis sorriu levemente, sentindo uma sensação de alívio ao ouvir as palavras da avó. Ela sabia que Marcela estava certa. Estar ali, no terreiro, a fazia lembrar quem ela era e de onde vinha. Era hora de voltar a se reconectar com suas raízes, para que pudesse continuar sua jornada com mais clareza.
— Prometo que vou voltar mais vezes, vó. — Lolis disse, olhando nos olhos da avó.
Marcela assentiu, satisfeita.
— Faça isso, minha filha. O caminho à frente é difícil, mas você não anda só, lembra disso.
*
Já passava da meia-noite quando Lolis e Carine deixaram o terreiro. As ruas estavam silenciosas, e uma brisa suave cortava o ar, carregando consigo o cheiro de terra molhada e folhas secas. Lolis, em sua lambreta, estacionou próximo ao portão da casa de Carine, desligando o motor com um gesto rápido e acostumado. O som do silêncio noturno envolveu as duas por um momento, apenas o farfalhar distante das árvores quebrando a quietude.
Carine desceu da lambreta, ainda sentindo a vibração do veículo em suas pernas, mas seu coração batia mais forte por outros motivos. Aquela noite havia sido intensa de várias maneiras. Bom, desde que conheceu Lolis, tudo estava intenso, não de um jeito ruim, é como se as cores houvessem voltado para sua vida cinza…
A mensagem de Exu ainda ecoava em sua mente, mas a presença de Lolis ao seu lado a fazia sentir-se mais forte, mais capaz de enfrentar o que estava por vir. Ela olhou para Lolis, que estava encostada na lambreta, tirando o capacete, os cabelos curtos bagunçados pela viagem.
Lolis a olhou de volta, um sorriso tímido brincando em seus lábios.
— E então, o que achou? — Lolis perguntou, a voz baixa e rouca. — A gira... tudo.
Carine hesitou por um segundo, ainda processando todas as emoções que haviam sido despertadas durante a noite. Ela deu um passo à frente, as mãos trêmulas segurando a alça da bolsa. O brilho da lua iluminava suavemente o rosto de Lolis, destacando os traços delicados e o brilho dos óculos que ela usava.
— Foi muito diferente do que diziam para nós na igreja. — Carine respondeu com sinceridade, a voz um pouco vacilante. — Nunca imaginei que participaria de algo assim. Agora eu entendo da onde você herdou sua calma e sua força.
Lolis sorriu. Ela estava receosa de levar Carine lá, porque ela havia contado que cresceu em um lar muito religioso, mas que havia abandonado qualquer tipo de fé por isso.
— Fico feliz que você tenha vindo comigo. — Lolis murmurou, seu tom mais suave agora, quase como se estivesse confessando algo.
O silêncio se estendeu entre elas por alguns segundos, mas não era desconfortável. Carine deu mais um passo à frente, sentindo o coração acelerar. Ela não sabia como expressar tudo que sentia por Lolis, não com palavras, pelo menos.
— Lolis, eu... — Carine começou, mas antes que pudesse terminar a frase, Lolis deu um passo em sua direção.
Sem hesitar, Lolis inclinou-se suavemente para a frente, sua mão tocando o rosto de Carine com delicadeza. O toque foi elétrico e ao mesmo tempo tranquilo, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Ela não usou seus poderes dessa vez. Não queria que parecesse que estava influenciado Carine de alguma forma. Carine sentiu as mãos macias de Lolis em seu rosto e seu coração quase parou de bater por um segundo.
Então, sem mais palavras, Lolis se aproximou e beijou Carine. O beijo foi suave, doce, mas carregado de um sentimento profundo. As mãos de Carine, incertas a princípio, subiram devagar até os ombros de Lolis, e ela se perdeu naquele momento. O mundo ao redor pareceu desaparecer, as preocupações e as memórias dolorosas foram empurradas para longe, e tudo que existia era aquele instante. O gosto doce dos lábios de Lolis, a sensação da proximidade, o calor reconfortante.
Quando o beijo finalmente terminou, Lolis manteve o rosto próximo ao de Carine, suas testas quase se tocando. As respirações das duas estavam entrelaçadas, e por um momento, nenhuma delas falou.
— Eu queria fazer isso há um bom tempo. — Lolis confessou, sua voz mal passando de um sussurro. Carine sorriu de volta, dando um passo para trás, mas sem soltar completamente a mão de Lolis.
— Nos vemos no final de semana? — Lolis perguntou, piscando levemente.
— Com certeza. — Carine respondeu, ainda tentando processar o que acabara de acontecer. Lolis subiu de volta na lambreta, ajustando o capacete, mas antes de ligar o motor, ela lançou mais um olhar para Carine, um olhar que dizia muito mais do que qualquer palavra. Era o início de algo novo, algo que Carine não sabia aonde iria levar, mas que estava disposta a explorar. Ela só queria não estar no meio de uma investigação que envolvia superar todos os seus traumas para conseguir impedir que o seu maior trauma se repetisse mais uma vez.
Lolis acenou antes de partir, deixando Carine na entrada de casa, com o coração ainda acelerado e os lábios ainda sentindo o gosto do beijo. Carine respirou fundo, olhando para o céu estrelado de Borubo rindo feito boba. Uma coisa boa, no meio do caos. Lolis era a ordem do seu caos.